quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Invadida e desfigurada por Temer e Bolsonaro, todo mundo quer a EBC. Além da economia, é também a comunicação estúpidos. (3)

 FNDC e entidades entregam propostas à equipe de transição

Escrito por: Redação do FNDC

Carta por uma comunicação democrática reúne propostas para o setor; documento foi entregue a integrantes do grupo temático que trata de Comunicações no novo governo

O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e diversas outras entidades e organizações do setor entregaram a carta “Comunicação democrática é vital para democracia - uma agenda para o novo governo Lula” aos representantes do GT Comunicações do Governo de Transição, na última sexta-feira (25), no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília.
 
O documento apresenta 8 medidas que o próximo governo do Brasil deve atender para garantir o direito à comunicação de forma igualitária aos brasileiros e brasileiras do campo e da cidade. 
 
“O FNDC e todas as organizações que assinam a Carta esperam que o governo Lula desenvolva no nosso país, políticas capazes de assegurar a expressão midiática dos vários sujeitos do campo e da cidade, como afirmamos na agenda proposta no documento que apresentamos ao GT Comunicações do Governo de Transição”, pontua o jornalista Barack Fernandes, integrande da Coordenação Executiva do FNDC. 
 
Leia na íntegra as 8 medidas apresentadas:
 
- Garantia da diversidade e pluralidade comunicativas, com a adoção de políticas capazes de assegurar a expressão midiática de uma multiplicidade de sujeitos sociais e correntes de pensamento, evitando o controle que poucos grupos exercem hoje sobre o debate público, e a regulamentação dos dispositivos da Constituição de 1988, como a complementaridade entre os sistemas público, privado e estatal, a vedação ao monopólio, o fomento à produção regional e independente, entre outros. Tal esforço passa por medidas de fomento à produção de conteúdos por segmentos historicamente marginalizados no país, como mulheres, negros, trabalhadores, pessoas com deficiência e população LGBTQIA+.
 
- Universalização do acesso à internet, via o desenvolvimento de políticas públicas para garantir o acesso universal, significativo e de qualidade para todos, com preços acessíveis e sem limitação de franquia de dados móveis. A se dar tanto pela ação direta do Estado no provimento de conexão a partir de redes públicas, como pela definição da modicidade tarifária, de metas de conectividade para as empresas privadas, de políticas de fomento aos pequenos e médios provedores e iniciativas de acesso à internet comunitária.
 
- Regulação das plataformas digitais, a exemplo do que começa a ser feito em todo o mundo, com destaque para a União Europeia, com o estabelecimento de regras que impeçam os gigantes tecnológicos de estabelecer oligopólios, que garantam transparência e devido processo na moderação de conteúdos, que combatam abusos no discurso online (como campanhas de desinformação, discurso de ódio, violência política a atentados ao Estado Democrático de Direito), e que estimulem o surgimento de alternativas produzidas nacionalmente e baseadas na perspectiva do bem comum e das necessidades locais. Tal agenda deve considerar o estabelecimento de uma estrutura regulatória moderna e convergente, a exemplo do modelo adotado em democracias consolidadas.
 
- Fortalecimento das mídias alternativas, independentes, comunitárias, populares e periféricas, de todo um grupo de veículos e iniciativas que nasceram fora dos grandes oligopólios privados da comunicação no país e que requerem políticas públicas de incentivo para sua consolidação e ampliação.
 
- Enfrentamento à violência contra jornalistas e comunicadores, por meio da adoção de um discurso público de valorização e reconhecimento ao trabalho da imprensa, do fortalecimento do Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas, e do enfrentamento à impunidade nos crimes contra jornalistas. A valorização do trabalho jornalístico também requer a adoção de mecanismos contra a precarização e o assédio, principalmente contra as mulheres jornalistas e comunicadoras.
 
- Recuperação da autonomia e do caráter público e fortalecimento da EBC e do sistema de emissoras e agências públicas ligadas a ela. Por sua estrutura e capilaridade, a EBC pode converter-se em espaço para difusão dos conteúdos produzidos pela multiplicidade de sujeitos comunicativos que queremos estimular, com autonomia e sob governança da sociedade brasileira, através da reinstalação do Conselho Curador.
 
- Estímulo à apropriação tecnológica e educação midiática, com políticas de formação para uso de novas mídias, através do letramento midiático crítico, e autogestão de infraestruturas de telecomunicações comunitárias, que permitam a produção de conteúdos em linguagens escrita e audiovisual e preparem os cidadãos para uma relação crítica e autônoma com conteúdos midiáticos.
 
