Reino de Deus como um mundo onde a justiça, a paz e a alegria prevalecem, e onde o mal e o sofrimento são vencidos.
"Venha a nós o teu reino
Seja feita a tua vontade
Assim na terra como no céu"
Oração do Pai Noss0
Quem foi Dom Angélico Sândalo Bernardino?
Bispo emérito de Blumenau (SC), Dom Angélico foi padre da Igreja Católica em Ribeirão Preto (SP) entre 1959 e 1974 e bispo-auxiliar da Arquidiocese de São Paulo entre 1975 e 2000. Sob a condução do cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, ficou responsável pela região episcopal de São Miguel Paulista, na Zona Leste, e, em seguida, pela região da Vila Brasilândia, na Zona Norte de São Paulo. Influenciado pelo Concílio Vaticano II e pela Conferência Episcopal de Medellín, nos anos 1960, assumiu a opção preferencial pelos pobres como princípio orientador de sua atuação pastoral.
Entusiasta da Teologia da Libertação, tornou-se um dos principais representantes do setor progressista da Igreja durante a ditadura militar e no período de redemocratização. Solidário aos movimentos sociais, engajou-se na luta por moradia e saúde na Zona Leste e foi coordenador da Pastoral Operária, com um trabalho significativo junto às demandas mais urgentes dos trabalhadores.
Sua história percorre alguns marcos fundamentais na luta por direitos humanos no Brasil, como a prisão de Madre Maurina (1969), os assassinatos sob tortura de Vladimir Herzog (1975) e Manoel Fiel Filho (1976), a execução do metalúrgico e sindicalista Santo Dias (1979), a campanha por Eleições Diretas (1984) e a descoberta da vala clandestina de Perus (1990).
https://domangelico.memoriasdaditadura.org.br/quem-e-dom-angelico/
DOM ANGELICO SÂNDALO BERNARDINO: UM PASTOR COM CHEIRO DE POVO, CORAÇÃO DE PROFETA E ALMA DE SANTO.
"Perdi um confessor, amigo e companheiro de lutas. Mas terei a alegria de poder dizer aos meus netos: eu conheci um santo." (Toninho Kalunga)
Estas palavras, carregadas de emoção, são as primeiras palavras que me chegam a memória, sob o forte impacto da notícia da passagem de Dom Angelico para a vida eterna! Tenho a alegria e a honra de poder ter feito parte de um pedacinho da caminhada e de ter convivido com Dom Angélico Sândalo Bernardino.
Com ele aprendi que devemos estar presentes nas dores e esperanças da luta do povo. São estas palavras que resumem, com simplicidade e grandeza, a marca deixada por esse bispo que, com seu rosto sereno e sua voz firme, soube conjugar fé e justiça, oração e ação, cruz e defesa intransigente de uma bandeira, a bandeira da Paz!
Dom Angélico nos deixou no tempo, mas não na história. Sua partida para a morada eterna – a que Jesus prometeu aos que vivem o Evangelho com radicalidade e ternura de que pra onde Ele iria, iriam também todos que Nele creram – nos convida à memória e à gratidão.
Filho do Concílio Vaticano II
Nascido em Saltinho (SP), que na época era distrito de Piracicaba, em 19 de junho de 1933. Dom Angélico foi ordenado padre em 1959 e bispo em 1974, pelo Papa Paulo VI, em plena ebulição do pós-Vaticano II. Foi um daqueles pastores que não apenas leram os documentos do Concílio, mas o encarnaram. Escolheu viver a Igreja como povo de Deus, e não como poder.
Bispo auxiliar de São Paulo, braço direito do Cardeal Arns nos tempos sombrios da ditadura militar, Dom Angélico colocou sua mitra e báculo a serviço da vida. Participou das célebres "missas dos presídios", das denúncias contra a tortura e do apoio firme às Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), à Pastoral da Terra, da Moradia e aos movimentos populares. Um bispo da rua, da roça, da favela e do chão das fábricas.
A Teologia da Libertação como prática de fé
Dom Angélico não apenas simpatizava com a Teologia da Libertação – ele a vivia. Como dizia Dom Pedro Casaldáliga, “não se trata apenas de uma teologia sobre a libertação, mas de uma teologia libertadora”. E assim ele foi: homem da escuta, das romarias, dos mutirões e da partilha do pão.
Em 2000, tornou-se bispo da Diocese de Blumenau (SC), onde também levou seu jeito simples e de quem conheceu a imensa misericórdia de Deus e assim, foi seu jeito de ser Igreja. Após sua aposentadoria canônica em 2009, retornou a São Paulo, onde seguiu ativo, celebrando, aconselhando, participando de atos públicos e sempre com um olhar afetuoso aos mais pobres, aos trabalhadores e às lutas do povo. Foi neste período em que mais convivi com dom Angélico.
Um santo do nosso tempo
Dom Angélico era da linhagem dos santos que não esperam canonizações. Sua santidade era visível nos gestos cotidianos: no abraço aos sem-teto, na presença solidária com os sem-terra, na palavra profética diante das injustiças. Não usava trono, mas banco de praça. Não tinha muralhas, mas portas abertas. Não se escondia em palácios, mas se deixava encontrar nas ruas, marchas, acampamentos e vigílias. Esta era sua Igreja!
Sua morte não é o fim de sua missão. É a passagem do bastão. A fé que professou e a justiça que defendeu continuam vivas nas comunidades, nas pastorais sociais, nas juventudes, nos movimentos populares e em tantos que, como ele, acreditam que o Reino de Deus começa aqui, com pão, dignidade e esperança para todos. Afinal, as palavras convencem, mas os exemplos arrastam!
A herança de um pastor libertador
Num tempo em que a fé muitas vezes é sequestrada por discursos de ódio ou por alianças com o poder econômico, Dom Angélico foi fiel ao Cristo dos pobres. Sua vida é um lembrete de que ser Igreja é estar do lado dos últimos. Como diz a canção que tantas vezes ele pedia para ser repetida nas Missas que presidia: “É Jesus este pão de igualdade, Viemos pra comungar, Com a luta sofrida de um povo, Que quer, ter voz, ter vez, lugar, Comungar é tornar-se um perigo, Viemos pra incomodar…”.
E Dom Angélico, com certeza, com o Evangelho e a Comunhão, nos ensinou a incomodar aqueles que não se importam com a dor dos pobres, mas, mais do que isso. Dom Angélico nos ensinou a NOS incomodar conosco mesmos, para não nos distanciar dos pobres.
Que sua memória nos inspire a manter viva a chama da utopia do Reino. E que possamos, ter a honra de dizer às próximas gerações, então, refletindo sobre o que escrevi no começo, refaço a frase: “Eu conheci um santo com nome de anjo, que atende pelo nome de Angélico”
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