quinta-feira, 19 de abril de 2012

A GENTE NÃO QUER SÓ PAGODE






A GENTE NÃO QUER SÓ PAGODE
por: MALU FONTES 


Quando se trata de falar criticamente de qualquer produto cultural, hoje, no Brasil, todo cuidado é pouco. Este é o país do elogio, das relações de comadre e de aplaudir sempre o famoso do bairro, mesmo que a sua música seja um lixo auditivo, seu filme seja uma sequência filmada de clichês e sua obra escrita provoque vergonha alheia. Quando se vive em Salvador e o assunto da conversa é música, o todo cuidado deve ser multiplicado à enésima potência.

Na verdade, se você é baiano, tem nível superior, tem uma rendinha razoável para não precisar recorrer aos empréstimos financeiros da moça do balcão da propaganda da TV e não é muito chegado aos ritmos onipresentes do axé e do pagode, uma advertência: se em qualquer espaço público onde estiverem mais de duas pessoas lhe pedirem sua opinião sobre os ritmos baianos, não pense duas vezes: diga que não tem opinião, que gosta de tudo e saia da conversa como entrou, como um peixe ensaboado. Somente assim você poderá livrar-se da pecha de arrogante, intelectualóide e, principalmente, de ser uma pessoa com forte pensamento de classe.

VALÃO - Em Salvador, não há outra opção entre gostar de axé e pagode ou ficar calado. Todas as outras equivalem a atrair desaforos. Para piorar o desconforto, nos últimos anos emergiu e se fortaleceu uma certa associação entre correntes culturais que privilegiam o relativismo (cultural e de tudo) e os movimentos sociais afirmativos que, juntos, atiram toda e qualquer declaração crítica sobre algo considerado popular no valão comum do preconceito contra os mais pobres. O que há de errado, esteticamente feio ou desqualificador no axé e no pagode? Absolutamente nada. Cada um produz, consome e apega-se afetivamente à cultura que pode e sabe fazer. O que está por trás da maioria das críticas feitas à hegemonia desses ritmos nos meios de comunicação é o modo massivo como ambos são privilegiados em detrimento de outros ritmos musicais. Para além do Arrocha e do Arrocha Universitário, que fique claro.

O problema (nem tampouco a solução) da música baiana não é o axé, o pagode, o arrocha ou seus semelhantes, mas o fato de haver toda uma geração de baianos abandonada em termos de formação cultural a quem sequer foi dado o direito de fazer escolhas estéticas. O sistema educacional na terra de todos os santos não tem conseguido suprir sequer as necessidades mais elementares da escolarização formal. Imagine-se, então, proporcionar esclarecimento suficiente para que a população trafegue por diferentes ramos e correntes estéticas, musicais, artísticas e possa fazer suas escolhas culturais em leques mais amplos. Há quem ache que o pagode é a mais linda das manifestações musicais do Século XXI de uma cidade que tenta há uma dúzia de anos e não consegue colocar um metrô nos trilhos. Mas será que, mesmo o gênero sendo tudo isso, dá para falar da dominação dele sem ser linchado por aqueles que consideram essa crítica um sinônimo de intolerância contra a cultura dos mais pobres? Não é. Só pede-se um pouquinho de chance para as pessoas aprenderem a gostar não apenas do que já gostam, mas também de outras formas de fazer música. A gente não quer só pagode...

Malu Fontes é jornalista, doutora em Comunicação e Cultura e professora da Facom-UFBA. maluzes@gmail.com Texto publicado originalmente em abril de 2012, na revista Plano B, n. 01. Salvador-BA


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“A gente não quer só comida, a gente quer comida, diversão e arte.”

Titãs



Os participantes do 2º Fórum de Políticas Publicas reunidos no dia 02 de agosto de 2003, no CAIC A. Rolemberg, para discutir formas de apoio ao trabalho com arte desenvolvidos por crianças e adolescentes residentes no Conjunto Jardim, vem a publico manifestar a necessidade do envolvimento urgente de toda a sociedade e de todas as esferas do governo para que as iniciativas de resgate a dignidade de centenas de crianças e adolescentes com arte sejam fortalecidas sob pena do agravamento da tragédia social que sacrifica milhares de vidas inocentes em nosso Pais.

