sexta-feira, 25 de abril de 2014

Quando a juventude se encontra em Brasília e discute políticas públicas culturais

24.04.2014
Artigo da estudante Yasmin Thayná publicado no  Brasil Post

Eu não tinha conseguido derramar lágrimas intensas durante esses dias tenebrosos no Rio de Janeiro. Esses dias de Amarildos sumidos, Claudia arrastada, jovem negro amarrado no poste e tantos outros casos de extermínio do povo negro. Mas foi no aeroporto de Brasília que derramei as lágrimas assim que olhei para o céu e já estava de noite. Já tinha deixado o ônibus com uma parte dos jovens mais importantes do país. Já não estava morrendo de rir com a história do psicodrama e a psicopiada do Jean, filho do Nelson Triunfo. Que garoto gente fina e bem humorado!
Já não estava rindo de doer a barriga com a Cinthya do São Miguel do Gostoso gritando torcendo pelo Vasco da Gama dentro do ônibus que nos levava ao aeroporto.

Estava partindo para o Rio com ainda mais vontade de fazer coisas, de estar participando mais ativamente desse tipo de construção. Chorei de emoção e dor: encontrei, no Curto Circuito da Juventude, pessoas que nunca encontraria se fosse esperar pelo planejamento geográfico do Brasil, que não foi feito para os encontros. De dor chorei porque boa parte da discussão foi pelo fim do extermínio da juventude negra no Brasil. E tem que ser assim. Enquanto o nosso povo negro estiver morrendo por esse Estado exterminador, não nos calaremos! Enquanto discutíamos políticas públicas para a juventude, um jovem negro foi assassinado na Maré.
No avião, parei de chorar e disse para mim: eu quero voltar muitas vezes, mas quero um dia participar de um encontro desses quando não for mais jovem para ouvir a juventude futura discutir suas políticas públicas. Quero que o extermínio da juventude negra não seja pauta e que tenhamos uma cultura que preze pela diversidade, com menos burocracias e para todxs. Que o povo cigano, indígena e quilombola sejam respeitados. Chega de extermínio!

Participei de um encontro onde boa parte era composta pela juventude negra. Pela primeira vez, entrei num lugar que não era um encontro específico para pretxs, fiz a minha clássica pergunta: quantxs pretxs? E vi MUITXS. Gente do interior do Acre, de Manaus, de Alagoas, Rio Grande do Norte, Sergipe, Pernambuco, Maranhão, Bahia, Goiás, Pará e tantos outros lugares. De quebra, no final do primeiro dia, assisti um show maravilhoso do Gog. Não é pouca tiração de onda não.

