domingo, 15 de janeiro de 2012

Milagre em Milão”: fábula de Vittorio De Sica sobre desocupação de sem-teto segue atual

por ALCEU LUÍS CASTILHO (@alceucastilho)

Em tempos de iminente desocupação do Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), um filme do italiano Vittorio de Sica ajuda a pensar – 60 anos depois - em alguns aspectos de uma reintegração de posse. E da oposição entre a classe trabalhadora (os sem-teto) e a burguesia. Quem vence essa disputa?

Economicamente não há final feliz: no final de “Milagre em Milão” (1951) o terreno é revertido para o proprietário. Mas os comunistas De Sica e Zavattini (o roteirista principal) não viam o mundo apenas com lentes econômicas. O que eles sugerem ali, além de uma utopia, é uma caracterização da burguesia a partir do ridículo.

- Quem são eles? – pergunta o novo dono do terreno, senhor Mobbi.
- Pobres – responde o antigo dono.
- O que fazem?




O filme quase se chamou “Os pobres atrapalham”. Mas foi vetado - os italianos estavam preocupados com a imagem do país no exterior. O filme é baseado no livro “Totó, o Bom”, do próprio Cesare Zavattini.

A desumanidade do dono do terreno, o senhor Mobbi, está diretamente associada a sequências patéticas. Do outro lado, em clima surreal, Totó e sua turma desconstroem as ações policiais com humor e dignidade – os jatos d’água, as bombas de fumaça, as ordens. Nada ali pode afetar a dignidade dos sem-teto.

Não se trata apenas de uma resistência por meio de porretes e barricadas – que, em determinado momento, também acontecem. Vittorio de Sica busca na poesia – e na união dos trabalhadores – a possibilidade de superação daquela violência.

Em meio à fleuma dos sem-teto, são os patrões e seus mandantes que se sentem acuados. “Essa gente não merece piedade”, diz Mobbi, titubeante. “Todos sentimos frio, somos todos iguais”, afirma, em outro momento, obviamente sem convencer. “Todos temos cinco dedos nas mãos”.

Nenhum comentário: