MESMO A IGREJA CATÓLICA TENDO UM PAPA COMO FRANCISCO.
Romero Venâncio (UFS)
Já é público e notório o crescimento vertiginoso de um tipo particular de "tradicionalismo contemporâneo” dentro do catolicismo romano no mundo e, em particular, no Brasil. Com o desenvolvimento das mídias digitais a coisa tornou-se irreversível. Trata-se de uma realidade. Se a CNBB e toda a "esquerda católica" faz vista grossa ou resolve aplicar a si a tática do avestruz, ou seja, enfiar a cabeça embaixo da terra e avaliar que nada acontece porque não está vendo, paciência. Uma realidade não deixa de existir porque eu penso que ela não existe.
Desde 2016 acompanho e monitoro as redes de um grupo chamado "Centro Dom Bosco" do Rio de Janeiro. Seus cursos, suas lives, seus processos contra a Netflix/Porta dos Fundos e as "Católicas pelo direito de decidir", sua ação em paróquias contra uma missa no dia da "consciência negra" ou suas aulas no domingo à noite. Atualmente, decidiram entrar de vez no campo do audiovisual na linha do "Brasil Paralelo", exatamente em cumprimento ao projeto propalado por Olavo de Carvalho.
Vai na sexta edição a chamada "Liga Cristo Rei". Uma tentativa do Centro dom Bosco de reunir toda a "direita católica" brasileira e com participação de figuras de cunho internacional. Neste 2023, tiveram a presença de Dom Athanasius Schneider (O.R.C.) que é um bispo católico romano do Cazaquistão, bispo auxiliar de Astana e tradicionalista de carteirinha. Todos os presentes se dedicaram em todo o encontro a criticar radicalmente o "Sínodo da sinodalidade" e a teologia do Papa Francisco. Todos são marcados por uma "teoria da conspiração" e um "pânico moral" que chegam ao delírio. Na leitura dessa gente, o fim da Igreja Católica está próximo, caso não se mude o rumo eclesial de acordo com o "tradicionalismo" deles.
Na leitura "teológica" do Centro Dom Bosco e seus apoiadores, tudo começou a partir do Concílio Vaticano II. Seguiu com as conferências episcopais na América Latina e chega seu ponto mais alto com a Teologia da Libertação. Em síntese, a Igreja Católica atual estaria atolada em uma grande forma de "heresia" e que o Papa Francisco passa a ser o seu promotor.
Segundo o antropólogo dos EUA Benjamin R. Teitelbaum em seu importante livro: "Guerra da eternidade: o retorno do tradicionalismo e a ascensão da direita populista" (Editora da UNICAMP, 2020), a volta de um tipo particular de "tradicionalismo" está em curso no mundo. Em seu livro, Teitelbaum entrevistou Steve Bannon, Olavo de Carvalho e Aleksandr Dugin e percebeu algo em comum entre os três e o papel que eles desempenham em seus países numa jornada tradicionalista de extrema direita. O livro do Teitelbaum deveria ter sido um alerta importante quando da sua tradução no Brasil. Fomos e somos um dos países atingidos por este movimento e que legou um projeto político que chegou à Presidência da República.
A pesquisadora e professora Gizele Zanotto que estuda a TFP (Tradição, Família e Propriedade), em um ensaio importante e atual, chama a atenção para uma América Latina marcada pelo "tradicionalismo reacionário católico". No texto aborda “uma rede de sociabilidade integrista: a expansão tefepista para a Argentina e o Chile" (2019). E alerta "para além das revistas, pontuamos que reuniões, grupos, de estudo, debates, palestras, manifestos, difusão de obras, páginas, blogs e outras formas de agregação online são sustentáculos de grupos articulados em torno de uma tradição intelectual."
Assim, avança o tradicionalismo católico atual com um discurso reacionário em uma forma de comunicação mais avançada que temos. Um aparente paradoxo já desvendado por Adorno e Horkheimer no livro "Dialética do Esclarecimento". Usam os meios de comunicação mais avançados em termos técnicos para divulgar uma mensagem reacionária e de simpatia pelo fascismo. Estão frutificando? Não temos mais dúvidas. Chegaram as paróquias e dioceses. Jovens padres tradicionalistas é o que mais cresce no catolicismo brasileiro com apoio de vários bispos e até cardeais (para maiores esclarecimentos, consultemos o pe. Agenor Brighenti em seus estudos sobre o clero brasileiro).
