terça-feira, 4 de novembro de 2025

Mais repercussões sobre a matança, chacina e massacre no Rio de Janeiro

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CPI do Crime Organizado irá a fundo sem poupar ninguém, inclusive eventuais políticos, diz senador



Operação no Rio: mortes não restauram paz na comunidade, diz presidente da CPI do Crime Organizado






CIVILIZAÇÃO OU BARBÁRIE?
Os mais jovens não conhecem a história da Scuderie Le Cocq, organização paramilitar criada no Rio de Janeiro que, no fim dos anos 1960, tornou-se o primeiro grupo de extermínio do Rio. 
Os mais velhos associam seu nome à criação do Esquadrão da Morte.
A lista de fundadores da Scuderie estava cheia de policiais que nunca esconderam seu histórico de violência. Ela tinha estatuto e sede, e apoio público de jornalistas, empresários, advogados e até de juízes e desembargadores.
O slogan “bandido bom é bandido morto”, foi criado por seus membros. O símbolo do grupo era uma caveira com ossos cruzados e a siga EM (o símbolo do BOPE é uma caveira com duas pistolas cruzadas. A semelhança será mera coincidência?).
Naquela época, boa parte da sociedade aplaudia as execuções do grupo. Hoje, segundo dados de pesquisa do Instituto Datafolha, realizada após a operação policial nos Complexos da Penha e Alemão, a mais letal da história do Rio, 51% dos cariocas ainda concordam com o que prega a máxima do grupo.
Com o tempo, quase todos seus integrantes ou foram mortos ou acabaram presos por suborno, obstrução da Justiça, abuso de poder e envolvimento com bicheiros.
Na verdade, o que se vê na política de segurança do Rio, hoje, são as mesmas práticas que a velha Scuderie Le Cocq e seus “homens de ouro” praticavam: extermínio sumário, violência policial, chacinas, incursões letais nas favelas.
Não dá para apoiar esse tipo de ação. Para combater as facções criminosas que oprimem e se impõem na base do terror nas favelas do Rio, sejam traficantes ou milícias, é preciso usar um trabalho de inteligência e, ao mesmo tempo, ocupar o território com educação, esporte, cultura e saneamento.
Leva mais tempo do que um dia de morticínio. Mas a questão aqui é outra: civilização ou barbárie.
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Telhado na Cidade de Deus diz: "Aqui tem crianças, sonhos e famílias"

ONG chama atenção de autoridades para incursões com helicópteros

Alana Gandra - Repórter da Agência Brasil

Publicado em 31/10/2025 - 15:31 - Rio de Janeiro

Rio de Janeiro (RJ), 31/10/2025 - Faixa em telhado na Cidade de Deus para evitar tiros de helicópteros no local. Foto: ONG Nóiz/Divulgação© ONG Nóiz/Divulgação

Considerada uma das regiões mais perigosas da capital fluminense - devido a confrontos nas favelas da área - o bairro da Cidade de Deus, no Rio, ganhou uma faixa dias antes da Operação Convenção, chamando a atenção de autoridades para preservar a vida das famílias durante incursões policiais com auxílio de helicópteros.

A faixa foi colocada no último dia 24, no telhado da organização não governamental (ONG) Nóiz, localizada no coração da Cidade de Deus, em área conhecida como Karatê-Rocinha 2. O alerta diz “Calma! Aqui tem sonhos, crianças e famílias”.

A casa, grafitada em cores vibrantes, onde a ONG Nóiz funciona desde 2018, já foi alvo de tiros vindos de helicópteros, que destruíram uma caixa d’água, há quatro anos.

“A gente precisava chamar a atenção de alguma maneira para dizer que, embora saibamos que a comunidade toda tem famílias, tcrianças, aqui, em especial, a gente passa o dia inteiro em atividade. Sempre foi temeroso ser alvo de helicóptero. Então, decidimos colocar a faixa para chamar a atenção das autoridades”, disse, nesta sexta-feira (31), à Agência Brasil o presidente da ONG, André Melo.

Ele reforçou que a região já foi objeto de incursões sérias da polícia e a preocupação era que as equipes da ONG e as pessoas da comunidade assistidas não corressem risco de morte no local.

Atendimentos

Atualmente, estão cadastradas na ONG 250 crianças. Entre crianças, jovens e adultos que frequentam o local diariamente, são cerca de 120 pessoas. A organização funciona de segunda-feira a sábado, das 8h às 18h. Há atividades regulares que ocorrem no contra turno das crianças nas escolas. “A gente tem dança contemporânea, balé, teatro, jiu jitsu, reforço escolar, tem um projeto de apoio à alfabetização chamado Soletrar, tem uma lan house social disponível para acesso à internet. Isso é comunitário, qualquer pessoa pode usar”, citou Melo.

