quinta-feira, 13 de março de 2025

Papa Francisco: uma voz que clama no deserto. Artigo de Gabriel Vilardi e + Canta Francisco (canção de Toinho), Romero Venâncio (UFS) e Luís Rogério (Angelicum-Roma).

 Toinho - Canta Francisco



O papa foi buscado nos confins do mundo, como gosta de brincar Bergoglio, e exatamente dali a sua perspectiva tem sido extremamente valiosa. E nesse sentido deve continuar seguindo “se a Igreja quer ir além de seus limites e servir a todos, então esse ministério deve estar ligado ao respeito pela alteridade e liberdade daqueles a quem ela se dirige”, retoma Tomás Halík. Se a Igreja ainda quiser ter alguma relevância no futuro, aponta o teólogo tcheco, “deve estar livre da pretensão de espremer todos em suas fileiras e exercer controle sobre eles, de ‘colonizá-los’”. 

O artigo é de Gabriel dos Anjos Vilardi, jesuíta, bacharel em Direito pela PUC-SP e bacharel em Filosofia pela FAJE. É mestrando no PPG em Direito da Unisinos e integra a equipe do Instituto Humanitas Unisinos – IHU. 

https://www.ihu.unisinos.br/649405-papa-francisco-uma-voz-que-clama-no-deserto-artigo-de-gabriel-vilardi

Chegamos aos doze anos do Pontificado de Francisco: resta-nos dizer obrigado

Tenho guardado em minha memória as palavras de uma jornalista brasileira, ditas em sua cobertura naquele dia 13 de março de 2013: “O comando da Igreja passa para um jesuíta pela primeira vez na História. Um jesuíta que foi buscar na tradição franciscana da Igreja a base de seu pontificado, escolhendo o nome de Francisco. Não se sabe se por causa de Francisco Xavier ou Francisco de Assis. Mas essa escolha pode significar um tempo de reformas na Igreja”.

Assim foi dito, assim se fez. E aqui estamos nós, dozes anos depois. 


Publicado por Luís Rogério

Estudante de Ciências Sociais na Pontifícia Universidade de São Tomás de Aquino (ANGELICUM), em Roma.

UMA NOTA HISTÓRICA SOBRE DESEJAR MORTE DE PAPA

Os anos 80 do século passado foram os mais difíceis para a teologia da libertação católica. Foi uma década de consolidação de um pensamento teológico original e uma práxis pastoral efetiva e que incomodava as classes dominantes do continente latino americano. Não foi igual em todos países latinos. Foi desigual e combinada essa práxis teológica. Mas foi... Gerou frutos. E sofreu uma implacável perseguição a partir da Cúria Romana sob a gestão do Papa João Paulo II e do prefeito da congregação para doutrina da fé o Cardeal Ratzinger. O Cardeal alemão chegou a assinar um documento chamando a atenção e criticando a teologia da libertação. Com uma resposta efetiva e fundamentada teologicamente de Juan Luís Segundo (teólogo uruguaio). Nítido conflito aberto na Igreja. Punição de teólogos e teólogas; perseguição a congregações religiosas; isolamento de leigos teólogos e interferência direta no episcopado e na formações dos seminários. Tudo isto vi de perto estando na Arquidiocese do Recife e Olinda e estudando no ITER (Instituto de Teologia do Recife).

Em nenhum momento e em nenhum lugar do catolicismo de esquerda no Brasil vi alguém, afirmar ou deseja a morte do Papa Joao Paulo II ou do Cardeal Ratzinger. Vi muita discordância sobre a condução pastoral da Igreja sob a liderança desses dois prelados. Mas nada de desejar a morte deles. E jamais alguém rezar para que ocorra a morte deles. Jamais vi isto. Fui aluno e ligado aos trabalhos teológicos do Pe. José Comblin (um dos mais críticos do papado de João Paulo II). Jamais vi Comblin insinuar  desejo de morte do Papa de plantão e sua cúpula romana. 

O que vejo hoje e presencio nestas redes digitais da parte de católicos/católicas é bizarro e triste. Uma récua de católicos devocionalistas, tradicionalistas, de extrema direita desejando a morte do Papa Francisco na maior capa de pau. E ainda tentando separar o Papa de linhagem do apóstolo Pedro. Uma coisa abjeta e tola. Chegamos numa situação incontrolável e incontornável na Igreja Católica atual. E ainda mais, numa situação paradoxal: um dos melhores Papas da Igreja, querido até por ateus, sendo eliminado pelos católicos tradicionalistas. Vivemos um momento raro: o Papa Francisco é infinitamente melhor do que o conjunto da Igreja. Coisa rara na história da própria Igreja. O contrário, é o que geralmente ocorreu.

Dentro desta bolha devocionalista católica e sendo bem sincero, o que vejo é um bando de gente ressentida, despreparada teologicamente e distante de uma pastoral de conjunto concreta e que enfrenta o dia-a-dia de uma Igreja que vive uma crise de interação com o mundo moderno real. Atentemos!