- Desenvolvimento, em interlocução com a pasta de ciência e tecnologia, de um programa de soberania digital para o Brasil, com medidas como o incentivo e criação de datacenters que envolvam governos estaduais, municípios, universidades públicas e organizações não-governamentais, que permitam manter dados em nosso território e aplicar soluções de Inteligência Artificial que estimulem e beneficiem a inteligência coletiva local e regional. Tal programa deve ainda prospectar tecnologias e experimentos que reforcem a tecnodiversidade e avanços em áreas estratégicas ao desenvolvimento, além de capacitar recursos humanos e sua permanência no setor público para criação de soluções que nos afastem do panorama de dependência das grandes corporações.
 
Leia a Carta na íntegra AQUI.
 
Por Leandro Fortes -  Atualizado em 28 de novembro de 2022 às 22:42
Invadida e desfigurada em um dos primeiros atos do governo golpista de Michel Temer, a Empresa Brasil de Comunicação, a EBC, entrou em uma espiral de decadência a partir de 2016 e parecia condenada a desaparecer, no governo de Jair Bolsonaro, dentro da sanha privatista de Paulo Guedes.

Essa pretensão, contudo, não saiu do papel porque a estrutura administrativa e, principalmente, os altos salários da diretoria tornaram-se um ambiente perfeito para outra sanha, a dos militares loucos por mamatas que se aboletaram na administração federal depois da chegada do capitão à presidência da República, em 1º de janeiro de 2019.

Em suma, Temer ocupou a EBC com cupinchas e puxa-sacos, depois de trair Dilma Rousseff e retirar da presidência da estatal o jornalista Ricardo Melo, que tinha mandato estabelecido por lei. Ou seja, um golpe dentro do golpe. Fez isso para desmobilizar a comunicação pública e sucatear um sistema que, nos governos do PT, ameaçava a hegemonia dos grandes grupos privados de comunicação, uma turma a quem Temer, desde sempre, presta lucrativa vassalagem.

Bolsonaro, influenciado por Guedes, pensou em privatizá-la, mas foi avisado de que não havia ninguém interessado, por ora, em comprar os ativos de uma estatal de comunicação. Decidiu, então, fazer da EBC uma subsidiária do Palácio do Planalto com ares de bordel comandado por militares. O que havia restado de comunicação pública virou uma máquina de propaganda governamental e culto à personalidade, por um lado.

Por outro, a empresa foi transformada num gigantesco cabide de empregos para milicos da reserva e uma aberração administrativa que gastou, não se sabe ainda exatamente, alguns milhões comprando programação de veículos privados, como as novelas bíblicas da Rede Record, do bispo Edir Macedo.

Às vésperas do terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, a EBC virou alvo de disputa dentro do Grupo de Trabalho de Comunicação Social do Gabinete de Transição. Um grupo quer a EBC ligada à futura estrutura da Secom, diretamente vinculada ao Palácio do Planalto, de forma a garantir aquilo que o PT não teve quando, a partir de 2005, a direita e a mídia começaram a investir contra o governo, com a farsa do mensalão: um canhão de comunicação pública para falar diretamente com a população, sem a mediação da mídia golpista.

Em suma, quer ocupar um aparelho ideológico importantíssimo para a guerra que se avizinha contra um esquema transnacional de produção de fake news, desinformação, violência política e doutrina de ódio bancado por empresários ligados à extrema-direita. Para tal, é preciso que a EBC volte à estrutura de gestão democrática criada nos governos do PT, mas sem a ilusão de que apenas com boas intenções e programação idílica infanto-juvenil irá revolucionar a comunicação pública no Brasil.

Nessa formatação, a Secom, inclusive, poderia absorver, ela mesma, parte das atribuições da EBC referentes à produção especificamente estatal da empresa. Antes, nos governos do PT, a NBr, estrutura montada dentro da Divisão de Serviços da EBC, fazia a propaganda governamental, inclusive, com remuneração direta para tal. A comunicação pública audiovisual era feita pela TV Brasil e a Agência Brasil. Bolsonaro transformou tudo numa coisa só e fez da EBC um templo grotesco de autoidolatria.

Também pode ir para a Secom – esta, de novo vinculada diretamente à Presidência da República – parte da Agência Brasil comprometida com o noticiário digital exclusivamente dedicado às ações de governo. Restaria à EBC, portanto, só fazer comunicação pública de verdade. Mas há muito mais em discussão.

