sexta-feira, 19 de setembro de 2025

Nunca foi sorte, sempre foi Deus

Quase sem oposição, o discurso da meritocracia e da teologia da prosperidade avançou entre os mais pobres.

Luis Felipe Miguel

set 19, 2025

Este é o terceiro de uma série de cinco textos que busca entender nosso caminho até o fundo do poço. No texto passado, falei da paralisia da esquerda. Aqui, trato da dissolução da identidade de classe. E, nos próximos, do apetite sem fim do capital e do mergulho na irrealidade.

A partir de 2013, ficou evidente o divórcio entre o lulismo e muitos dos beneficiados por suas políticas compensatórias, que até então eram tidos como sendo sua base social natural. Um grande contingente de pessoas que tinha saído do fundo do poço com o Bolsa Família, conseguido um teto com o Minha Casa Minha Vida, chegado ao ensino superior com o Prouni e aberto seu próprio negócio ou adquirido eletrodomésticos com a expansão do crédito popular – essas pessoas agora se viam como oposição ao governo.

Não quero deixar margem a dúvidas. Não acho que beneficiários de programas sociais devam ter uma dívida de gratidão com políticos. Muito menos considero que as manifestações de 2013 foram parte de um complô para derrubar a presidente Dilma e fazer a direita voltar ao poder, tese conspiratória sem qualquer embasamento factual que ainda hoje encontra eco em dirigentes e intelectuais petistas e que o próprio Lula reproduz, vez por outra, em alguma entrevista.

Não resta muita dúvida de que a pauta inicial das manifestações de 2013 pressionava o governo pela esquerda e o empurrava para ir além de sua opção preferencial pela inclusão por meio do consumo, cobrando melhorias nos serviços públicos socializados. Era manifestação de quem queria transporte público de qualidade, diante de um governo que preferia prometer que um dia todo trabalhador poderia comprar seu carro próprio.

Mas depois as manifestações foram capturadas pela direita, que percebeu inteligentemente uma janela de oportunidade e soube aproveitá-la, usando seus amplos recursos – a começar pelo reenquadramento dos protestos, promovido pela Rede Globo de Televisão. Quem vai às ruas, neste que podemos chamar de “segundo tempo de 2013”, é em grande medida uma classe média tradicional, que se sentiu liberada para expor seu desconforto com a redução da distância que a separava dos mais pobres e adotou o discurso de sempre do combate à corrupção, associado, com menos ou mais ênfase, conforme as circunstâncias, à ideia de que era preciso parar de ajudar os “vagabundos”.

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