ALGUMAS NOTAS PARCIAIS. MINIMA MORALIA A BRASILEIRA
“O jogo só acaba quando termina”... Mas:
- o bolsonarismo caiu em campo pra fazer a campanha de Bolsonaro.
- Nós, mais uma vez, subestimamos a direita... Há uma “nova direita” extremada, fundamentalista e com peso parlamentar... Aqui, nosso maior erro... esse vinculo entre extrema direita e fundamentalismo religioso tem futuro neste brasil
- As esquerdas como um todo (o PT na frente) têm que reavaliar as táticas... é urgente isto... Apesar de tudo indicar que o PSOL será um diferencial em alguns estados.
- Damares eleita e tem mais conservadores/as vindo ai... É duro, mas faz todo sentido. Foi esta a razão dela se candidatar em Brasília e não em Sergipe como havia sido cogitado... Senado e câmara pode ser a pior surpresa. Moro pode se eleger... os três mais votados em São Paulo vem da extrema direita...
- 2016 e 2018 ainda tá pesando...
- o medo na política atual foi uma tática do bolsonarismo e seus milicos e funcionou...
- Lula é a grande esperança. O peso simbólico de Lula pode ser o diferencial. Pra nossa sorte, a extrema direita não tem um Lula!!! Mas no segundo turno, não será fácil...
AS NOVIDADES RUINS QUE SE APRESENTAM:
A extrema-direita avança para além de São Paulo (onde ela é organizada). Brasília, Mato Grosso, Rio, Sul e parte da região norte... PL com votação enorme (vitória do orçamento secreto!!!), Republicano... Nanicos...
Só meme, sem trabalho de base... não ganha eleição no Brasil. Uma esquerda dividida e só preocupada em se retroalimentar desce cada vez mais.
O QUE FAZER?
Não é apenas ter segundo turno. Psicologicamente, Bolsonaro chega mais motivado que Lula. Além de ter feito uma bancada inédita na câmara e senado... E pra piorar, as sobras do “orçamento secreto” e as “igrejas”... Lula tem peso simbólico, ainda. Mas o segundo turno é “outra” eleição. Vamos para as ruas? Vamos pra luta? Teremos condições de unidade das esquerdas? Tebet/bolsonaro? Lula/Ciro? Os institutos de pesquisa sairão desacreditados.
NÃO CULPEMOS O POVO POBRE:
Não tem povo pobre que resista: orçamento secreto, máquina estatal, discurso religioso fundamentalista, renovação dos quadros da direita e por fim, ainda as redes sociais bolsonaristas... E mais ainda as táticas da extrema direita atual e as classes dominantes deste brasil apequenado. Mais uma vez, Florestan Fernandes tinha razão sobre o papel histórico da burguesia brasileira.
Romero Venâncio. UFS
https://www.youtube.com/watch?v=eT7LfGj2oIc
DESCULPEM, MAS DÁ PARA GANHAR
1. O RESULTADO DAS ELEIÇÕES deste 2 de outubro é impactante em vários aspectos. O primeiro e mais evidente é o da falha gritante das pesquisas: elas não captaram a força do bolsonarismo e de seus agregados na sociedade brasileira.
2. O BRASIL É MUITO MAIS CONSERVADOR do que supunha nossa vã filosofia. Para qualquer um, que se paute por um pensamento democrático e progressista, é chocante ver gente como Hamilton Mourão, Sérgio Moro, Deltan Dallagnol, Ricardo Salles, Mario Frias, Damares Alves, Magno Malta e semelhantes serem consagrados pelo voto popular. Temos aqui o enraizamento social da extrema-direita após os quase 700 mil mortos da pandemia, os 33 milhões com fome, a apologia das armas e de tudo o mais. O fascismo não nos é mais um corpo estranho; foi naturalizado. Ao mesmo tempo, esse é o país que gera o fenômeno Boulos, que trafega em sentido contrário, com um milhão de votos.
3. ENTENDER COMO e porque isso acontece é tarefa dura e longa. Interessa saber como essa brutalização da vida social se torna atraente para milhões de pessoas.
4. SOMOS UM PAÍS TREMENDAMENTE DESIGUAL, com a maioria dos trabalhadores fora do mercado formal, sem direitos trabalhistas (ou de cidadania), mal formados (pela exclusão educacional proporcionada pela precariedade da escola pública), mal informados (por redes sociais e por uma mídia que não está aí para isso), sem tempo para o lazer, brutalizada pela dura batalha do dia a dia e sem perspectiva de futuro. Somos, além disso, uma coletividade fragmentada, marcada por um individualismo atroz, na qual há raros incentivos para que se estabeleçam laços de solidariedade.