Foi o primeiro encontro de cultura que eu me senti parte importante. Onde vi que tinha coisas importantes para dizer, que eu podia participar ativamente sem medo de errar, sem medo de expor os problemas que a minha juventude enfrenta. Eu pude falar sem ser censurada, sem ser menosprezada. Tivemos todos esse espaço de fala que tanto falta dentro dos debates de cultura. O jovem é sempre um espectador. Na maioria das vezes tem alguém decidindo por nós. Estamos mudando!
Participei do primeiro Curto Circuito da Juventude com a Ministra Marta Suplicy ouvindo nossas necessidades talvez até um pouco surpresa com o grupo potente que esteve presente lá durante três dias. Pesadão! Esse grupo era pesadão.
No primeiro dia, todo mundo falou o nome, a idade, de onde é e o que faz. Só nessa rodada de apresentação, já valeu. Gente de todos os sertões brasileiros (periferias, interiores, favelas, quilombos, ocupações), e grandes cidades. Todos com ação no território. A maioria não institucionalizada, muitos coletivos, sujeitos fluidos que apavoram no país. Elxs querem desburocratizar os editais públicos de cultura, investimento continuado, diminuir fronteiras, ter o orgulho de contar quem são, instalar impressoras 3D em equipamentos públicos que disponibilizam computadores e internet em comunidades e centro de referência da juventude, um número maior de mulheres na computação, ampliar o Pronatec, criar micro-centros de formação, lançar uma prática de troca de pares entre os coletivos (para que eles aprendam um com os outros a resolver o problema que já lhe pertenceu), investimento direto para a juventude de maneira não meritocrática, que a juventude LGBT possa criar uma secretaria dentro do Ministério para criar suas políticas públicas, ônibus para a juventude ir para as ações em seus terreiros, baile funk, entre outros; instituição do passe livre, acesso à memória: substituição de figuras públicas que nomeiam as ruas, edifícios e outros equipamentos por atores históricos ligados às tradições e lutas por direitos, volta do edital Ponto de Mídia Livre Anual, entre outros.
Josinaldo do Mate com Angu, morador da Maré, puxou o assunto sobre o que está acontecendo na Maré com as ocupações militares. Os jovens fizeram um ato simbólico em apoio a todxs xs moradorxs do Complexo e incentivaram o Ministério da Cultura dialogar com os outros Ministérios.
Fiquei pensando o que é encontrar jovens como eu para discutir políticas públicas. Somos afetivos (de verdade!!), emocionados (mas não deslumbrados!!!), acreditamos uns nos outros, nos respeitamos, estamos sempre dizendo ao outro: máximo respeito. Trocamos WhatsApp, beijos, abraços, nos apaixonamos uns pelos outros, trocamos Facebook, conversas pautadas no futuro da cultura. Nos olhamos, nos tocamos, discutimos muito. Foi isso que fizemos durante os três dias.
Queria deixar um salve aqui para a equipe inteira que produziu o evento. Um salve super especial ao Guti Fraga, que almoçou com a gente, olhou nos nossos olhos, prestou atenção, ficou com a gente o tempo todo, não deixou a gente em momento nenhum. Muito obrigada!
A minha sorte foi ter voltado ao lado do Cebolinha, do bonde do passinho. Conversamos sobre editais, passinho, funk e subúrbio. Além de dividir o fone de ouvido comigo, ele disse: "agora sou um evangélico candomblecista. Me identifiquei com os caras, fiz uma nova família. Os manos dos terreiros deveriam fazer coisas junto com os evangélicos".
Conheci maior galera maneira. Deixo aqui o link (poucos, não dei conta de pegar todos) para alguns dos trabalhos sensacionais que marcaram presença no evento. Deixo aqui meu muito obrigada a todxs vocês que hackearam esse encontro!
·                  Keila Serruya é uma cineasta de Manaus que faz uns corres com vídeo junto com o grupo que se chama Picolé na Massa: http://vimeo.com/keilaserruya
·                 Leila Tupinambá é produtora do Eu Amo Baile Funk, aqui no Rio de Janeiro:http://www.euamobailefunk.com/
·                  No sabadão, participei do Sarau Radical, numa quebrada de Brasília, em São Sebastião realizado pela galera do Radicais Livres - SA. Essa edição foi mais do que especial. Teve Maracatu, Jean filho do Nelson Triunfo no beat box para o Mc Caio da VP cantar que "mulher nenhuma no mundo merece ser estuprada", entre outras intervenções artísticas do pessoal que foi ao encontro.
·                  Lá no Sarau, conheci o Magu Diga How, Rapper lá de São Sebastião:http://www.digahow.com.br/site/
·                  Marcinho Zola é diretor no grupo Instiga Gestão Cultura, lá em Porto Alegre:https://www.facebook.com/instiga.gestao.producao
·                  Luiz Fernando é ator e produtor no Coletivo Peneira e também produz o Sarau do escritório, no Bar da Cachaça, aqui no Rio:https://www.facebook.com/ColetivoPeneira
·                  Nilo Mortara é do Paraná e faz parte do Instituto de Cinema e Vídeo de Londrina- Kinoarte: https://www.facebook.com/fanpagekinoarte?fref=ts
·                  Conheci a Janaina, do Circo Crescer e Viver. Ainda quero hacker muito contigo! O pessoal do Circo, além de ter um programa super importante de circo social, está produzindo o maior festival internacional de circo:http://www.festivaldecirco.com.br/
·                  Cinthia Matos de São Miguel do Gostoso, no Rio Grande do Norte, faz parte do espaço de cultura e direitos humanos, o Tear: http://tearcultura.blogspot.com/
·                  O Mil Onilètó lá de São Luis do Maranhão faz parte da Rede Mocambos- Ma / Ile Ase Alagbede Olodumare / Juventude de terreiro.
·                  A Hanna, de Niterói, faz parte da Revista Biblioo. Vale a pena ler o que ela escreveu sobre o encontro: http://biblioo.info/cultura-pra-quem/
·                  Pai Júnior do Axé Talabi, de Pernambuco, é idealizador do projeto Comida de Santo: Poéticas Ancestrais da Culinária nagô:http://projetocomidadesanto.blogspot.com.br/
·                  Suellen Tavares é do Rio, faz parte do querido Grupo Cultural Jongo da Serrinha e também é uma das Jovens Lideranças Jongueiras do Sudeste:http://jongodaserrinha.org/
·                  André Luis da Associação Jongo Dito Ribeiro/Ile Omonibu Axé Beje-Ero/Jovens de Terreiro RMC/ Coletivo Saravaxé:http://comunidadejongoditoribeiro.wordpress.com/
·                  Luiza Mançano do CineKombão e Marcha Mundial das Mulheres:http://cinekombao.wordpress.com/
·                  Greice Ellen de Guaíba, Rio Grande do Sul do Ponto de Cultura Ilê Axé Cultural - Assobecaty (Associação Beneficiente Cultural Templo de Yemanjá):http://templodeyemanja.blogspot.com.br/

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