sábado, 27 de dezembro de 2025

TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO E O FILME EVANGELHO DA REVOLUÇÃO. DA MEMÓRIA. POR ROMERO VENÂNCIO (UFS).

Merece lembrança um momento raro (raríssimo!) da Igreja Católica na América Latina. Na esteira do crescimento da Teologia da Libertação dentro catolicismo latino americano (lembrando apenas que esse crescimento não foi igual em todos os países) entre 1980-1985, houve algumas reflexões sobre a possibilidade de uma “eclesiologia da libertadora”. A estrutura da Igreja Católica não poderia continuar tão piramidal, masculina e autoritária. Havia uma preocupação em pensar uma Igreja que nasce da base… Pensando na milenar estrutura da Igreja Católica, só o surgimento de questionamentos com tamanha radicalidade já era para se pensar com cuidado e ter alguma esperança.

1980. Foi publicado no Brasil o livro: “A Igreja dos pobres na América latina” (org. José J. Queiroz), editora Brasiliense. O livro era fruto de um evento com o mesmo nome realizado na PUC de São Paulo. O evento tinha uma prática ecumênica entre cristãos. Havia uma presença significativa de protestantes. Dois registros históricos: foi a primeira vez que veio ao Brasil o teólogo negro James Cone (um dos mentores da teologia negra dos EUA) e uma presença indígena marcante. Leigos, bispos, padres e pastores se encontraram durante uma semana e colocaram em questão papel da Igreja na América Latina. Um tema presente no evento era a participação dentro das instituições cristãs e uma perspectiva de desclericalização das igrejas cristãs.

1985. Sai em português uma das mais radicais obras dentro da teologia da libertação latino americana. Trata-se de: “A luta dos deuses: os ídolos da opressão e a busca do Deus libertador” (Paulinas). A teses era: a mudança na ideia de Deus levaria a uma mudança na práxis eclesial. Era preciso desconstruir uma ideia do “cristo rei” e todos os vínculos ideológicos do Deus cristão com os poderes temporais. O deus dos poderes deste mundo nunca passou de um ídolo. Figuras como Jorge Pixley, Jon Sobrino, Franz Hinkelammert, Frei Betto dentre outros, escreveram textos impactantes numa teologia que procurava libertar a própria teologia latino americana.

No caso do Catolicismo, a eleição do Papa João Paulo II representou uma implacável perseguição a todas as formas de Teologia da Libertação. Um marco do inicio dessa perseguição, foi a visita do Papa à Nicarágua em 1983. Visita desastrosa em todos os sentidos. Vemos um Papa carrancudo, mandando o povo de calar e pouco afetuoso. O semblante de João Paulo II assustou e foi revelador. A partir de 1985, a perseguição começa a ser sistemática e implacável. Teólogos/Teologas são perseguidos, documentos censurados, coleções de livros barradas ou proibidas e volta-se a uma cultura da “grande disciplina”. A Teologia da Libertação foi atacada em todos os sentidos: da teoria à pastoral; dos seminários fechados à nomeação de bispos conservadores.

Uma coisa é certa: toda essa truculência não apagou a memória. Os livros existiram e ficaram para nos fazer refletir em dias atuais. O mundo é outro e as Igrejas mudaram mais ainda… Porém ainda queima um pensamento teológica e eclesial que marcou um momento da cultura religiosa da América latina. E pensou um ouro futuro.


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