Li apenas um livro-entrevista de um dos "papáveis" quando desenvolvia pesquisa sobre a extrema direita católica nas redes digitais. Trata-se de: "A noite se aproxima e o dia já declinou" (editora Fons Sapientiae. Com distribuição pela Paulus) do Cardeal Robert Sarah. Muito citado por grupos da direita católica e youtubers brasileiros. Vi, ainda, algumas entrevistas concedidas por ele. Um homem nitidamente de mentalidade conservadora (tradição e magistério da Igreja regem seu pensamento). Os principais temas que ele chama a atenção: parte de um diagnóstico básico: o nosso mundo está à beira do abismo. As razões: crise de fé e a crise da Igreja, o declínio do Ocidente, a traição de suas elites, o relativismo moral, o globalismo sem limites, as novas ideologias, o esgotamento político, os descaminhos do totalitarismo islâmico (isto é palavra dele). Reparemos que a saída é o tradicionalismo. Em todo o tempo da entrevista no livro, o Cardeal Sarah não hesita em defender a tradição e a "sujeição" (do mundo e dos católicos ao poder magisterial). Em temas culturais e de costume: um prelado reacionário. E direto. Casamento e família como ele acredita que Deus fez...
Um exercício de imaginação (o que pode não ocorrer!). A eleição ao cargo de Papa de um homem como o Cardeal Sarah ou Cardeal Burke (acho pouco provável) ou ainda algum desses conservadores, será um baque grande no que vive a Igreja Católica hoje após o magistério de Francisco. Insuportável para um grupo grande de padres e leigos/leigas; muito difícil para a vida religiosa consagrada e um desafio para um grupo de bispos que via no pontificado de Francisco um avanço da Igreja no mundo moderno. A roda da história não volta pra trás, por certo. Mas podemos lembrar a última década do papado de Pio XII e os últimos e melancólicos anos de João Paulo II. Num projeto como esse, a teologia e seus teólogos/teólogas sofreram uma série de restrições que significará a impossibilidade do ofício na liberdade que lhe cabe. Em termos litúrgicos, voltaremos a uma discussão anacrônica de hóstia na boca ou na mão ou ainda (e com força) missa em latim (que eles chamam equivocadamente de "missa de sempre").
Uma ironia da história: o extremo oposto do cardeal africano Sarah é um Filipino. Trata-se de Luis Antonio Tagle. De avós chineses, um homem de orientação cosmopolita a partir de uma matriz asiática de pensamento. Nas entrevistas e palestras que vi, percebo uma figura contundente e bem antenada com o que ocorre no mundo. Não tem referência tradicionalista, apesar de ser um homem de contemplação. Um orador extraordinário. Tem uma impressionante capacidade comunicação. A situação de ser considerado o oposto dos conservadores, poderá ser um péssimo caminho para o Cardeal Tagle.
Diante dessa oposição: Sarah/Tagle (África/Ásia), poderá surgir (como sempre surge na Igreja Católica) a "coluna do meio". Voltaríamos a Itália que teria dois ou três cardeais com este perfil. Acredito que o Papa Francisco tentou até o fim preparar a transição de um papado a outro. As nomeações de cardiais foram muitas, mas isto não significa muito em termos de poder na Igreja. Afinal, Francisco está morto para os cardeais. Uma coisa é certa: trata-se de um absurdo milhões de católicos/católicas espalhados pelo mundo ter a principal liderança espiritual e política da Igreja decidida por 135 homens... Chega a ser constrangedor. Paciência.
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