Mas para isso como diz a letra da música “Até Quando - Gabriel, O Pensador”: “Na mudança de atitude, não há mal que não se mude, nem doença sem cura. Na mudança de postura a gente fica mais seguro, na mudança do presente a gente molda o futuro”. È preciso uma mudança de atitude das famílias, da sociedade e dos governantes. É necessário mudar a atitude de descaso, de desinteresse, de falta de atenção e incentivo, de falta de apoio material e financeiro. Por isso é urgente que Empresários, ONGs, Igrejas, Sindicatos, o Presidente Lula através dos Ministérios da Cultura, da Educação, da Ação Social e do Esporte. O Governador João Alves através dos órgãos similares e os Prefeitos reunam adolescentes, jovens e especialistas e destinem recursos para o investimento em políticas públicas que integrem a arte, a educação, o esporte, a saúde e a geração de emprego e renda.
E mais barato do que investir nas Febens, na Policia e nos Presídios. Não é custo e sim investimento revertendo a favor do desenvolvimento econômico e social do país.
A reflexão sobre o que fazemos e as propostas que elaboramos são as seguintes.




O que queremos atingir através do resultado do trabalho com Arte:
• Queremos que nossas crianças saibam valorizar a nossa cultura, que elas tenham historia para contar, para que não sejam futuramente jovens desregrados, adultos sem criatividade, e sejam vozes que protestem contra o que a mídia joga aos seus filhos: danças que não constroem, não ensinam, nem os estimulam a pensar, não incentiva a sua criatividade. Para que não se construam pessoas sem objetivos, crianças que são concebidas, não sejam rejeitadas desde o ventre e para que vidas não mais se destruam , para que assim cada um como o beija flor, faca a sua parte.
• A arte e uma maneira de retirar as pessoas das ruas, uma expressão de identidade de cada um. Uma maneira de resgate social, revelando um novo olhar sobre as relações do individuo na sociedade. E preciso despertar a sensibilidade para recuperar a humanidade do ser para com outro ser e com o universo;
• Queremos construir um futuro melhor, ao mostrar talentos no campo profissional;
• Queremos adquirir respeito, e acabar com a discriminação acerca dos jovens do Conjunto Jardim;
• Queremos transmitir alegria;
• Queremos levar uma mensagem clara de amor aos adolescentes e jovens;
• Queremos promover a união no bairro;
• Mostrar o que há de bom, o que o jovem do Conjunto Jardim tem a oferecer de melhor e dessa forma modificar a idéia que as pessoas tem sobre a violência no bairro.

Quais são as nossas dificuldades para atingir estes objetivos:
• Falta de valorização da comunidade e muitas vezes da família;
• A falta de incentivo da família e devido a dificuldades financeiras, os jovens precisam a começar a trabalhar cedo para ajudar na renda familiar, eles muita das vezes são chamados de vagabundos por fazerem parte de um grupo de arte e não trabalharem na maioria das vezes por falta de qualificação e oportunidade.
• Falta de espaço propicio para a pratica desportiva e para o trabalho artístico. O Conjunto Jardim necessita de quadras de esporte e da reforma e manutenção dos espaços já disponíveis de modo a permitir ensaios com segurança;
• Falta de apoio no que diz respeito a espaço físico, recursos financeiros, formação humana e técnica profissional na perspectiva de desmistificação da arte como forma de expressão de uma classe abastada, rompendo com o preconceito em relação aquilo que vem da periferia;
• Falta de espaço cultural para apresentações;
• Falta de apoio financeiro;
• Falta de materiais adequados;
• As escolas não trabalham conteúdos de danças populares;
• Falta de encontro de grupos artísticos (Festival de Arte, Mostra Cultural);
• Falta de união e respeito entre os grupos.

Sugestões para o Poder Publico, ONGs e Empresas:
• Fortalecer as organizações já existentes, grupos de dança, teatro, musica e capoeira;
• E necessário trazer para o Conjunto Jardim profissionais capacitados para dar aulas de teatro, musica, pintura, artesanato etc., de modo a não só afastar o jovem do ócio e da marginalidade, como propiciar uma profissionalização, ou seja, que o jovem possa encontrar na arte uma fonte de renda;
• Projetos que fomentem o desenvolvimento humano e social, despertando a auto-estima, valorizando a pessoa humana, e buscando descobrir a identidade cultural do bairro. Os projetos devem nascer da comunidade, ter os incentivos necessários, ser acompanhado por profissionais que tenham sensibilidade de respeitar o que e genuíno dos produtores em potencial que são os indivíduos envolvidos no projeto;
• Apoio cultural e financeiro, divulgação e trabalho feitos por esses grupos, criar um espaço cultural (academias, espaços para o lazer).

