A DUPLA IMPORTÂNCIA DO OSCAR PARA AINDA ESTOU AQUI. NOTA. Por Romero Venâncio (Universidade Federal de Sergipe)
Independente das polêmicas ou os limites políticos ou estéticos do filme "Ainda estou aqui", o Oscar de melhor filme estrangeiro/internacional veio em boa hora. As polêmicas ocorreram nas redes digitais e algumas foram sérias e nos ajudaram a pensar no real valor do filme. De Chavoso da USP a Jones Manoel; de Marcelo Ikeda a Wesley P. de Castro, o filme virou uma boa polêmica nas redes... Acompanhei todas essas e participei até certo ponto. Mas reconheço uma coisa: as polêmicas não apagaram em nada a importância do filme e nem os autores da polêmica queriam isto.
A vitória no Oscar só não foi completa porque Fernanda Torres não ganhou a estatueta de melhor atriz. Merecida, inclusive. A atriz é a peça chave do filme. Interpretação singular. Não ganhou. Uma pena. Mas o filme tornou-se o melhor filme estrangeiro/internacional neste 2025. E isto é importante. Na América Latina, a Argentina ja levou mais de um vez o prêmio, o Chile já ganhou também. Cuba não ganhou esse titulo pelas razões políticas de sempre. Por exemplo, em 1969 o genial "Memória do subdesenvolvimento" (Tomás Gutiérrez Alea) ganharia tranquilamente o titulo de melhor filme estrangeiro, mas nos EUA dos anos 60 jamais um filme cubano ganharia algo no Oscar.
Em tempo. "Ainda estou aqui" trouxe o primeiro Oscar para o cinema brasileiro. Ganhou reconhecidamente com a estatueta de melhor filme estrangeiro/internacional e este prêmio tem uma dupla importância:
Primeiro. No âmbito da história do cinema brasileiro. Foi um titulo que honra a brava e acidentada história do cinema brasileiro. Desde o cinema novo, não vibrávamos tanto com um filme numa concorrência fora do país. Importante lembrar "O Quatrilho" ou "Central do Brasil". Confesso: não vibrei tanto com eles. Por exemplo, esse "O Quatrilho" ganhar o titulo de melhor filme estrangeiro nos anos 90 no lugar de "A excêntrica família de Antonia" (filme holandês) seria uma profunda injustiça. Mesmo depois da chamada "Retomada" do cinema brasileiro na segunda metade dos anos 90, não produziu filmes com força dentro e fora do país para concorrer a altura com outros filmes "estrangeiros". Foi um momento importante do cinema brasileiro e preparou o caminho para se chegar ao "Ainda estou aqui". E vou mais além: cria ânimo para avançarmos na produção cinematográfica nativa. Temos diretores/diretoras muito bons. Temos atrizes/atores muito bons. Mas oscilamos demais em governos e ministérios da cultura. Cinema é arte cara e precisa de apoio estatal. Precisa de boas escolas. Precisa de pesquisa e produção. E ainda de grande importância, precisa de público. Uma luta histórica nossa.
Segundo. A importância política do Oscar. "Ainda estou aqui" é o triunfo de uma memória. Nunca podemos esquecer: tivemos um golpe civil/militar em 1964. Deste golpe, seguiu-se uma brutal ditadura com consequências graves para os rumos do Brasil. Prisões arbitrárias, exílios, tortura, corpos desaparecidos, sufocamento da democracia, políticas econômicas concentradoras de renda e grande empobrecimento do país. Resumo da história: tivemos governos militares desqualificados para o cargo. O filme de Walter Salles é uma vitória (simbólica) sobre esta turma das casernas. O filme é sobre um homem perseguido pela ditadura. Tem sua prisão fora da lei. É torturado e assassinado. Seu corpo é tornado desaparecido e sua mulher fica sem chão com filhos para criar. Uma família foi destruída por uma ditadura militar. Este fato é necessário que se diga sempre. Depois de 60 anos do golpe de 1964, um filme brasileiro sobre a ditadura e do ponto de vista dos torturados ganha um prêmio internacional e um reconhecimento mundial. Depois de uma tentativa de mais um golpe civil/militar em 2023 e um ex-presidente na liderança e ainda sem punição merecida. Temos que guardar este dia em que "Ainda estou aqui" honrou nossa memória democrática e deixar para a memória das futuras gerações. Memória para uso diário.
📌🎬 A atriz Fernanda Torres usou as redes sociais na madrugada desta segunda-feira (3) para deixar uma mensagem após a conquista de "Ainda estou aqui", na categoria Melhor Filme Internacional do Oscar®. "Nós vamos sorrir. Sorriam", escreveu a atriz, em frase que faz referência a uma cena do longa.
É DO BRASIL, MINHA GENTE! 🫶🏼🇧🇷 Era o que faltava para o nosso Carnaval ficar perfeito: “Ainda Estou Aqui” foi premiado como MELHOR FILME INTERNACIONAL do Oscar 2025, em Los Angeles. É tanto orgulho que não cabe no coração! A maior vitória do povo brasileiro é poder ser tão bem representado lá fora e isso nos enche de inspiração para continuar lutando pelos nossos objetivos! Em nome de toda a cidade de Aracaju, muito obrigada 🥰🤩
Publicado no instagram AQUI
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Dilma Roussef , presidenta do Banco dos BRICS no facebook, aqui
QUEM GANHOU O OSCAR?
Todos nós, brasileir@s! Pois "Ainda Estou Aqui" reafirma, com arte, que nossa cultura é pujante e de valor universal. E que a memória é arma indispensável na formação da identidade de um povo, contra o autoritarismo e a mediocridade individualista.
Esse prêmio é para todas as famílias que tiveram suas vidas atravessadas pela violência do Estado. Para quem luta por verdade, justiça e reparação.
É também a demonstração de que nosso cinema tem força singular - tantas vezes negada, inclusive no "In Memoriam" da Academia hollywoodiana, que "esqueceu" Cacá Diegues.
Esse Oscar - que, pelas regras, é recebido pelo diretor do filme vencedor mas fica no acervo da República - vai para Fernanda Torres, Selton, elenco e a equipe inteira dirigida por Walter Salles. Todo filme só se viabiliza com imenso trabalho coletivo, da faxineira e do motorista ao diretor.
O prêmio de Melhor Filme Internacional para "Ainda Estou Aqui" é vitória da democracia, para um país que até pouco tempo tinha um presidente que fazia o elogio da tortura - dos algozes de Eunice e Rubens Paiva! - e um (des)governo inimigo da cultura.
(Aliás, o apresentador Conan O'Brien fez brincadeira ridícula com nosso filme, nessa linha da estupidez direitista).
O Brasil resiste. O Brasil lembra. O Brasil não se cala. O Brasil cria, reinventa a vida. Que, apesar de tudo, presta. Ditadura nunca mais!
🇧🇷 E #SemAnistiaPraGolpista
Celebremos!
As duas imagens abaix0 publicadas por Chico Alencar
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