Além disso, a ONG Nóiz disponibiliza para a população local uma biblioteca que funciona desde a manhã até as 18h, apoio psicológico, além de terapeuta ocupacional para ajudar no tratamento de oito crianças autistas. “Isso tudo funciona durante a semana”.

Faixa em telhado na Cidade de Deus para evitar tiros de helicópteros no local. Foto: ONG Nóiz/Divulgação

Aos sábados, há a atividade chamada Sábado do Acolhimento, que atende entre 40 e 50 crianças que realizam atividades lúdicas no local. Outras ações no sábado incluem o pré-vestibular social, em que os jovens entram às 8h e saem à tarde, preparando-se para o ingresso na universidade, além do plantão da assistente social, que começa cedo e se encerra às 13h.

Cuidado

Questionado se a colocação de faixas semelhantes em outras comunidades ajudaria a diminuir tragédias, como a resultante da Operação Convenção, realizada pelo governo do estado na última terça-feira (28), André Melo ressaltou que é necessário que se tente fazer tudo o que for possível para chamar a atenção e para que as autoridades tenham mais cuidado.

“A gente não tem certeza se isso (faixa) é eficaz, porque não sabe o que passa pela cabeça das pessoas, principalmente de cima para baixo.” Ele acredita, porém, que tudo é válido para se tentar de alguma maneira diminuir um pouco a sensação de insegurança nas comunidades.

André Melo não é cria de favela, mas virou um empreendedor social. “Eu moro no asfalto, aprendi a viver aqui hoje. Larguei tudo na minha vida e estou na ONG todo dia, das 10h às 18h. Sou publicitário de formação. Então, se aprende com outro olhar a entender de fato o que é isso aqui e se cercar de possibilidades, de alternativas, para se proteger também”. Ele acredita que mesmo que se estendesse uma faixa branca nas favelas do Rio, apenas com a palavra escrita PAZ, já seria válido.

Demandas

A ONG Nóiz conta com voluntários que se dedicam ao projeto diariamente, “com o coração”, embora os professores sejam pagos. No total, trabalham no local 15 pessoas. “Todos estão dentro do mesmo propósito. O trabalho é realizado muito em função do que a comunidade demanda. Ações relativas à saúde mental têm sido acompanhadas de palestras de psiquiatras sobre o tema, há atendimento psicológico com as mães e as grávidas são acompanhadas até os seis meses de vida dos bebês, por exemplo. São estruturas que a gente vai montando para atender a comunidade.”

Na avaliação de André Melo, o Estado não cria referências para as crianças e jovens das comunidades, ou seja, não tem um olhar para elas. Ele sugeriu que os projetos de organizações não governamentais, que dão certo, deveriam ser mapeados e replicados pelo governo.

“A gente tem uma fila muito grande de espera de famílias que querem botar as crianças aqui e nota, perfeitamente, que existe um desespero por conta delas de colocar as crianças para terem referências aqui dentro.” 

Melo lamentou que o Estado não enxergue a maneira de tentar transformar as crianças e jovens com um outro olhar. “É o que a gente tenta fazer aqui”.

Ele concluiu que, enquanto a sociedade olhar para as comunidades de forma apartada, como se morassem em outro mundo, nada vai dar certo. 

Desembargador de SC manda carta à moradora do Complexo da Penha: ‘Estou andando ao seu lado’

Magistrado tomou posse em março e viralizou com discurso sobre ameaças do fascismo

 04/11/2025 | 06h58

Desembargador de SC manda carta à moradora do Complexo da Penha: ‘Estou andando ao seu lado’

O desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC), João Marcos Buch, conhecido durante seu período na Vara de Execuções Penais de Joinville por enviar cartas a detentos e seus parentes, redigiu um longo texto para uma mulher desconhecida no Rio de Janeiro. “Dona Nice” está a quilômetros de distância, mas enfrenta uma realidade que, na magistratura, ele tenta combater.

A senhora, abordada por uma emissora de televisão enquanto retornava para casa após a Operação que vitimou 121 pessoas no Rio de Janeiro, fez com que o magistrado se sentisse profundamente comovido. Ao longo da carta, ele cita ação conhecida como “ADPF das favelas”, que ele considera não ter sido “muito bem respeitada” pelas forças de segurança.

Buch explica, no texto, pontos que fazem parte da lei e que podem ter sido violados. Entre eles estão o uso proporcional da força, câmeras nas viaturas, elaboração de um plano de reocupação de territórios invadidos por organizações criminosas e a entrada da Polícia Federal nas investigações contra milícias e tráfico de drogas interestadual e internacional.