Como possibilidade de tornar possível a realização destas demandas apresentamos as seguintes alternativas:
Programa VAI – Programa de Valorização de Iniciativas Culturais – Tem como objetivo apoiar financeiramente por meio de subsidio, atividades artisitico-culturais, principalmente de jovens de baixa renda e de regiões do Município desprovidas de recursos e equipamentos culturais. Apresentado e aprovado na Câmara Municipal de São Paulo e sancionado pela Prefeita Marta Suplicy. Em Aracaju será apresentado na Câmara Municipal pelo Vereador Magal da Pastoral. Foi sugerida a extensão da proposta para todos o pais nos seminários promovidos pelo Ministério da Cultura em São Paulo e em Salvador, nesta ultima cidade a sugestão partiu do Coordenador Pedagógico do Projeto Ecarte, Professor Zezito. O projeto de lei será apresentado a Câmara Municipal de Socorro e a Assembléia Legislativa de Sergipe. 
Bolsa Jovem – Sugestão apresentado pelo jornalista Gilberto Dimenstein, coordenador da Cidade Escola Aprendiz, através da internet aos candidatos a Presidência da Republica. A proposta inspirada no programa bolsa escola e Peti, propõe destinar um salário mínimo para os adolescentes e jovens estudantes que estejam envolvidos com a promoção de atividades artísticas e desportivas.
A proposta foi acatada, mas foi sugerido em termos emergenciais o seguinte:
Que o Estado e a Prefeitura contratem jovens protagonistas da ação cultural no Conjunto Jardim para desenvolver trabalhos nas Escolas, sendo que metade do tempo será dedicado as atividades de apoio à administração e a outra metade será destinada ao trabalho artístico com as crianças, adolescentes e jovens.
Esta proposta busca evitar que os coordenadores dos grupos desistam do trabalho com arte e cultura em virtude da necessidade de buscar trabalho no mercado formal e informal.
O principal argumento de defesa da idéia e o fato do trabalho desenvolvido pelos grupos representar um beneficio para toda a sociedade, na medida que evita o envolvimento de muitos adolescentes com drogas, com furtos e assaltos, previne a gravidez precoce, aumenta a auto estima etc.. Por isso e justo que o poder publico colabore desta forma
Programa Escolas da Paz – Este programa da Unesco, testado e aprovado no Rio de Janeiro, já extendido para outros Estados e Municípios tem como objetivo oferecer oportunidades de acesso à cultura, esporte, arte e lazer para jovens em situação de `vulnerabilidade social`, utilizando a estratégia de abrir escolas nos finais de semana – período de maior incidência de atos violentos envolvendo a juventude. Esta proposta amplia o trabalho desenvolvido pelos grupos em termos de quantidade de crianças e adolescentes atendidos, disponibiliza profissionais qualificados para dar suporte técnico às atividades, elabora um planejamento integrado, melhora os espaços físicos para a realização das atividades etc.. 

Participaram do evento 30 adolescentes e 10 jovens e adultos, envolvidos com as seguintes organizações.

Grupo de dança Ecarte, Grupo teatral Artes, Grupo Sest+dance, Grupo de dança Novos Talentos, Grupo de dança Leão Brasil , Grêmio Estudantil Zumbi dos Palmares. Professores e ex-professores do Colégio Leão Magno Brasil, Atuais e ex-integrantes da Pastoral da Juventude da Arquidiocese de Aracaju. Ex-integrante do Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua e Movimento Sem Teto.

Agradecemos a Deus e a todos que colaboraram para o sucesso do evento

Nossa Senhora do Socorro, 04 de agosto de 2003

Claudionor dos Santos
Coordenador do II Fórum de Políticas Publicas

Professor Zezito de Oliveira 
Coordenador Pedagógico do Projeto Estatuto da Criança e do Adolescente com Arte.

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

(Constituição Federal Art.227)

No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantido-se a estes a liberdade de criação e o acesso às fontes de cultura.
(ECA Art.58)

Os Municípios, com apoio dos Estados e da União, estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais, esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude. 
(ECA Art. 59)


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