Por Romero Venâncio
Chama bastante atenção quando colocamos o termo “Teologia da Libertação” no google e vemos o monte de impropérios, delírios, desinformação e afirmações de gente desqualificada sobre o assunto. Já passa de cinco décadas que a Teologia da Libertação incomoda dentro e fora do catolicismo romano. Dentro, porque houve aos poucos uma virada conservadora na Igreja Católica desde a gestão do Papa João Paulo II e seguiu na de Bento XVI. Em 1986, o então cardeal Joseph Ratzinger assinava um documento oficial da Igreja em que atacava diretamente a Teologia da Libertação. Trata-se de “Instrução sobre a liberdade cristã e a liberdade”. Documento que virou uma espécie de “apito de cachorro” quando a direita católica volta sua carga contra a Teologia da Libertação e seus teólogos e teólogas. As críticas mais comuns à essa teologia, são: o uso do marxismo (o velho fantasma do comunista rondando), a falta de espiritualidade (a coisa mais absurda!), preocupações sociais mais do que “espirituais” (termo nebuloso e impreciso propositalmente) e a sua critica anticapitalista (os opositores da Teologia da Libertação sempre são simpáticos à economia de mercado e sua “liberdade”). Cada crítica destas, foi refutada ponto-a-ponto pelo teólogo uruguaio Juan Luis Segundo em seu fabuloso livro: “Libertação da teologia” ainda nos anos 80 e no calor do debate com o Cardeal Ratzinger. Uma pena que tenha passado despercebido por uma geração inteira e jamais tenha sido lido por qualquer boboca dessa direita católica.
O impacto fora da Igreja Católica da Teologia da Libertação é impressionante. Foi base para quase todas as lutas populares na América Latina desde os anos 60 e chegando até os anos 80. Influenciou uma série de intelectuais cristãos e ateus (basta vermos alguns livros do sociólogo Michael Lowy). Marcou os projetos educativos no continente, pautou políticas pública governamentais em favor dos pobres, foi fundamental na defesa dos povos indígenas, chegou ao movimento operário latino e foi fundamental na luta de camponeses latino americanos. Incontornável a presença de uma tão produtiva teologia. E rara em termos de cristianismo. Nunca no continente latino uma teologia foi tão moderna e tão engajada na vida popular. “Limpou” o nome do catolicismo colonizador e conquistador. Historicamente, o catolicismo romano sempre foi aliado de primeira hora das classes dominantes em todas as Américas. A Teologia da Libertação muda este quadro (ou mudou por um tempo. O catolicismo sempre sente saudades da “casa grande”).
Conheci as obras e o projeto histórico da Teologia da Libertação quando fui estudante de teologia no Recife e pertencente do SERENE II (Seminário Regional Nordeste). Estudava no saudoso ITER (Instituto de Teologia do Recife) na segunda metade dos anos 80. Absolutamente fundamental em minha formação teológico-política. Ter sido aluno de pessoas como José Comblin, Ivone Gebara, Claudio Sartori, Sebastião Armando Gameleira, Mario Medeiros, Ivan Teófilo, Pr. Isaias, Reverendo Paulo Ayres, Ir. Janis Jordan, Pe. Gervásio Queiroga (a briga com o código de direito canônico foi histórica) e tantos outros que passaram por uma instituição rara em sua seriedade teológica, engajamento pastoral e projeto político condizente com um cristianismo radical.
Voltei nos últimos anos a organizar uma memória da Teologia da Libertação latino-americana por minha conta e risco... E por saber da importância estratégica ainda hoje deste fazer teológico. Mas voltei também em forma de defesa contra os ataques covardes e desqualificados de uma extrema direita católica beligerante e amparada por ideias fascistas. A extrema direita católica e seus filminhos vagabundos sobre a Teologia da Libertação não têm um pingo de moral ou qualquer qualificação teológica para tratar de qualquer aspecto desta teologia e de seu papel na formação de uma série de pessoa na América latina e para além do continente.
Durante o período da “Quaresma” e sempre as quintas-feiras a partir das 20h. no Instagram romerojunior4503, volto a vários temas dentro da Teologia de Libertação durante uma hora de exposição. Aberto a quem interessar possa.
Hoje. 23/02, a partir das 20h. no curso sobre a “Teologia da Libertação” no Instagram romerojunior4503, apresentaremos a concepção de espiritualidade libertadora do padre chileno, missionário e educador popular de curioso nome: Segundo Galilea. Foi uma das mais importantes figuras no "movimento contemplativo-engajado" dos anos 60 e 70 na América Latina. Desenvolveu nas periferias por onde passou uma espécie de "espiritualidade da libertação". Acreditava que os pobres são os verdadeiros sujeitos da evangelização, pois esses sofrem, a todo momento, a experiência dramática da dor e da frustração como parte da realidade humana, e revelariam o rosto humano de um Jesus que sofre, e desse modo, mostrariam que a libertação, na situação atual, passaria necessariamente pela cruz. Os pobres seriam o "sacramento histórico" que revelaria a realidade evangélica da dor de Jesus de Nazaré e seriam o caminho para a experiência de comunhão. Com essa visão, Galilea, se afastou da concepção do cristianismo como "religião de observância", que apresenta um Cristo a-histórico, individualista, reacionário e triunfalista, e opta por um cristianismo da radicalidade do Evangelho, da fé encarnada, do seguimento de Jesus o Cristo crucificado. Galilea faleceu em 2010 sem renunciar a Teologia Latino-Americana da Libertação. Seu livro fundamental: "Raízes da espiritualidade latino-americana"
Um dos frutos mais extraordinários da Teologia da Libertação no Nordeste brasileiro: a "Teologia da enxada" - unir trabalho e fazer teológico... Entrar na vida do povo como povo... Uma ideia de "intelectual orgânico" em sua forma popular. Com apoio e orientação de José Comblin, teólogo raro e que faz imensa falta na atual quadra histórica latino americana. Volto a obra de Comblin, a Teologia da enxada e as relações Gramsci\Teologia da Libertação por estes dias...
Para adquirir - https://www.editorarecriar.com/catalogo/50-anos-de-teologias-da-libertacao-emerson-sbardelotti-edward-guimaraes-marcelo-barros-orgs
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