O magistrado, cujo discurso de posse como desembargador viralizou nas redes sociais no início do ano ao mencionar o termo “fascismo”, também escolhe o termo “chacina” para falar sobre a operação e suas consequências “extremamente letais sobre as comunidades marginalizadas”.

No texto, ele também questiona a “fórmula do confronto”, que considera “fadada ao fracasso”. “Por que é tão difícil que governos e autoridades entendam que somente políticas públicas inclusivas, articuladas à segurança pública, podem trazer benefícios reais para toda a sociedade?”.

Leia a íntegra da carta, repassada à colunista:

Uma carta para dona Nice

Querida dona Nice,

escrevo-lhe com afeto e respeito.

Meu nome é João Marcos, moro em Santa Catarina e trabalho com a Justiça. Sou desembargador, nome dado a juízes que atuam em recursos nos tribunais.

Na última terça-feira, vi sua entrevista no jornal da TV. A senhora voltava para casa, com sacolas de supermercado nas mãos, e foi parada por uma repórter que queria saber sobre a chacina ocorrida mais cedo nos complexos da Penha e do Alemão, onde mais tarde se viria a constatar que  121 pessoas (pode ser além) haviam sido mortas, na mais sangrenta intervenção da segurança pública já ocorrida no Rio de Janeiro e no Brasil dos tempos atuais.

Sua entrevista me marcou profundamente. Moradora desde sempre da Penha, a senhora disse que já não tinha mais esperança, que, nessa altura da vida, tendo visto tanta tragédia, tantas operações policiais, tantas pessoas próximas assassinadas, não acreditava mais que um dia a vida melhoraria — tudo era tristeza. Em seguida, a senhora se despediu da repórter e retomou seu caminho para casa, cambaleante, cansada, segurando as sacolas.

Hoje já é domingo; faz cinco dias que eu penso na senhora, faz cinco dias que estou andando ao seu lado, faz cinco dias que tento carregar as suas sacolas até sua casa. Por isso, querida Dona Nice, com o coração inquieto, mesmo sem saber nada da sua vida, senão o fato de que a senhora perdeu a esperança, resolvi lhe escrever.

Eu sei que esta carta nunca chegará a seu destino, pois nunca a postarei. Impotente que sou para modificar um átomo de sua vida e para lhe oferecer uma centelha de esperança, escrevo-lhe porque não consigo fazer diferente, porque não sei mais se a esperança também me abandonou.

Assim como nas favelas de Florianópolis, já estive em favelas do Rio; já me encharquei da beleza e da bondade de pessoas que tão bem me acolheram. E já testemunhei muita dor e injustiça. Entretanto, o fato é que nada mais conheço, além de que a vida de quem mora nessas comunidades periféricas é carente de direitos e de oportunidades.

Sabe, Dona Nice, sempre tive o cuidado de não me arvorar em senhor das verdades, e me incomoda muito ver quem acha que sabe de tudo — cegado por redes sociais e algoritmos —, pessoas com quem é impossível argumentar com base em fatos e lógica. É desolador ouvir suas vozes celebrando a chacina, justificando o horror com acusações sem conhecimento de causa sobre crimes antes cometidos. De onde vem esse ódio? De que veneno se alimentam esses seres humanos? Onde está sua bondade, sua compaixão?

Fico a pensar o que essas manifestações causam na senhora, que tanto já testemunhou e viveu. Será que a senhora ainda chora, ainda se revolta com a opressão e a violência que sua comunidade sofre? Essa chacina, para mim, que vivo em um apartamento confortável, localizado em um bairro seguro, saneado, arborizado, com espaços de cultura e lazer, provocou espanto, lamento e indignação. Porém, quando a pessoa tem sua dignidade tão ferida e há tanto tempo, ela acaba perdendo a consciência de que aquela situação fere de morte seus direitos. Então, não sei o quanto isso tudo lhe afetou; só sei que a esperança lhe foi roubada.

Em meus estudos e em meu trabalho, aprendi algo sobre o fenômeno da violência urbana. Depois de algum tempo procurando entender nossa sociedade, tomei conhecimento de que a fórmula do “confronto” na segurança pública é fadada ao fracasso (a senhora sabe disso bem antes de mim). Essa fórmula ceifa vidas de todos os lados e não supera as dificuldades das comunidades vulnerabilizadas. Por que é tão difícil que governos e autoridades entendam que somente políticas públicas inclusivas — de habitação, saneamento, saúde, educação, empregabilidade, cultura e lazer — articuladas à segurança pública, podem trazer benefícios reais para toda a sociedade?

