13/05/2013
ANDRÉ
TRIGUEIRO é um dos jornalistas mais competentes em questões ecológicas e
principalmente com seu programa na Globonews Cidades e Soluções procura
dar relevância aos experimentos bem sucedidos, daqueles que vem de
baixo, que podem incentivar a outros a segui-los. Este artigo é um
alerta face à situação do aquecimento global que não para de crescer.
Acrescento um dado da U.S.Natonal Academy of Sciences de 2002 e repetido
em 2007 que afirma: pelo pouco que fazemos, podemos conhecer nos
próximos tempos um Abrupt Climate Change. O clima poderá em
pouco tempo subir a 4-6 graus Celsius. Com essa temperatura as formas de
vida conhecidas dificilmente subsistirão e grande da humanidade poderá
até desaparecer. Basicamente estamos jogando roleta-russa com a arma
apontada para a cabeça de nossos filhos e netos. Isso não é terrorismo
ecológico mas séria advertência. Desta vez não podemos errar ou chegar
tarde demais, porque aí sim teremos um destino dramático e trágico. O
artigo foi publicado no Blog Mundo Sustentável de 13/05.2013: LBoff
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Cada
geração deixa para a seguinte um legado, uma herança, uma marca de sua
passagem pela Terra. Quando na última quinta-feira (9), dois diferentes
observatórios internacionais confirmaram a concentração recorde de 400 partes por milhão de C02 na atmosfera,
materializamos um dos mais terríveis legados da nossa geração. Se for
para ser assim, é bom que saibamos exatamente o que isso significa.
Apesar
de todos os alertas da comunidade científica – especialmente do grupo
de aproximadamente 2.500 cientistas reunidos no Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU – chegamos ao patamar
considerado de risco para que os fenômenos climáticos ocorram de forma
minimamente previsível e não ameace a vida tal como a conhecemos. Ou
seja, estaríamos maculando o software inteligente da natureza através do
qual os ciclos climáticos se resolvem.
Sim,
ao longo de sua história o planeta já sofreu várias glaciações e já
conheceu períodos de concentrações ainda mais intensos de CO2 na
atmosfera. O fato é que jamais tamanha acumulação de gases na atmosfera
aconteceu tão rapidamente, determinando em um período tão curto de tempo
variações tão importantes de temperatura. Em resumo: este novo ciclo de
aquecimento global guarda uma forte relação com nossos hábitos,
comportamentos, padrões de consumo e estilos de vida.
É
como diz Nate Lewis, do Instituto de Tecnologia da Califórnia: “A
composição da atmosfera terrestre tem permanecido relativamente imutável
por 20 milhões de anos. Mas nos últimos 100 anos, começamos a
transformar de forma drástica essa atmosfera, e a mudar o equilíbrio de
calor entre a Terra e o Sol, de modo que essas mudanças poderão afetar
enormemente o habitat de cada planta, animal ou ser humano neste
planeta”.
A
capacidade de o planeta “metabolizar” os gases-estufa através de
fenômenos naturais de absorção pelos oceanos, solos e florestas é de
aproximadamente 5 bilhões de toneladas por ano. Apenas no ano de 2008
(no auge da crise internacional e com as economias do mundo
desaceleradas) emitiu-se 7,9 bilhões de toneladas com a queima de
combustíveis fósseis e 1,5 bilhão de toneladas com os desmatamentos.
Esses 4,4 bilhões de toneladas a mais vão se acumulando lenta e
perigosamente na atmosfera, agravando a retenção de calor.
Os
10 anos mais quentes já registrados desde o início das medições, em
1880, ocorreram a partir de 1996. A concentração de 400 ppm de CO2
registrada dias atrás projeta um cenário de aquecimento – se nada for
feito e continuarmos aumentando nesse ritmo as emissões de gases-estufa –
que poderá chegar aos 6,4 ºC graus até o final do século.
Professor
de Política Ambiental em Harvard e ex-presidente da Associação
Americana para o Progresso da Ciência, John Holdren explica de forma
bastante simples os impactos da elevação da temperatura do planeta: “A
temperatura normal de seu corpo é cerca de 37 ºC. Quando sobe um pouco,
até 39 ºC, isso já é uma coisa grave, e mostra que há alguma coisa
errada com você”.
O
degelo das calotas polares (que vem acontecendo numa velocidade
superior à prevista pelos estudiosos) e a expansão volumétrica dos
oceanos já determinaram a elevação do nível do mar entre 10 cm e 20 cm
no século passado. Parece pouco, mas não é. Em um planeta mais quente
esses processos serão intensificados e deverão modificar a geografia
costeira dos continentes com impactos diretos sobre aproximadamente 600
milhões de pessoas que vivem em áreas mais vulneráveis.