Romero Venâncio (UFS)




Santa Sé na ONU pede dignidade para mulher e igualdade de oportunidades

A professora Gabriella Gambino, vice-secretária do Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, participou da 69ª Sessão Anual da Comissão das Nações Unidas sobre a Condição da Mulher, durante a qual recordou a necessidade de uma mudança cultural, que apoie as mulheres a conciliar a vida familiar com as responsabilidades profissionais.

AQUI

adicionado em 16 de Março de 2025 

O primeiro papa “filho” do Vaticano II, 12 anos depois. Artigo de Andrea Grillo.

Esses 12 anos de pontificado são um evento que pode ser muito interessante de estudar sob uma perspectiva requintadamente teológica.


O comentário é do teólogo italiano Andrea Grillo, professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, publicado em seu blog Come Se Non, 13-03-2025. A tradução é de Moisés Sbardelotto.


Eis o texto.

No dia do 12º aniversário da eleição de Jorge Mario Bergoglio a papa (13 de março de 2013), vale a pena fazer uma pequena reflexão sobre o valor “teológico” de seu modo de interpretar e de viver o papado nesses 12 anos. Faço isso com uma breve resenha de quatro temas que merecem uma consideração não apenas “curiosa”, mas também “pensante”.


1. O primeiro papa “filho” do Concílio

Este primeiro aspecto traz à tona o trabalho que as gerações, em sua sucessão, realizam de modo invisível. Depois de quatro papas “pais do Concílio” (João XXIII, Paulo VI, João Paulo I, João Paulo II e Bento XVI), o primeiro papa que não esteve no Concílio como bispo ou como perito implica uma relação “não autobiográfica” com o Vaticano II.


Há em Francisco o início de uma verdadeira “tradição conciliar”, que não havia sido possível para quem havia sido “autor” do Concílio. Com Francisco, a “intenção do autor” se identifica com o trabalho hermenêutico do “filho”. Se os “pais” estão sempre um pouco apreensivos e preocupados com seus filhos “doutrinais”, um filho é necessariamente mais livre e mais sereno. A história é capaz disso ao longo das gerações. Desse modo, introduz-se uma leitura de autoridade dos textos e dos eventos conciliares, proposta não mais pelos pais, mas pelos filhos. 


2. O primeiro papa que “não reside” no Palácio Apostólico

Um dos primeiros gestos simbólicos do Papa Francisco foi “não habitar” no local oficial de seu ofício. Iniciava-se assim uma redefinição – certamente fatigante e lenta – da própria figura do “Bispo de Roma”, começando com sua “saída” do Palácio Apostólico. 


Não podemos esquecer que, pouco antes de sua eleição, em seu último discurso na Congregação dos Cardeais, o cardeal Bergoglio evocou a curiosa imagem de um Senhor que “bate à porta”, não para entrar, mas sim para sair. Uma “Igreja em saída” não é apenas um slogan eficaz, mas também uma maneira de reinterpretar a função do papado, começando pela limpeza e poda das formas de “residência”. 


Sem focar tanto na “reforma institucional”, Francisco propôs nesses 12 anos sobretudo uma “reforma simbólica” que merece atenção. 


3. O primeiro papa “americano”

Com Francisco, pudemos ver em que medida a “cultura americana” é diferente da cultura europeia. O fato de a Igreja Católica ter passado a fazer a experiência, a partir do Vaticano II, de ser uma Igreja “nos cinco continentes” aprofundou muito a sensibilidade em relação a uma necessária inculturação da fé, do culto, da forma jurídica e das formas de vida eclesiais. 


Embora se trata de um processo lento e gradual, constatamos uma aceleração surpreendente pelo simples fato de um papa interpretar seu próprio ministério por meio de uma cultura diferente da europeia. Esse é um evento teológico de primeira grandeza, mesmo que tentemos escondê-lo com as fáceis “reduções” de Francisco a um “italiano com um sotaque estranho” e, de todos os modos, de origem piemontesa. 


Na realidade, sua compreensão do mundo e da tradição é marcada por uma terra que dista 10.000 km de Roma, onde as estações do ano são invertidas. Esse é um dado que inova profundamente a tradição do papado. 


4. O primeiro papa “jesuíta”

Um último aspecto de novidade é a natureza “religiosa” do cardeal Bergoglio, primeiro jesuíta a se tornar papa. Esse fato trouxe ao seu ministério um traço de novidade ligado ao modo de pensar, de rezar, de exercer a misericórdia, de celebrar e de administrar, característico da tradição inaciana. 


Teologicamente, é muito interessante descobrir como o primado da misericórdia – que certamente é um dos traços qualificadores de seu pontificado – foi mediado por uma linha de interpretação da misericórdia (no campo sacramental e extrassacramental) que pode ser facilmente remetido à “casuística” jesuíta. Encontramos traços disso no modo de abordar as questões relacionadas ao sacramento da penitência ou ao sacramento do matrimônio. 


Isso não impediu Francisco de escrever uma carta apostólica para celebrar Blaise Pascal no quarto centenário de seu nascimento (Sublimitas et miseria hominis). 


Esses quatro pontos, em relação entre si, permitem avaliar esses 12 anos de pontificado como um evento que pode ser muito interessante de estudar sob uma perspectiva requintadamente teológica.


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