5. SOMOS, ENFIM, UMA SOCIEDADE em que o lumpesinato tem enorme peso em sua composição e em que o favor, o compadrio e o ódio são manifestações usuais nas relações humanas. Esse estilhaçamento comunitário, potencializado pelo desmonte do mundo do trabalho ao longo de quatro décadas de neoliberalismo nos torna sensíveis a um tipo de liderança salvacionista e inorgânica – uma espécie de neopopulismo – , capaz de direcionar vontades e de transformar a raiva social em força política. Esse é o resumo do resumo do caldo de cultura que possibilita a ascensão do bolsonarismo. E isso nós – alinhados a um pensamento democrático e progressista – ainda não conhecemos totalmente.
6. QUE SOCIEDADE É ESSA cujas vontades não são captadas pelas sondagens de vários institutos? Ou melhor, que pesquisas são essas que não conseguem apreender e tabular preferências imediatas? Como é possível que siga se repetindo o fenômeno notado na eleição do Rio de Janeiro de 2018, que possibilitou a um desconhecido até a última semana de campanha se tornasse governador? A situação se generaliza, com o quadro paulista, que inverte a folgada dianteira aferida em favor de Fernando Haddad em sua disputa com Tarcísio de Freitas a poucos dias da votação.
7. O BOLSONARISMO OCULTO – ou envergonhado – é fenômeno que desafia as estatísticas. Ao lado da arrogância dos que exibem armas na cintura estão aqueles que sentem vergonha de se declararem eleitores de Bolsonaro fora da solidão da urna. Por que isso acontece?
8. EM SITUAÇÕES NORMAIS – ou seja, num estudo acadêmico e fora das eleições – tais constatações podem gerar copiosas teses de doutorado. Aqui se trata de avaliar resultados das urnas com um propósito definido: ganhar no segundo turno.
9. SE ERRARAM EM BOA PARTE das disputas estaduais, as pesquisas acertaram em cheio a votação nacional de Lula. Os prognósticos davam entre 47% e 51% de votos ao ex-presidente. Ele terminou o enfrentamento com 48,43% dos válidos. Faltou 1,57% dos sufrágios para uma vitória perfeitamente possível em primeiro turno! O equívoco das pesquisas ficou no segundo colocado. Segundo os institutos, Bolsonaro teria entre 37% e 41%. Ele terminou com 43,2%, ou 5,23% atrás do ex-presidente. Em números redondos, quase 6,2 milhões de votos atrás.
10. O SEGUNDO TURNO É UMA NOVA ELEIÇÃO. A vantagem aberta por Lula o coloca de saída em condição de vantagem. A soma do eleitorado de Ciro e de Simone Tebet totaliza 7,2%. É uma incógnita saber para onde penderão esses quase 7,6 milhões de eleitores, decisivos para o resultado final. Na hipótese – agora fluida – das pesquisas – todas - estarem corretas, Lula derrota Bolsonaro.
11. EXAMINANDO OS APOIOS ESTADUAIS, a vantagem se inverte. Apoiadores de Bolsonaro ganharam em 9 estados no primeiro turno (AC, DF, GO, MG, MT, PR, RJ, RO e TO), que somam 49.115.309 eleitores. Partidários de Lula levaram em 6 (AP, CE, MA, PA, PI, RN), onde vivem 23.592.589 eleitores. A comparação mostra que o bolsonarismo não é fenômeno dos grotões. Em 12 estados a contenda se resolverá na segunda volta (AL, AM, BA, ES, MS, PA, PE, SC, SE, SP, RO, e RS). Nesse último grupo haverá campanha acirrada dos presidenciáveis com os candidatos locais. Não se sabe como se comportarão os demais, onde o placar local está decidido.
12. A LUTA SERÁ DURÍSSIMA. É possível Lula ganhar no dia 30. Para isso, a campanha bem que poderia mudar de tom.
13. A PRIMEIRA COISA SERIA ABOLIR o passado e o salto alto nos discursos. Chega de “No meu governo o povo tinha isso e mais aquilo”. O que passou, passou e agora é hora de se dizer claramente o que será feito. Vai ter comida para todo mundo? Se tiver, vai ser barata? Vai ter emprego? Com salário de quanto? A gasolina ficará com o preço baixo? Minhas dívidas vão ser resolvidas? Vai ter saúde? Como resolver? Não é o eleitor quem tem de responder, mas a campanha.