Haverá
também mudanças importantes nos ciclos de degelo em cordilheiras
nevadas como os Andes e os Himalaias. Isso significa a interrupção do
abastecimento regular de água em períodos de estiagem em países como
China, índia e Peru, com graves impactos na produção de alimentos.
Certas culturas agrícolas mais sensíveis já estão sendo realocadas pois
não se adaptam facilmente à mudança do clima. Isso tem provocados
sucessivas quebras de safra e riscos reais para a segurança alimentar em
várias partes do mundo.
A
acidificação dos oceanos – causada pelo acúmulo de CO2 – e a elevação
da temperatura da água já estão determinando perdas importantes nos
ecossistemas marinhos. A principal delas é a morte dos corais, base da
cadeia alimentar de inúmeras espécies. Sem redes de corais resilientes e
saudáveis, os impactos econômicos e sociais sobre quem pesca, quem
processa o pescado e quem se alimenta de peixes e frutos do mar é
incalculável.
São
muitos os estudos revelando os impactos das mudanças climáticas sobre
espécies animais e vegetais. Nos diferentes reinos da natureza, nem
todos os seres vivos se adaptam a mudanças de temperatura. Considerando
o nível de interdependência entre as espécies, cada perda significa um
novo risco sistêmico, enfraquecendo a “teia da vida”.
A
mudança do ciclo da chuva é particularmente dramática em países como o
Brasil, que depende de “São Pedro” para manter uma agricultura forte e
pujante e uma matriz energética fortemente baseada em hidroeletricidade.
Para sustentar o nível dos rios e das represas em padrões adequados, é
preciso chover no lugar certo, e de preferência, nos períodos certos.
O
agravamento dos chamados eventos extremos – aumento do poder de
destruição de furacões, ciclones, tornados, tufões, secas, inundações
etc – tornou obrigatória a definição de novos protocolos de segurança,
alertas meteorológicos, macrodrenagem urbana, contenção de encostas,
remoção das áreas de risco e etc.
São
muitas as mudanças necessárias e urgentes na direção da mitigação
(redução das emissões de gases-estufa) e adaptação (ações que reduzam os
impactos inevitáveis causados pelas mudanças climáticas). O incrível –
ou melhor, o absurdo – é que a ampla maioria dos países endossa os
alertas da comunidade científica, financia as pesquisas de ponta
relacionadas às mudanças climáticas, assina acordos internacionais
importantes como o do Clima (1992) e o Protocolo de Kyoto (1997), envia
representantes para as Conferências das Partes organizadas pela ONU para
debater o assunto, mas, apesar de tudo isso, não consegue praticar o
que fala.
É
enorme a distância que separa as “boas intenções” das medidas concretas
e efetivas que reduzam os estragos das mudanças climáticas. São muitos
os chefes de estado que posam com o cenho franzido na foto, declaram-se
publicamente preocupados e comprometidos, mas que nada ou pouco fazem. A
atual geração de líderes políticos entra para a história como os
avalistas do indigesto legado de 400ppm de CO2 na atmosfera.
Esse
descolamento entre o discurso engajado e as políticas públicas se
materializou fortemente no ano passado durante a Rio+20 (o maior
encontro internacional da História em número de países), quando a
proposta de se reduzir ou eliminar os subsídios da ordem de 1 trilhão de
dólares destinados anualmente à exploração de petróleo foi solenemente
ignorada na Cúpula. O Brasil, por exemplo, que realiza esforços e
manobras contábeis sem precedentes para financiar a exploração do
petróleo na camada pré-sal, foi contra.
Trata-se
do mesmo governo que ignorou o prazo estipulado pela Política Nacional
de Mudança do Clima (abril do ano passado) para que fossem anunciadas as
metas para a redução das emissões de gases estufa em setores
específicos da nossa economia.
Fundador
do World Watch Institute, atual presidente do Earth Policy Institute, o
pesquisador Lester Brown, em um dos capítulos do livro “Plano B 4.0”,
resumiu da seguinte maneira o tamanho do desafio que os atuais chefes de
estado não parecem dispostos a enfrentar com a devida celeridade:
“Dada
a necessidade de simultaneamente estabilizar o clima e a população,
erradicar a pobreza e restaurar os sistemas naturais da Terra, a
civilização enfrenta, neste início de século 21, desafios sem
precedentes. Responder bem a pelo menos um deles já seria algo
importante. Mas o grave quadro exige responder efetivamente a cada um
deles ao mesmo tempo, tendo em vista a interdependência entre os
problemas”.
Tal
como hoje se dá na Alemanha, quando as novas gerações estudam o nazismo
nas escolas e depois, em casa, os netos perguntam para os avôs: “O que o
(a) senhor (a) fez para impedir isso?”, é bastante provável que em um
futuro próximo também os nossos netos nos perguntem: “Quando se
confirmou o risco do pior cenário climático, o que o (a) senhor (a) fez
para impedir isso?”
Qual será a sua resposta?
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