sexta-feira, 25 de julho de 2025

Iracema: Uma transa amazônica. O icônico filme censurado na ditadura que reestreia restaurado em 4k nos cinemas após 50 anos .

Considerado um dos 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine), o filme coleciona prêmios neste meio século de história, a exemplo dos quatro troféus que ganhou em 1980, no Festival de Brasília. Agora, pouco antes de voltar às salas de cinemas de todo o país, o filme foi destaque nas últimas edições do Festival do Rio e do Festival de Berlim.


Anatomia da devastação

24 de julho de 2025 

Um filme que parece ainda mais vivo e pungente hoje do que quando foi realizado, há meio século. O prodígio, intitulado Iracema: uma transa amazônica (1975), de Jorge Bodanzky e Orlando Senna, volta aos cinemas nesta quinta-feira, em cópia devidamente restaurada.

É uma obra extraordinária sob qualquer ângulo que se olhe. Misto de road movie, drama e documentário, narra duas trajetórias que se cruzam no norte selvagem do país: a do caminhoneiro Tião Brasil Grande (Paulo César Pereio) e a da adolescente pobre Iracema (Edna de Cássia).

Não será exagero dizer que nesse cruzamento de destinos se resume de modo cabal o processo de “espoliação da natureza e das gentes” que, nas palavras de Darcy Ribeiro, caracteriza nossa história. À devastação desenfreada da mata por madeireiros, mineradores e criadores de gado corresponde a degradação humana das populações da região, expressa no trabalho semiescravo, no etnocídio de povos indígenas, nas condições precárias de vida e na prostituição de meninas.

 Documento e ficção

Uma dessas meninas é Iracema, adolescente ribeirinha descendente de indígenas, que vai a Belém participar da festa do Círio de Nazaré e acaba se prostituindo na periferia da cidade. É lá que a encontra casualmente Tião, caminhoneiro gaúcho cínico e oportunista, que combina um discurso ufanista típico da ditadura militar com o desejo explícito de “levar vantagem em tudo”. Transporta madeira, gado, minério – o que for mais lucrativo no momento. As estradas – símbolo do desenvolvimentismo verde-amarelo – são o seu elemento. É um culpado útil, como tantos que hoje alimentam os projetos da extrema direita pelo mundo.

A atualidade atordoante de Iracema reside não apenas em seus temas, mas no modo como articula o macro e o micro, o documentário e a ficção. O dispositivo narrativo básico é relativamente simples: Pereio, ator excepcional, interage com não-atores da região, servindo como elemento provocador – de conversas, de debates, de revelações. Entre uma conversa e outra, em suas viagens pelas estradas que rasgam a mata, vemos a destruição promovida pelas queimadas, tratores e motosserras.

A progressão do relato é descontínua, operando aos saltos. Entre uma cena e outra podem passar-se dias ou anos. Iracema e uma colega prostituta (Conceição Senna, mulher de Orlando Senna e uma das poucas atrizes profissionais do elenco) são levadas por um piloto (o próprio Orlando Senna) à fazenda de um “americano”. Não vemos o que se passa lá, mas apenas a volta das moças num caminhão pau-de-arara.

Num reencontro entre Tião e Iracema, num puteiro de beira de estrada, a garota está sem um dente e muito mais desbocada e despudorada. Intuímos que se passou um bom tempo, mas isso não é informado por outros meios (diálogo, letreiro). O caminhoneiro a chama de Jurema e a trata como um objeto desfrutável e humilhável.

 O avesso do mito

Há uma espécie de eterno retorno a paisagens e situações semelhantes, como que a reafirmar a ideia central de progresso e destruição se alimentando reciprocamente. Devastação humana, estupro da natureza, ou vice-versa. O verdadeiro Bye bye Brasil. Não foi casual, certamente, a escolha do nome: Iracema, anagrama de América, a “virgem dos lábios de mel” da visão romântica de José de Alencar, mito fundador aqui revirado do avesso.

A ditadura militar proibiu durante cinco anos a exibição desse filme no país, inclusive em festivais, alegando que era uma produção estrangeira (tem coprodução da emissora alemã ZDF) que trazia uma visão negativa do país. No Festival de Brasília de 1980, realizado a duras penas devido ao boicote do governo federal, Iracema ganhou os prêmios de melhor filme, atriz (Edna de Cássia), montagem e atriz coadjuvante (Conceição Senna). Os diretores viajaram de São Paulo a Brasília de carro, pois o festival não bancou as passagens aéreas, e Edna nem compareceu, porque não ganhou passagem.

Edna, aliás, não quis seguir carreira de atriz. Formou-se professora e hoje, aos 65 anos, está aposentada. Na época das filmagens, tinha 15 anos e precisou de autorização dos pais e do juizado de menores para atuar. Sua presença na tela é única em mais de um sentido: nenhuma atriz profissional conseguiria expressar o frescor e a contundência de suas falas e gestos. Em seu rosto moreno, é um Brasil profundo, belo e sofrido, que mostra sua cara.

https://ims.com.br/blog-do-cinema/iracema-uma-transa-amazonica-por-jose-geraldo-couto/

Trailler


Iracema, uma transa amazônica

Direção

Jorge Bodanzky, Orlando Senna

Informações

Alemanha, Brasil, França

1975. 90min. 16 anos

Em contraste com a propaganda oficial da ditadura militar, que alardeava um país em expansão com a construção da rodovia Transamazônica, o filme de Jorge Bodanzky e Orlando Senna aponta para os problemas que a estrada traria para a região: desmatamento, queimadas, trabalho escravizado, prostituição infantil. Em uma obra que mistura documentário e ficção, uma pequena equipe de cinema vai à Amazônia rodar um filme com imensa liberdade formal. Um fio de enredo: um caminhoneiro, Tião Brasil Grande, interpretado por Paulo Cesar Pereio, encontra Iracema, e juntos percorrem parte da região amazônica, então zona de segurança nacional sob rígido controle militar, contracenando com moradores e interagindo com outros intérpretes.