14. TEREMOS UMA CAMPANHA COM COMÍCIOS que se parecem com shows do Rock in Rio, nos quais a plateia assiste, se deleita e vai para casa? Ou haverá um mínimo de chamamento à mobilização? Vai ter material? Anunciaram lá atrás um comitê voltado para essas coisas. Vai ter? A campanha de TV sairá do pieguismo brega do início, ou manterá o tom de combate dos últimos dias? Vão ficar repetindo feito matracas que Bolsonaro tem 51 imóveis comprados com dinheiro vivo ou uma equipe de reportagem irá atrás de pelo menos dois ou três e mostrará o valor, onde ficam, se são de luxo ou não? Ou seja, ficarão na conversa ou farão como a Globo agiu no caso do sítio de Atibaia, atribuído a Lula? Ali mostraram dos pedalinhos às torres dos cabos de internet, passando pelo laguinho doméstico. A campanha será concreta ou doutrinária?
15. ACIMA DE TUDO, é preciso termos uma jornada empolgante, que convoque as pessoas à luta por mais votos. Lambamos as feridas deste fim de semana para a batalha que se aproxima. Será dura, mas valerá a pena.
RÁPIDA OLHADA NA CONJUNTURA
Roberto Malvezzi (Gogó)
“Cada ponto de vista é a vista de um ponto”, já diziam os teólogos da libertação. Então, olhar o Brasil a partir do sol do Nordeste é ver um Brasil diferente, resistente, resiliente, rebelde, que não faz nenhuma concessão ao fascismo brasileiro. É um privilégio, reconheço, mas talvez nos ajude nesse outubro de 2022 que promete ser tenso e decisivo para o Brasil.
Por aqui, PT fez três governadores (PI, CE e RN) e disputa mais dois estados no segundo turno (BA e SE). Ainda há São Paulo e Santa Catarina. É o partido que mais elegeu governadores nessa eleição e pode eleger outros. A média de votos em Lula foi de 65% no Nordeste, mas pode chegar a 70% no segundo turno. Estados como o Piauí costumam chegar a 80%. Quem não é do PT, é próximo, ainda que informalmente, como Marília Arraes em Pernambuco. Ainda elegeu 68 (?) deputado(a)s federais, inúmeros estaduais e vários senadores pelo Brasil.
Lula avançou em todos os estados brasileiros e teve 25,6 milhões a mais que Haddad na eleição passada (G1). Seus 57 milhões de votos representam a maior votação que um candidato já teve em primeiro turno. O adversário ficou praticamente estagnado, com a votação que teve na eleição passada.
As pesquisas oscilaram, mas no conjunto não erraram. A votação de Lula foi dentro da margem de erro e o adversário cresceu sobretudo no Sudeste, particularmente São Paulo. Aqui na Bahia um instituto baiano já previa que Jerônimo poderia vencer no primeiro turno e ele teve 49,5% dos votos. Vai pro segundo turno. Em todo caso, acertaram muito mais que certo candidato que dizia confiar no “datapovo” e que teria 60% dos votos. Fica provado que motociata não é pesquisa para conferir possibilidades eleitorais. Se as pesquisas erraram, o “datapovo” errou muito mais.
A direita extrema cresceu no Congresso. Mas, o PT também cresceu, juntamente com seus aliados. Elegeram-se índios, negros, LGBTs, Sem Terra, Sem Teto, e uma constelação de candidatos proibidos de existirem na Terra de Santa Cruz.
Quem se assusta com o avanço da extrema-direita tem suas razões. Afinal, a ideologia difundida cada vez mais no meio do povo vem pela tubulação religiosa, neopentecostal, tanto evangélica como católica, vem dos templos. Os currais eclesiais funcionam e não adianta estudiosos acadêmicos pretenderem passar o pano para essa realidade. Esse avanço neopentecostal vai esgarçar cada vez mais o tecido social brasileiro, nos tornando sempre mais reacionários, moralistas, hipócritas, desumanos, preconceituosos, em nome de Deus, da Pátria e da Família. Os processos históricos indicam que um dia isso cansa, também se esgota, mas ainda terá muito fôlego por aqui. Porém, vamos lembrar que a maioria do povo brasileiro, sobretudo os mais pobres, disseram não a essa matilha de lobos. É uma vitória da direita? Pode ser, mas também é uma derrota, afinal, nem com dinheiro do orçamento secreto injetado na veia conseguiram reverter a derrota no primeiro turno
Lula presidente pode ajudar com suas políticas públicas, com a justiça aos mais empobrecidos, com o respeito a toda população brasileira, sobretudo àquelas que “vivem nas bordas do planeta”, como diz Ailton Krenak. Assim, pode reconquistar o imenso apoio popular que um dia já foi mais forte, mesmo com toda a adversidade do Congresso.
