Rian Santos
25 de Out de 2023, 20h34
Segundo Milan Kundera, não há outra trincheira na peleja do populacho com os donos do mundo: “A luta do homem contra o poder será sempre uma luta da memória contra o esquecimento”.
O pensamento do escritor tcheco já me serviu de inspiração esta semana, quando questionei a natureza cartorial do Dia da Sergipanidade, celebrado em 24 de outubro, em coluna mantida no Jornal do Dia. Agora, a sentença me serve de pretexto para apontar o lapso corrente no exercício do jornalismo em Sergipe.
O tal Dia da Sergipanidade, aliás, foi escolhido a dedo para que o reitor Jouberto Uchôa tirasse o melhor proveito da inauguração do Memorial de Sergipe.
Lá, em espaço cedido pelo Governo de Sergipe durante a gestão de Jackson Barreto, o senhor reitor da Universidade Tiradentes convocou a imprensa a fim de passar pano para a sua calvície e lustrar, assim, a sua biografia.
Embora seja perfeitamente possível questionar a exploração de um espaço público por ente privado - a Unit cobrará ingresso aos visitantes do Memorial -, não resta dúvida a respeito da função social do lugar.
Tão importante quanto divulgar o acervo ali reunido, contudo, é preservar a memória e os feitos dos personagens mais vistosos da aldeia, sem meias palavras. É neste particular que a imprensa local falha vergonhosamente - com as louváveis exceções de sempre.
Desde a inauguração do Memorial, Uchôa voltou a ser pintado com as cores de um cidadão e empreendedor exemplar. Há poucos meses, no entanto, o magnífico reitor foi flagrado em conluio com a horda bolsonarista, na porta do Batalhão do Exército em Aracaju - 28ºBC -, onde os celerados exigiam um golpe.
Eu não esqueço. Jornalismo é também construção de memória.
Uchôa e o golpe - Jouberto Uchôa, reitor da Universidade Tiradentes, abusou da própria sorte. Podre de rico, ele poderia desfrutar dos bolsos bem fornidos sem fazer caso da enorme influência exercida nos círculos mais reservados da aldeia.
Preferiu, no entanto, flertar com o obscurantismo e tomar parte na mímica golpista dos bolsonaristas. E, assim, foi castigado sem dó nem piedade nas redes sociais. A malhação de Uchoa consistiu num esforço justo, cabível também em âmbito judicial.
Ao confraternizar com os lunáticos reunidos nas cercanias do 28º Batalhão de Caçadores, às vésperas da intentona do dia 8 de janeiro, ele endossou um crime dos mais graves.
Não se trata de se filiar a esta ou aquela corrente de pensamento, manifestar uma opinião, exprimir-se em seus próprios termos, resguardado pela Constituição Cidadã de 1988. Nada disso. Os inconformados não mediram as palavras e não escondiam as reais intenções do levante: eles clamavam por um golpe.
Ali, Uchôa emprestou a reputação construída durante décadas de trabalho digno à pantomina golpista dos bolsonaristas. Assemelhou-se, assim, a uma Cássia Kiss, igual a todos os doidivanas sem discernimento assombrados pela ameaça vermelha do comunismo.
Uchôa perfilou-se ao lado de quem faz palanque de templos religiosos, confunde liberdade de expressão com a fabricação de fake news e acredita piamente em mamadeiras de piroca.
Eu não esqueço, não permitirei que a memória de eventuais leitores venha a falhar: golpista, Uchôa queria um golpe.
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