E não podemos esquecer de um laicato muito receptivo para todo tipo de tradicionalismo católico.
O tradicionalismo como ameaça para uma Igreja em saída
SÍNODO 5
Pe. João Mendonça, sdb
Ainda não recebi o texto síntese desta etapa sinodal em português, mas recebi em italiano. Não vou aqui me pronunciar com profundidade sobre o mesmo. Quero apenas dizer, na escuta das entrevistas e nas leitura que fiz, que foi construída uma base de reflexão que começa agora, desde esta grande escuta universal, a desenvolver ações que colaborem na sinodalidade. O Sínodo, portanto, não acabou, não foi feito um documento, mas um texto cujos elementos precisam continuar sendo refletidos em várias instâncias.
Com o título UMA IGREJA EM MISSÃO, a síntese tem 3 partes: 1. O rosto da Igreja sinodal; 2. Todos discípulos, todos missionários; 3. Tecer laços, construir comunidades.
- Na introdução, o Batismo é apresentado como o laço fundamental da nossa missão eclesial;
1. O rosto da Igreja sinodal: apresenta a sinodalidade como valor teológico, uma maneira de agir, que nasce da contemplação da Trindade na diversidade eclesial;
2. Todos discípulos, todos missionários: trata da sinodalidade como envolvimento de todo o Povo de Deus na riqueza dos ministérios e carismas a serviço do Reino de Deus;
3. Tecer laços, construir comunidades: a sinodalidade é apresentada como processos para criar pontes de diálogo entre a Igreja e o mundo.
Em cada parte encontramos as convergências, as questões emergentes da grande escuta e as propostas que precisam ser refletidas. Neste sentido, há a consciência de que o Sínodo não acaba aqui, mas abre questões teológicas, canônicas e pastorais, que precisam de maior aprofundamentos. As propostas indicam possibilidades, sugestões e caminhos que precisamos juntos percorrer. Caberá, portanto, as Conferências episcopais darem prosseguimento a essas indicações e proporcionar as reflexões necessárias no campo teológico, pastoral e canônico.
Alguns aspectos que chamam minha atenção:
1. A iniciação cristã – a entrada numa comunidade de fé;
2. Os pobres como os protagonistas do caminho eclesial;
3. A multiculturalidade da Igreja – uma riqueza que não pode assustar;
4. A interculturalidade da Igreja oriental e latina;
5. O ecumenismo;
6. A presença da mulher na Igreja à luz da dignidade batismal e as devidas consequências ministeriais e carismática;
7. O valor da vida religiosa consagrada na sua dimensão profética;
8. A presença efetiva e afetiva dos diáconos e presbíteros na Igreja sinodal;
9. O serviço do bispo como sinal de comunhão e testemunha na Igreja local;
10. A formação permanente do Povo de Deus numa perspectiva sinodal;
11. Os abusos e o discernimento para prevenção;
12. A sinodalidade requer uma Igreja que saiba escutar;
13. A evangelização digital como nova fronteira a ser acolhida porque ali estão, em grande número os adolescentes e jovens;
Outas questões decorrentes da síntese serão traduzidas em ações pontuais e dentro das realidades, mas o leque é enorme, e caberá realmente a todos nós leitura atenta, reflexão, oração, colaboração e ação conjunta. “O caminho se faz caminhando’.
O Papa: a teologia deve ser capaz de interpretar o Evangelho no mundo de hoje
Com o Motu Proprio "Ad theologiam promovendam", Francisco atualiza os Estatutos da Pontifícia Academia de Teologia, chamando-a a "uma corajosa revolução cultural" para ser profética e dialogante à luz da Revelação.
Papa Francisco convoca os teólogos a uma revolução cultural. Grande e profético Francisco! Um papa sensacional. Um homem muito sábio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário