terça-feira, 30 de abril de 2024

‘Se não reagirmos, em 15 anos não haverá mais democracia no mundo’, diz historiador

 







DEMOCRACIA

A queda do muro de Berlin em 1989, possibilitou ao mundo viver uma euforia democrática bastante auspiciosa. O desejo de uma sociedade livre de todos os autoritarismos, uma gênese, era a aspiração de muitos povos. Os totalitarismos deixaram marcas profundas nos povos. O grande paradoxo é que hoje estamos vendo o contrário, o desejo do retorno de ditaduras e regimes de exceção. Mas tudo isso tem uma gênese, uma origem. 

Com a força do processo de globalização, a meta que foi proposta ficou no meio do caminho, e o que vimos foi o agravamento da situação social. A melhoria nas condições de vida dos pobres do sul pobre, mas nos países desenvolvidos a situação das pessoas que um dia gozaram de um bem-estar social bastante expressivo, se deteriorou. O mais triste dessa situação é que se possibilitou a abertura para o fortalecimento de movimentos antidemocráticos em todo o mundo. O que estamos vendo hoje com ataques ferozes da extrema-direita contra a democracia é preocupante, pois, corremos o risco de chegarmos a uma barbárie social sem precedentes. Mas com todos os seus limites, a democracia vem resistindo bravamente, principalmente, quando se iniciou o processo de retrocesso global do espírito democrático nos povos. Como os fascistas estão ocupando o poder, hoje com mais frequência, por meio de eleições e outros meios, tudo isso aponta para crises institucionais que ocorrerão no futuro.

Que a democracia está em risco em todo mundo, ninguém duvida. A grande questão é: o que devemos fazer. Os partidos políticos têm sua importância, agora se eles não produzirem respostas criativas que estejam à altura dos problemas que estão eclodindo, a democracia poderá conhecer o seu ocaso. Para continuarmos nesse caminho democrático, é mister a superação das desigualdades sociais. É incompatível conciliar democracia com fome, com miséria, com racismo e tantas outras coisas. 

Tudo o que é humano pode ser aperfeiçoado. A democracia, com todos os seus limites, é um sistema muito superior a qualquer ditadura, e isso pode ser provado ao longo do tempo. Não restam dúvidas de que a efetivação de direitos na democracia atende mais às necessidades das pessoas do que os regimes de exceção. 

Neste ano, comemoramos no Brasil 60 anos da ditadura militar. Esse regime produziu crimes contra a humanidade. Infelizmente, nenhum carrasco foi julgado e levado aos tribunais, devido à mais imoral lei produzida nesse país, a lei da anistia, que dizia que ela tinha que ser ampla, geral e irrestrita. Igualar as vítimas com os carrascos, é de um cinismo ético monstruoso. O mentecapto inominável, ao proferir seu voto para o impedimento de Dilma Rousseff, o atribuiu ao famigerado torturador Brilhante Ustra. De um desqualificado político como esse negacionista não se pode esperar nada de bom e decente. Esse néscio deve ir para o lixo da história como o presidente que leva nas suas costas mais de setecentos mil mortos pela Covid.

A democracia representativa no Brasil atual pode ser considerada um desastre, pois a extrema-direita que está no parlamento representa a si mesma e aos seus interesses que são escusos. Os partidos apoiadores do extremismo político e religioso não têm vigor ideológico, tendem a ser clubes de amigos e amigas apoiadores das oligarquias locais, regionais, com forte feição de clientelismo. Toda extrema-direita está a serviço do privado e não do que é público. Como o público está a serviço do privado, a extrema-direita se organiza para além do Congresso Nacional para legitimar políticas antipopulares.

A extrema-direita, combatendo a democracia raivosamente, no fundo, está produzindo uma engenharia social e política que faz com que a situação social fique do jeito que está para assim o rico ficar cada vez mais rico à custa do pobre cada vez mais pobre. Essa classe política que hoje está no parlamento brasileiro é a pior que já existiu e tem como missão aprofundar a desigualdade social para assim beneficiar a classe burguesa que, como ave de rapina, se apropria de quase toda riqueza do país.

Se quisermos uma democracia participativa, se faz necessário o empenho pela luta social que procura controlar, limitar e modificar a ação e o poder daqueles que nos governam. Não é possível aceitar, numa sociedade democrática, privilégios e carências que determinam a desigualdade econômica, social e política. O fortalecimento pela luta da igualdade social nos leva a entender a democracia não como império da lei, mas também do conflito. O autoritarismo dos políticos da extrema-direita diante do conflito procura criminalizar os movimentos sociais. O poder que se diz guardião da Constituição, em muitas situações, defende os interesses do poder econômico ou da própria classe. 

A democracia, na sua essência, está destinada à realização mais plena das pessoas e da sociedade civil na sua globalidade. Não se pode prescindir dos valores fundamentais da democracia, tais como a justiça, a liberdade, entre outros, pois, do contrário, se afetaria a ordem democrática nos seus objetivos primais. Para a ordem democrática alcançar o seu ápice, é necessário que os cidadãos tenham comportamentos éticos que confiram legitimidade à referida ordem. 

No momento em que os movimentos da extrema-direita recrudescem, os sistemas democráticos sofrem uma crise social e política bastante preocupante. É impossível na ordem democrática ocultar os conflitos provenientes do tensionamento de posições ideológicas contrastantes. No universo da política, nada do que é público pode ficar oculto, devido à repressão do “status quo”, de uma ideia ou de interesse. Tudo que diga respeito à coletividade é de interesse de todos e não de determinado grupo. A democracia é eficaz para a explicitação dos conflitos sociais, procurando as soluções pactuadas para o bem de todos.

Diante do risco que a democracia corre no mundo, a grande questão eclode: a democracia será capaz de gerir suas divisões e encarar o extremismo ressurgente? A resposta virá com o tempo. Aguardemos essa resposta, trabalhando para banir do mundo a opressão.

Pe Waldemir Santana

Arquidiocese da Paraíba

Michels e partidos de esquerda. Artigo de Frei Betto

"A cabeça pensa onde os pés pisam. Um antídoto aos riscos apontados por Michels é a profunda ligação com os segmentos populares, o trabalho de base, a capacidade de ouvir críticas e se submeter à soberania da militância. E, sobretudo, não trocar o atacado pelo varejo – um programa de democracia verdadeiramente popular, tanto em nível político quanto econômico", escreve Frei Betto, escritor, autor de O diabo na corte: leitura crítica do Brasil atual” (Cortez), entre outros livros, em artigo enviado ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Eis o artigo.

As instituições (partidos, sindicatos, igrejas etc.) que nascem com ímpeto inovador, profético, revolucionário, tendem a se tornar burocráticas, oligárquicas, contrárias à proposta de origem. Esta a tese defendida por Robert Michels (1876-1936) em seu clássico “Sociologia dos partidos políticos”, publicado em 1911.

Segundo Max Weber, Michels se desiludiu com a ala esquerda do SPD (Partido Social-Democrata) da Alemanha. Acusou-o de “eleitorarismo”, voltado quase que exclusivamente para ganhar eleições; de “parlamentarista”, no sentido de restringir a atuação política ao jogo parlamentar; e de “oportunismo” dos líderes, preocupados prioritariamente em se manter na crista da onda política.

https://www.ihu.unisinos.br/categorias/637785-michels-e-partidos-de-esquerda

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