segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

É TARDE, EU JÁ VOU INDO. É PRECISO IR EMBORA...








Ao contrário do que se fala, Luiz Vieira não tinha ligação afetiva alguma com Caruaru porque saiu de lá aos 4 anos e não aos 10. Foi criado em Alcântara, município de São Gonçalo, depois se mudou para o RJ. Sua produção musical mais marcante se enquadra como toada sertaneja, não necessariamente nordestina, cantigas, prelúdios, assim como guarânias (de origem paraguaia). Ele até ridicularizava do rojão, que no seu entender era embolada. Como grande pesquisador que sempre foi, descobriu-se poeta e compositor não urbano dos maiores que este país viu nascer. Mas é claro que a música do Nordeste o contagiou (fez baiões e xotes) até porque conviveu com Luiz Gonzaga. O seu imenso repertório é brejeiro, melodioso e poético e trata de um Brasil que já havia morrido muito antes dele partir deste mundo em 16/01/2020. 

‘Menino de Braçanã’ é uma de suas canções mais lindas e é dele somente porque Arnaldo Passos era um cara conhecido por se infiltrar em emissoras de rádio e gravadoras até conseguir que seu protegido conseguisse gravar ou divulgar alguma obra. As parcerias dele nasceram dessa habilidade como intermediário que ele tinha e não se restringem somente a Luiz Vieira. 

Até hoje muita gente pergunta o que seria Braçanã. Pois é, é uma das serras não muito altas que podem vistas no município fluminense de Itaboraí, que em linguagem tupi significa ‘rio da pedra bonita’.  

Bethânia incluiu Menino de Braçanã num DVD que tem, mais ou menos, cinco anos de gravado e essa gravação é para mim o registro sonoro mais impressionante desta música. 

Luiz Vieira viveu 91 anos. Quantos de nós chegarão lá? Mas queríamos mais. Das suas guarânias, a da lua nova, é a que mais me impressiona. Das suas cantigas, a que fez para Ribeirão Preto, cidade com a qual tinha profunda ligação, é poesia pura. Seu repertório guarda coisa bem caipira e bem humorada como ‘A Troco de Quê’, gravada por Inezita Barroso, de quem era muito amigo, em 1960. ‘Chá pra Lombriga’, de 1986, é outra que demonstra o lado humano bem gozador de Vieira. 

Das suas parcerias reais (e não aquelas que deu) destaca-se aquela feita com João do Vale da qual surgiu, como exemplo, ‘Na Asa do Vento’, gravada por Fagner, Caetano Veloso e muitos outros. 

E para provar que Vieira é permanente no cenário musical brasileiro, ao contrário de outros que aparecem por modismo e somem, o jovem talento Ayrton Montarroyos gravou recentemente ‘Guarânia da Saudade’. 

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É tarde eu já vou indo, preciso ir embora… e lá se vai Luiz Vieira

E tantos artistas gravaram Luiz Vieira, tantas vozes compondo o coro deste legado. Caetano Veloso, Taiguara, Pery Ribeiro, Nara Leão, Agnaldo Rayol, Elba Ramalho, Luiz Gonzaga, Rita Lee, Maria Betânia, e tantos outros.








   
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Luiz Vieira - Estúdio F

Luiz Gonzaga o batizou de Príncipe do Baião. Pernambucano radicado no Rio e dono de mais de 500 composições, foi parceiro de João do Vale.


Abilio Neto



Pernambucano, 70 anos, é memorialista e pesquisador musical, além de  pequeno colecionador de discos. Seu arquivo contém algumas obras que se tornaram preciosas na música brasileira diante do mau gosto popular nessas duas primeiras décadas do século XXI. São frevos, sambas, maracatus, forrós, xotes, polcas, toadas, marchinhas, merengues e choros. Tem mais de 400 artigos escritos sobre música que foram publicados em sites da internet, ‘terreno’ que se notabiliza pela impermanência. Seus artigos provam que a História também se conta através da música.

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