Não façamos política com o fígado. Alguém que esteve preso por mais de um ano nos ensinou essa lição. Hoje o sol brilha no Nordeste com muita intensidade e a temperatura ambiente está em 25º segundo o Climatempo.
Gilberto Maringoni... Professor da UFABC e integrante do PSOL.
Refundar a Política
Marcelo Barros
No mundo inteiro, cresce o número de pessoas e grupos que sentem a necessidade de restituir à Política um espírito e modo de atuar que parecem esquecidos ou desvalorizados. No Brasil, as pastorais sociais ligadas à Igreja Católica e a algumas confissões evangélicas desenvolveram o projeto “Reencantar a Política”. Isso significa aprofundar a ação política como caminho de participação de toda sociedade na construção do bem comum. A Política parlamentar e representativa supõe um trabalho político de base que vai suscitando uma Política participativa e, o quanto possível, mais direta.
Na Itália, no início de setembro, na Città di Castelo, um congresso de organizações sociais tinha como tema: “A urgência da Política”. Apesar disso, no domingo, 25 de setembro, o povo italiano elegeu como governo uma coalizão de direita, populista e com ideias neofascistas, que apontam no sentido contrário.
No Brasil, as eleições nacionais de 2 de outubro, mais do que apenas representar a escolha de candidatos, revelou a necessidade de retomar a dignidade da Política, como campo no qual pessoas e grupos das mais diferentes correntes sociais debatam com liberdade e respeito ao diferente sobre a construção de uma pátria comum que cuide da mãe Terra e promova a justiça eco-social, a mais integral possível. O resultado das eleições, principalmente para os cargos legislativos, mostrou que, em todo o país, predomina a força da elite e critérios opostos a uma verdadeira participação de toda a sociedade nos destinos do país. Parece que nos estados o fato das alianças partirem das cúpulas nacionais e serem impostas às bases tem dividido mais as forças populares e favorecido a vitória da direita.
É preciso insistir que a Política se exerce em duas dimensões:
A mais imediata é restabelecer a humanização da convivência política na pluralidade de partidos e de tendências humanas, sem demonizar o diferente. Isso supõe o embate entre propostas e projetos políticos, nos quais dos dois lados, as pessoas respeitem a Ética e o caráter laical da sociedade, sem dar lugar ao ódio, à intolerância e desumanização do outro.
Ao mesmo tempo que a Política é a arte de construir o que é possível nas condições atuais, (e as condições do Brasil não são muito favoráveis), ela tem como vocação apontar para a ousadia de promover a justiça eco-social, baseada em maior igualdade entre as pessoas e o respeito aos direitos individuais e comunitários de toda pessoa humana e dos povos como sujeitos coletivos. Essa Política com P maiúsculo é a grande Política que traduz mais profundamente a solidariedade que, como Pedro Casaldáliga dizia, expressa a ternura no nível coletivo e comunitário. Este patamar da Política abre a porta para outro horizonte que responde à vocação humana de construir a utopia. Não podemos renunciar à profecia da Política participativa direta e que tenha como objetivo construir uma humanidade nova, tendo por base uma economia baseada na justiça e na solidariedade, assim como a Ecologia Integral que garanta a sustentabilidade na comunidade da Vida.
Cada vez mais cresce o número de pessoas que, fieis aos diversos caminhos da espiritualidade descobrem que a fé se vive na adesão ao projeto que Deus revelou na Bíblia e em outros livros sagrados. Trata-se de construir um mundo de Paz, Justiça e Amor. Nos evangelhos, Jesus propõe que peçamos a Deus que “o seu reino venha” e nos encarrega de sermos testemunhas do reinado divino na construção social e política de um mundo novo possível.
Na história bíblica, foi sempre quando a conjuntura política era mais opressiva e quando menos o reinado divino aparecia como horizonte possível que a fé e a profecia faziam as comunidades teimarem em afirmar que o reinado divino estava muito próximo. No estilo do Apocalipse, quanto mais os sofrimentos são fortes, mais podemos escutar a palavra do evangelho: “Quando virdes essas coisas acontecerem, olhai para o alto e levantai a cabeça, porque é vossa libertação que se aproxima” (Lc 21, 28). Que nossa inserção na Política seja expressão dessa esperança maior.
1ª Atualização de links e textos nessa postagens
https://www.youtube.com/watch?v=orVrLxVbNRs&t=3s
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