Primeiro, porque há gente no PT interessada em manter a Secom onde está, no Ministério das Comunicações, onde foi colocada de maneira rebaixada por Bolsonaro. Para se ter uma ideia, as instalações físicas da secretaria foram transferidas do segundo andar para o subsolo do Palácio do Planalto e o comando das atividades foram entregues a um oficial da Polícia Militar do Distrito Federal, o coronel André Costa. Os cargos de porta-voz e a secretaria de imprensa também foram parar nas mãos de oficiais da PM.

Claro, nem de longe os petistas querem manter esse rebaixamento, pelo contrário, as discussões giram em torno de uma Secom novamente profissionalizada e, mesmo nas Comunicações, com vínculos diretos com o Palácio do Planalto, inclusive novamente colocada no segundo andar do prédio. A intenção de mantê-la no ministério nada tem a ver com estratégia de comunicação, mas com política pura e simples. A direção nacional do PT teme que, perdendo a Secom, irá perder, também, o comando da pasta para algum partido aliado, como parte da divisão de poder entre aqueles que ajudaram a eleger Lula, no segundo turno das eleições.

Há um grupo, contudo, que tem uma proposta suavemente revolucionária: levar a EBC para o revivido Ministério da Cultura, de forma a fazer da empresa menos um canhão de jornalismo e mais uma super produtora de conteúdo audiovisual para garantir financiamento e visibilidade às produções regionais, historicamente marginalizadas pela ditadura do capital. Além, claro, de retomar o processo de democratização da cultura, abruptamente interrompido pela estupidez bolsonarista.

A proposta, cheia de boas intenções, tem simpatia de muita gente relevante, dentro e fora da EBC, mas esbarra na oposição dos defensores do fortalecimento da estatal como espaço ideológico de luta política. Estes temem que a empresa seja capturada por uma estratégia de protagonismo de programação cultural sectária, voltada para um jornalismo lateral, distanciada da realidade da luta política e do zeitgeist imposto pelo neofascismo bolsonarista.

Em resumo, têm medo de que, na Cultura, a EBC se torne um acampamento namastê repleto de gratiluz e se fragilize institucionalmente, tornando-se uma ferramenta inútil para defender o governo em momentos de grave crise política, como o processo de impeachment e cassação de Dilma Rousseff, um golpe francamente apoiado pela mídia comercial.

No próximo dia 30 de novembro, um longo relatório preliminar, com todas as possibilidades de futuro da EBC, será entregue aos caciques da transição para que esse debate comece a ganhar corpo dentro das circunstâncias do novo governo. Depois de 11 de dezembro, quando um relatório final for consolidado, caberá a Lula decidir, no fim das contas, os rumos a Secom e a EBC deverão tomar nos próximos quatro anos.

https://www.diariodocentrodomundo.com.br/invadida-e-desfigurada-por-temer-e-bolsonaro-todo-mundo-quer-a-ebc-por-leandro-fortes/

Campanha Calar Jamais! 

 
Para fortalecer a construção da Carta, o FNDC apresentou o segundo relatório da Campanha Calar Jamais!, que registou 110 denúncias de violações à liberdade de expressão ocorridas no Brasil entre junho de 2019 e fevereiro de 2022, organizadas em 8 categorias: Violações contra jornalistas, comunicadores sociais, veículos e meios de comunicação; Censura a manifestações artísticas; Cerceamento a servidores públicos; Repressão a protestos, manifestações sociais e organizações políticas; Repressão e censura a instituições de ensino; Desmonte da Comunicação Pública; Discriminação contra Grupos oprimidos; e Crimes contra a Saúde Pública.
 
“Todas essas violações à liberdade de expressão apresentadas no nosso último relatório foram institucionalizadas pelo atual presidente da República, Jair Bolsonaro, que ao longo dos seus 4 anos de gestão, vem atacando profissionais, inclundo jornalistaa, comunicadores, artistas, professores, veículos de comunicação, grupos culturais, instituições educacionais, dentre outras pessoas e organizações que fazem comunicação e luta por liberdade de expressão em diversas áreas. Para que essas violências não continuem no Brasil reafirmamos a importância do que apresentamos na Carta entregue ao GT Comunicações do Governo de Transição”, lembra a coordenadora Geral do FNDC, Beth Costa. 

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