“A primeira semente de Iracema germinou num posto de gasolina à margem da rodovia Belém-Brasília, em 1968”, relembra Bodanzky na biografia Jorge Bodanzky – O homem com a câmera, escrita por Carlos Alberto Mattos. “Enquanto esperava que o repórter da revista Realidade apurasse alguma coisa, fiquei dois dias observando a movimentação de caminhoneiros e prostitutas em torno do posto. A estrada ainda era de terra e as ‘Iracemas’ e ‘Tiões’ estavam todos ali”.

“Tínhamos um roteiro-guia, que não era mostrado aos atores. Explicávamos a situação, dizíamos o que não poderia deixar de ser falado, e os deixávamos à vontade diante da câmera. Edna, por exemplo, tinha uma ideia básica da situação de Iracema na cena, mas não sabia exatamente o que Pereio ia dizer ou perguntar. Tinha que reagir à sua maneira. E ela, muito brincalhona e irônica, geralmente se saía bem das provocações. O momento em que Pereio a expulsa do caminhão é exemplar dessas virtudes da improvisação. [...] Ao lidar com não atores, é complicado cortar para fazer contracampos, closes etc., pois isso retira toda a naturalidade. Faço, então, com que a câmera costure a ação, de certa forma me antecedendo à montagem. O hábito fez dessa a minha maneira de dirigir. Eu quero contar a história com a câmera, vou empurrando minhas personagens com a minha câmera. É como se estivesse roteirizando, decupando, filmando e montando ao mesmo tempo”.

Realizado em 1974 para a ZDF, emissora de TV alemã, Iracema, uma transa amazônica retrata uma viagem da inocência à desintegração, da comunidade indígena mais isolada à periferia das grandes cidades. O filme, que ficou proibido pela censura no Brasil durante seis anos, teve uma boa repercussão de público e crítica internacionalmente desde sua estreia, em fevereiro de 1975, na ZDF. Foi premiado em festivais estrangeiros e convidado para a Semana da Crítica, do Festival de Cannes em 2016. Quando liberado no país, em 1980, foi premiado nas categorias Melhor Filme, Montagem, Atriz e Atriz Coadjuvante no Festival de Brasília.


Os benefícios do Cinema para o bem-estar emocional, segundo a psicologia

O Cinema brasileiro celebra suas origens em 19 de junho, uma data que homenageia o início da história cinematográfica no país, remontando às primeiras gravações em 1898. Essa arte, além de encantar o público, atua como uma poderosa ferramenta cultural. É capaz de informar, entreter e provocar reflexões profundas, tornando-se parte intrínseca da sociedade e cultura nacional. O Cinema não apenas proporciona momentos de lazer, mas também oferece benefícios significativos para a saúde mental e emocional de seus espectadores.

Assistir a um filme em uma sala de Cinema vai além da simples visualização de uma história em uma tela grande com som de alta qualidade. Segundo Ana Cristina Rodrigues de Vasconcellos, coordenadora do curso de Psicologia do Centro Universitário Anhanguera, esse ambiente imersivo permite uma “desconexão digital”, algo cada vez mais raro no mundo atual. Num contexto em que as tecnologias digitais dominam nosso cotidiano, a imersão proporcionada pelo Cinema pode atuar como um refúgio, oferecendo um escape das preocupações diárias e ajudando a reduzir o estresse.

Quais são os benefícios sociais do Cinema?

Ir ao Cinema não é apenas uma atividade recreativa individual; é também uma oportunidade para fortalecer laços sociais. A experiência compartilhada de assistir a um filme pode promover conversas significativas e criar conexões emocionais entre amigos, familiares ou parceiros. Discutir sobre o filme após a sessão pode estimular debates interessantes, enriquecendo as relações interpessoais e promovendo maior empatia e compreensão mútua.

Como a experiência cinematográfica afeta a saúde mental?

A experiência de ir ao Cinema envolve um estímulo sensorial que poucas atividades recreativas conseguem igualar. A combinação de visuais impressionantes, sons envolventes e até mesmo o aroma característico da pipoca contribui para uma vivência que pode melhorar o humor e revitalizar o espectador. Além disso, o ato de se desligar dos dispositivos eletrônicos durante a exibição do filme promove um tempo de qualidade longe das interrupções constantes do mundo digital, proporcionando uma pausa bem-vinda que pode beneficiar a saúde mental.

Por que assistir a filmes sozinho pode ser benéfico?

Embora atividades em grupo sejam socialmente incentivadas, ir ao Cinema sozinho pode ser uma prática de autoconhecimento e autocuidado. Realizar atividades de forma independente oferece autonomia, proporciona tempo para reflexão e incentiva o desenvolvimento pessoal. Esta prática pode garantir uma vivência enriquecedora, contribuindo significativamente para o bem-estar emocional e mental ao promover um espaço de introspecção e autoexploração emocional. Incorporar essa atividade na rotina pode ser transformador para muitas pessoas, especialmente em tempos onde o estímulo social é constante.

Como uma forma de arte e uma ferramenta cultural, o Cinema brasileiro continua a desempenhar um papel vital na sociedade. Celebrar o Dia do Cinema Brasileiro vai além de relembrar a história da cinematografia nacional; é também reconhecer e valorizar os inúmeros benefícios que essa experiência proporciona tanto individualmente quanto coletivamente.

https://www.correiobraziliense.com.br/cbradar/os-beneficios-do-cinema-para-o-bem-estar-emocional-segundo-a-psicologia/

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