quinta-feira, 31 de maio de 2018

Morre em Aracaju o arcebispo emérito Dom Luciano José Cabral Duarte. Uma vida que precisa ser contada e recontada.

 
Foto: site da CNBB

Dom Luciano José Cabral Duarte, foi um dos expoentes mais importantes e inteligentes do clero conservador, inclusive no período em que a CNBB esteve  mais permeada pela influência do Concilio Vaticano II e das Conferências Episcopais de Medelin e Puebla. 

O que fez com que fosse uma das vozes preferidas dos setores retrógrados e autoritários das elites brasileiras para atacá-la. Nas décadas de 1970 e 1980, teve uma coluna cativa no Jornal do Brasil, junto com Dom Eugênio Salles, arcebispo do Rio de Janeiro, espaço utilizado constantemente para atacar a “infiltração comunista” na Igreja. 

É um personagem que precisa ser mais pesquisado pela academia. Já há quem faça isso, em um sentido de defesa do personagem. O que não é ruim, o mal é permanecerem silenciadas, as diferentes vozes que sofreram os efeitos do seu governo pastoral. 

Com a sua morte, ocorrida no dia de ontem (29/05/2018), fica mais fácil a emergência destas vozes e sussurros. Quem se atreve? Afinal,
"A função do historiador é lembrar a sociedade daquilo que ela quer esquecer." como afirmou  o historiador Peter Burke

"Dom Luciano desarticulou as Escolas Radiofônicas do MEB, perseguiu clérigos progressistas que se levantavam contra o regime, lutou até os 45 do segundo tempo para que a UFS tivesse uma estrutura fundacional com possibilidade de  cobrança de mensalidades, perseguiu estudantes, concedia palestras no 28º Batalhão de Caçadores sobre as "ameaças comunistas" no Brasil..."
 

Jornalista Henrique Maynart.

 "Que o Senhor Jesus Cristo tenha compaixão e misericórdia de Dom Luciano Cabral Duarte e lhe lhe conceda o perdão pelas traições feitas ao Dom Távora, pela perseguição sem tréguas ao Bispo Profeta Dom José Brandão de Castro, pelos 11 padres franceses por ele denunciados e presos pelo exército, pelas professoras do MEB que foram presas e pelos jovens perseguidos pela ditadura."

Sociólogo Hildebrando Maia 

 "Conheci Dom Luciano pelos artigos no Jornal do Brasil, pois morei no Rio de Janeiro nas décadas de 1970 e 1980. Ao chegar em Aracaju, nos meados de 1980, quando avistei a sua figura imponente e de postura arrogante, percebi que pessoa e texto eram o mesmo."

Professor de História Zezito de Oliveira


Outros links de produção acadêmica sobre a trajetória de Dom Luciano José Cabral Duarte, como esse abaixo, podem ser acrescentados  nos comentários.

“O Bispo da Terra” e as agruras dos camponeses de Dom Luciano: escrita biográfica e reinvenção de si

Magno Francisco de Jesus Santos

Resumo


Dom Luciano José Cabral Duarte, nascido em Aracaju, em 1925, tornou-se um dos mais proeminentes membros do clero brasileiro da segunda metade do século XX, com uma ampla participação em instituições educacionais e na gestão das políticas públicas voltadas para a educação. Em decorrência de sua articulação com os governos da ditadura civil-militar e posicionamento adverso a movimentos católicos como o da Teologia da Libertação, levou a constituir uma representação de religioso conservador. Neste artigo, discutiremos a trajetória polissêmica do sacerdote a partir de seu envolvimento com os camponeses da região da Cotinguiba nas ações de reforma agrária e problematizamos as ações de elaboração biográfica na cristalização de sua imagem de sujeito conservador e distante das causas sociais.

Leia também: 

 Os bispos católicos e a ditadura militar brasileira: a visão da espionagem (1971-1980)", de Paulo César Gomes Bezerra, historiador do Departamento de Documentação e Pesquisa (DDP-FAN). 

"O livro "Os bispos católicos e a ditadura militar brasileira: a visão da espionagem", baseado na tese de mestrado na UFRJ do historiador Paulo César Gomes Bezerra, que mostra como a repressão vigiava os bispos católicos que faziam oposição ao regime.

O livro mostra o apoio da Igreja aos militares em 1964. Afinal, em tempos de Guerra Fria, eles tinham um inimigo comum: o comunismo ateu. "Em maio de 1964", diz o historiador, "um manifesto assinado por 26 bispos da CNBB em linhas gerais agradecia aos militares por ‘salvarem’ o país do perigo iminente do comunismo".

Aliás, no dia do golpe, Dom Paulo Evaristo Arns, que terminou sendo um dos heróis da resistência contra a ditadura, deslocou-se de Petrópolis, RJ, onde morava, para abençoar a chegada das tropas golpistas do general Mourão Filho.

As relações dos militares com a Igreja azedaram depois do AI-5, de 1968, com o endurecimento do regime. "Ainda assim", diz Paulo César, "em maio de 1970 um texto da CNBB, em que a Igreja denunciava torturas nos porões do regime, também criticava ações de violência que podiam ser atribuídas à esquerda".

Quatro meses depois, em setembro de 1970, Igreja e Estado trocaram de mal para valer com a detenção por quatro horas de dom Aloísio Lorscheider, secretário-geral da CNBB.

— Por um instante, a hierarquia da Igreja uniu-se contra o Estado. Até o Papa Paulo VI deu apoio ao bispo — lembra o historiador.

Mesmo depois do, digamos, rompimento, ainda havia bispos que, isoladamente, davam apoio aos milicos.

O SNI registrou, em setembro de 1980, que o então arcebispo de Aracaju, dom Luciano Cabral Duarte, denunciou ao núncio apostólico, dom Carmine Rocco, a participação de Dom Hélder em ato, em Sergipe, no qual "teria pregado a união de estudantes e camponeses para a derrubada da ditadura".

República Comunista do Nordeste

Aliás, Dom Hélder chegou a ser acusado pelo SNI de ajudar a "eclodir um movimento separatista que teria como ponto de partida a região Norte-Nordeste".

Ah bom!"



 Abaixo uma dissertação de mestrado sobre a opção pastoral da diocese de Propriá, a qual fez o contraponto ao  modelo adotado por Dom Luciano José Cabral Duarte em Aracaju, após a morte do seu antecessor, Dom José Vicente Távora, seguidor da mesma opção adotada posteriormente em Propriá por Dom José Brandão de Castro,  tendo este sofrido por isso, inclusive da parte do arcebispo de Aracaju.

 CONFRONTO DA FÉ ANTE O ESCÂNDALO DA POBREZA: A EMERGÊNCIA DA OPÇÃO PREFERENCIAL PELOS POBRES NA DIOCESE DE PROPRIÁ/SE - (1968-1979)




Foto: Site Espaço Livre

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