quinta-feira, 25 de setembro de 2025

Por que é dificil realizar ação cultural como metodologia pedagógica transversal de forma continua e permanente na escola pública?

 A dificuldade dos formuladores de políticas em priorizar o investimento no repertório cultural não é uma simples falta de vontade, mas sim o resultado de uma complexa combinação de fatores históricos, estruturais e conceituais.

Encontro do Coletivo Investigador - Recife / PE - Junho 2012 - Pesquisa-ação para um Plano Articulado

entre Cultura e Educação

Vamos analisar as razões para essa dificuldade e, em seguida, seus impactos negativos.

Por que os formuladores de políticas têm essa dificuldade?

1. Mentalidade Utilitarista e Economicista da Educação:

Foco em Métricas Quantificáveis: O sistema educacional moderno é dominado pela busca de resultados mensuráveis, principalmente em avaliações em larga escala como o SAEB, o ENEM e o IDEB. O investimento é direcionado para o que "entrega resultado" nessas métricas: português (foco em leitura e interpretação) e matemática. O repertório cultural é visto como "subjetivo" e de difícil avaliação, portanto, menos prioritário.

Educação como Ferramenta para o Mercado: Há uma pressão forte para que a educação prepare mão de obra para o mercado de trabalho. Disciplinas como artes, música, filosofia e sociologia são frequentemente vistas como "menos úteis" para a empregabilidade imediata, ignorando que habilidades como criatividade, pensamento crítico e empatia (fortalecidas pela cultura) são cada vez mais valorizadas.

2. Herança Histórica e Estrutural:

Desvalorização Crônica das Humanidades: Existe uma tradição no Brasil de subvalorizar as áreas de humanas e artes em prol de um suposto "conhecimento técnico" e "científico". Isso se reflete na grade curricular, que muitas vezes trata as disciplinas culturais como coadjuvantes.

Falta de Formação Específica dos Gestores: Muitos formuladores de políticas têm formação em áreas como direito, economia ou administração, sem uma base sólida em pedagogia, sociologia da educação ou teoria das inteligências múltiplas. Eles podem não compreender profundamente o como e o porquê o repertório cultural é fundamental para a cognição.

3. Restrições Orçamentárias e Pressões por Eficiência:

Custo Percebido como Alto: Montar uma orquestra escolar, manter uma biblioteca diversificada e atualizada, levar alunos a museus e teatros é visto como caro e logísticamente complexo. Em um cenário de recursos escassos, essas atividades são as primeiras a serem cortadas.

Falta de Evidências "Duras" em Larga Escala: Embora haja vasta evidência qualitativa e de casos de sucesso, é difícil produzir estudos econométricos que comprovem, de forma irrefutável e em larga escala, que um real investido em cultura gera um aumento de X pontos no IDEB. Essa falta de "prova" em um modelo positivista dificulta a defesa do orçamento.

4. Uma Visão Reduzida de "Cultura":

Cultura como Acessório ou Entretenimento: Muitos gestores enxergam a cultura não como um pilar do desenvolvimento cognitivo, mas como uma atividade extracurricular, um "tempo livre" ou uma forma de entreter os alunos. Não compreendem que a cultura é a matéria-prima para a construção de significado e para o desenvolvimento de diversas inteligências.

Desconexão com a Teoria das Inteligências Múltiplas (Howard Gardner): A política educacional ainda é majoritariamente pautada por uma visão de inteligência única e mensurável (lógico-matemática e linguística). A teoria de Gardner, que defende inteligências espacial, musical, corporal-cinestésica, interpessoal, intrapessoal, naturalista e existencial, não é incorporada de forma prática no desenho das políticas e na alocação de recursos.

Como a Falta Desse Investimento Impacta Negativamente a Escola e o Aprendizado

1. Empobrecimento do Ambiente Escolar:

Ambiente Árido e Desestimulante: A escola se torna um lugar de transmissão de conteúdo puro e simples, sem vida, cor, som ou movimento. Isso gera desinteresse, apatia e aumenta a evasão escolar.

Falta de Identificação e Pertencimento: Quando a cultura local, as artes e as expressões dos alunos não são valorizadas, a escola se torna um espaço alienante, distante da realidade da comunidade. O repertório cultural fortalece a identidade e o senso de pertencimento, que são fundamentais para um bom clima escolar.

2. Prejuízos ao Aprendizado e às Inteligências Múltiplas:

Dificuldade de Compreensão de Texto e Contexto: O repertório cultural é a base para a leitura de mundo. Um aluno com pouco acesso a livros, filmes, pinturas e discussões filosóficas terá muito mais dificuldade em interpretar textos complexos, pois falta-lhe o "banco de dados" mental necessário para fazer conexões.

Bloqueio do Desenvolvimento de Inteligências Específicas:

Inteligência Espacial: É negligenciada sem atividades com artes visuais, arquitetura, desenho geométrico.

Inteligência Musical: É ignorada sem a educação musical de qualidade.

Inteligência Corporal-Cinestésica: É pouco desenvolvida sem teatro, dança e educação física que vá além do esporte.

Inteligências Pessoal e Interpessoal: São prejudicadas sem atividades que promovam a autoexpressão (artes) e a colaboração (teatro, música em grupo).

Prejuízo à Criatividade e ao Pensamento Crítico: A arte e a cultura desafiam os alunos a pensar de forma não linear, a questionar, a criar novas soluções e a ver o mundo por múltiplas perspectivas. Sem isso, a educação corre o risco de produzir pessoas que apenas reproduzem informações, mas não inovam.

3. Ampliação das Desigualdades:

Privilégio de Classe: Alunos de classes mais abastadas têm acesso ao repertório cultural fora da escola (viajando, indo a museus, teatros, tendo aulas de música e arte). A escola pública, ao não oferecer esse acesso, falha em sua função equalizadora e perpetua a desigualdade, negando a crianças e jovens de baixa renda a oportunidade de desenvolver plenamente seu potencial.

Conclusão

A resistência em investir no repertório cultural é um sintoma de uma visão reducionista da educação, que a trata como uma linha de montagem para resultados em provas, e não como um processo humano complexo de desenvolvimento de múltiplas capacidades. Superar essa visão exige uma mudança de paradigma por parte dos gestores, que precisam entender que o repertório cultural não é um luxo, mas uma ferramenta cognitiva fundamental. É o que permite conectar conhecimentos, dar significado ao aprendizado e formar cidadãos completos, críticos e criativos, capazes de navegar em um mundo cada vez mais complexo.

A boa notícia é que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) avança ao incorporar as competências gerais, que dialogam diretamente com a necessidade do repertório cultural. O desafio agora é traduzir esse documento em políticas públicas concretas com a devida alocação de recursos financeiros e humanos.

Zezito de Oliveira

Texto produzido com IA deepseek

quarta-feira, 18 de junho de 2025

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