No país, nós temos o Supremo Tribunal Federal (STF). Pois bem, a mais alta corte da Justiça definiu, em uma ação proposta pelo Partido Socialista Brasileiro (ADPF n.º 635, conhecida como ADPF das Favelas), que o governo do Rio deve seguir diversas regras nas operações policiais, como o uso proporcional da força, câmeras nas viaturas, elaboração de um plano de reocupação de territórios invadidos por organizações criminosas, bem como a entrada da Polícia Federal nas investigações contra milícias e tráfico de drogas interestadual e internacional. Olha, Dona Nice, parece que o Supremo não foi muito bem respeitado. Creio, inclusive, que logo logo autoridades terão de prestar contas.

Aliás, até a Organização das Nações Unidas (ONU), por meio do seu Alto Comissariado dos Direitos Humanos, declarou que essa operação policial — que eu chamo de chacina — ampliou a tendência de consequências extremamente letais sobre as comunidades marginalizadas e enfatizou que as autoridades têm obrigação perante as leis internacionais de direitos humanos.

Mas o que isso importa, não é? A chacina já aconteceu, vidas foram ceifadas, até policiais morreram — e não consigo imaginar a dor das famílias que tiveram seus entes sequestrados de suas vidas para todo o sempre.

Ainda sinto que um dia a justiça alcançará a todos os cidadãos, que as instituições funcionarão conforme a Constituição e que a dignidade da pessoa humana será, em definitivo, fundamento da República.

Dona Nice, inspirado na leitura de um livro chamado Antes que as Palavras te Abandonem, de um grande amigo, Leonardo Tônus, em que um imigrante, à procura de um amigo refugiado afegão em Berlim, escreve-lhe cartas, eu lhe digo que, se pudesse, eu a abraçaria e afirmaria, com o coração aberto, que não importa mais o resultado da luta, mas a capacidade de entender o seu chamado.

Dona Nice, neste Brasil tão sangrento, de séculos de escravidão, racismo, patriarcado e colonialismo, não tenho o direito de lhe pedir que volte a ter esperança. Entretanto, ouso lhe pedir outra coisa: atenda nosso chamado, não desista de mim, não desista de nós, não desista da humanidade.

Querida Dona Nice, a senhora é a nossa esperança, volte,

João Marcos Buch

Desterro, 02/11/25 – finados

PERGUNTAS QUE NÃO QUEREM CALAR

Dos 69 citados pelo MP na investigação que deu origem à megaoperação no Alemão/Penha, nenhum consta na lista dos mortos identificados até o momento. Estão presos? Fugiram?

Os chefões do CV na região - "Doca", "Gardenal", "BMW", "Bafo" e "Grandão" - não foram presos. Segundo a Polícia Civil, "Grandão" possuía um telefone exclusivo para se comunicar com PMs. Será que os “grandões” tiveram informações privilegiadas para escapar? 

Essas operações espetaculares só atingem o "andar de baixo"? E os "barões" do narconegócio, ficam intocáveis nas coberturas e mansões? Cortaram a cabeça de Iago, 20 anos (barbárie), mas os cabeças, que não são favelados, nunca são achados? E o curso do dinheiro, ninguém segue?

Por que nada se fala de uma "ocupação social" nas áreas objeto da ação mais violenta da história do país? Não estão preocupados com o dia seguinte, com a população trabalhadora?

O 28 de outubro de 2025 foi "planejado" de olho no 4 de outubro de 2026, dia das eleições nacionais? 

A extrema direita, que andava sem rumo, vai se aglutinar, "triunfante", em torno da pauta do populismo penal? "Quanto mais mata, mais resolve"?

Classificar traficantes como "terroristas" - como se não houvesse tipificação suficiente de seus graves crimes - não visa dar base à intervenção norte-americana por aqui, como Trump já faz em mares próximos e Flávio Bolsonaro sugeriu, na Baía de Guanabara?

Por que não votam a Pec da Segurança Pública? Vão apoiar o PL do combate às facções? 

O jornalista Bernardo Mello Franco, em seu artigo "O marketing da matança" (O Globo, 31/10/25), relembra: "Em 2018, o Rio elegeu Wilson Witzel, que prometia abater bandidos à base de 'tiro na cabecinha'. Ele não libertou as favelas da tirania do tráfico e foi cassado em meio a um escândalo de corrupção. Mês passado a polícia prendeu o deputado THJoias, acusado de contrabandear armas e lavar dinheiro para o CV. Ele era aliado do atual governador, que chegou ao poder como vice de Witzel".

A "firmeza" do governo estadual é a de uma estaca no brejo do cinismo, da incoerência, da falta de preocupação séria com a segurança da população.

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Presidente Lula sobe o tom contra o massacre de Cláudio Castro no Complexo do Alemão | 04.11.25




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