terça-feira, 2 de janeiro de 2024

E quando o fazedor de cultura não dispõe de conhecimentos básicos de informática e nem computador para poder fazer inscrição de seu projeto no mapa cultural?


 Quem me conhece mais de perto, mesmo que seja a distância por meio das redes virtuais,  já percebeu que sou um ardoroso defensor da tecnologia no ciclo completo para a elaboração de um projeto cultural, ciclo completo que começa na formação continuada em politicas, gestão, produção,  linguagens e ação cultural até a prestação de contas, passando obviamente pela inscrição do projeto nas plataformas conhecidas como mapas culturais.

Por outro lado,  quem me conhece sabe que também considero importante não considerar o uso da tecnologia como a única maneira de participação dos fazedores de cultura para a inscrição de projetos, em razão das  dificuldades e limites inerentes ao universo da cultura popular urbana com que sempre trabalhei, assim como uma ou outra experiência de trabalho com o universo da cultura popular rural com o qual tive/tenho algum contato.

A Lei Paulo Gustavo compreende e sugere alternativas para lidar com esta situação.  O problema é que por razões estruturais e contingentes houve cumprimento ao que está disposto nos dois artigos em menor proporção ao esperado, e em muitos entes federados,  bem abaixo. Vale pesquisa para saber o quanto foi realizado neste sentido.

Art. 17. Na implementação das ações previstas nesta Lei Complementar, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão assegurar mecanismos de estímulo à participação e ao protagonismo de mulheres, de negros, de indígenas, de povos tradicionais, inclusive de terreiro e quilombolas, de populações nômades, de pessoas do segmento LGBTQIA+, de pessoas com deficiência e de outras minorias, por meio de cotas, critérios diferenciados de pontuação, editais específicos ou qualquer outro meio de ação afirmativa que garanta a participação e o protagonismo desses grupos, observadas a realidade local, a organização social do grupo, quando aplicável, e a legislação relativa ao tema.

Art. 8º - Do montante previsto no art. 3º desta Lei Complementar, R$ 1.065.000.000,00 (um bilhão, sessenta e cinco milhões de reais) deverão ser destinados exclusivamente a ações na modalidade de recursos não reembolsáveis, da seguinte forma:

§ 5º Os instrumentos de seleção referidos no § 1º deste artigo devem, preferencialmente, ser disponibilizados em formatos acessíveis, tais como audiovisual e audiodescrição, bem como em formatos acessíveis para pessoas com deficiência, com a utilização, por exemplo, do Sistema Braille, do Sistema de Informações Digitais Acessíveis (Daisy) e da Língua Brasileira de Sinais (Libras).

§ 6º O procedimento de entrega das propostas em atendimento aos instrumentos referidos no § 1º deste artigo deverá observar logística facilitada, por meio da internet, em sítio oficial, ou presencialmente, de forma descentralizada, por meio de equipamentos públicos como locais de referência para esclarecimentos de dúvidas e protocolo das propostas.

§ 7º No caso de grupos vulneráveis, de pessoas que desenvolvem atividades técnicas e para o setor de culturas populares e tradicionais, o ente da Federação deverá realizar busca ativa de beneficiários, e as propostas oriundas desses grupos poderão ser apresentadas por meio oral, registradas em meio audiovisual e reduzidas a termo pelo órgão responsável pelo instrumento de seleção.

E voltando a motivação da pergunta que dá titulo a este artigo, neste primeiro dia útil de 2024, recebo a ligação de um fazedor de cultura popular residente em um pequeno município sergipano pedindo uma orientação sobre a inscrição no mapa cultural. No decorrer da conversa, ele mesmos reconheceu,  o que  solicitava a mim deveria ser realizado a um técnico  cultural disponibilizado pela prefeitura, mas isso não existe... 

Sobre as razões para isso acontecer,  conversei acerca das  razões estruturais que explicam o desinteresse das oligarquias municipais no investimento em ações culturais de base comunitária e disse  que repassaria o link para ele tentar fazer a inscrição, considerando  o preenchimento dos mapas culturais ser intuitivo e contar com vídeos tutoriais.

Propus isso a ele por considera-lo apto a começar, considerando  dispor de contas em redes digitais e ao menos ele poderia criar uma para entrar na plataforma dos dois mapas,  o estadual e o federal. Disse a ele, em caso de dificuldade poderia vir em minha casa acompanhado de um computador para eu puder fazer orientação presencial. E então ele me disse não dispor de computador, já teve.

E agora? Pensei. No decorrer da conclusão da conversa ele disse que poderá utilizar o computador de amigos para fazer a inscrição. E me coloquei a disposição para a orientação presencial, como já tinha realizado, mas com o celular não saberia como fazer, até porque não costumo utilizar o celular para o fim proposto..

E lembrando de outras situações que aconteceu comigo neste ano que findou no  último domingo, é que trago essa questão para debate. Situações até  mais delicadas, como de uma fazedora de cultura que conheci no inicio do ano passado, mas que além de não possuir computador, nem conta em redes virtuais dispunha e muito menos e-mail, além de dificuldades com o manejo do celular.

Assim, de que maneira os entes federados (união, estados e municípios) poderão  colaborar para incluir de fato, não apenas de direito, milhares de pequenos fazedores de cultura que se encontram em dificuldades para acessar os recursos financeiros destinados a estes pelas leis de fomento?

Deixe suas sugestões por aqui nos comentários, ou em outras redes virtuais onde esse post for publicado. As melhores subirão para completar a composição  desse artigo...

Zezito de Oliveira

------------------------------------------------------------

Como utilizar os 5% dos recursos para operacionalização na Lei Paulo Gustavo?

Publicado em 11/09/2023 12h27 em https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/lei-paulo-gustavo/central-de-conteudo/perguntas-frequentes-sobre-a-lei-paulo-gustavo/execucao-da-lei-paulo-gustavo/como-utilizar-os-5-dos

Resposta

Os estados, o Distrito Federal e os municípios podem utilizar percentual de até 5% do total dos recursos recebidos para operacionalização das ações da LPG, observando o teto de R$6 milhões de reais. Esse recurso deve ser utilizado exclusivamente com o objetivo de garantir mais qualificação, eficiência, eficácia e efetividade na execução dos recursos recebidos pelos entes, por meio da celebração de parcerias com universidades e entidades sem fins lucrativos ou da contratação de serviços.

https://www.youtube.com/watch?v=JeScd1TMKKc


--------------------------------

Vocês viram esse estudo? 

É de agosto de 2022, mas vale atentar para essas questões na análise dos resultados da LPG e na aplicação da LAB2.

O racismo estrutural e a exclusão no âmbito das políticas culturais

Já se suspeitava que diversas comunidades eram excluídas das políticas culturais. Com a criação de um instrumento para distribuição de assistência social (Lei Aldir Blanc), essas contradições e exclusões sociais se evidenciaram

 https://diplomatique.org.br/o-racismo-estrutural-e-a-exclusao-ambito-das-politicas-culturais/

Marcos Silva respondendo a matéria acima da revista Le Monde " caramba... e isso só reforça ainda mais a necessidade de uma organização coletiva mais efetiva inclusive com o aporte de uma assessoria jurídica." 

Cris Souza respondeu: "É exatamente disso que sempre falei amigo @Zezito De Oliveira ! Esse ano vou fundar um coletivo só de pequenos artistas, os invisíveis, para trabalhar esse tema que é tão sensível e urgente para os pequenos fazedores de cultura 🙏🏽🙏🏽🙏🏽"

Nenhum comentário: