Por Leonardo Boff em 21/12/2025
A tradição teológica acentuou sobremaneira o significado na encarnação do Filho de Deus, celebrada no Natal, como a divinização do ser humano. Na verdade, teologicamente quer-se enfatizar um fato ainda maior: a encarnação é a humanização de Deus. Todas as Escrituras afirmam como São João: “A Deus ninguém jamais viu. Foi o Filho unigênito do Pai quem no-lo deu a conhecer”(1,18). Deus, por Jesus de Nazaré, fez sua a nossa humanidade, coisa realmente inaudita. Então há algo de Divino dentro de nosso ser humano, homem e mulher, que jamais pode ser destruído.É a nossa suprema dignidade: portadores e portadoras de Deus. Por isso,não pode haver tristeza quando nasce a vida divina em nós.
O Natal é a celebração desse evento bem-aventurado. Os evangelhos chamam Jesus de Sol da Justiça. O nascimento de Jesus coincidia exatamente com a festa romana do Dia do Sol Invencível. Este dia, para o hemisfério norte, é o mais curto do ano e com a noite mais longa. O medo dos povos antigos era de que o sol não voltasse a nascer. Quando nascia novamente celebrava-se sua vitória sobre a escuridão. Jesus é apresentado como o Sol invencível que vencerá todas as escuridões da vida.
Se Jesus é o Deus que se fez homem, poderíamos pensar que tivesse nascido num lugar bem preparado, como num palácio, numa mansão com muito conforto ou numa maternidade famosa. Finalmente seria prestar homenagem a alguém que é Deus, como fazemos com pessoas importantes que nos visitam como os presidentes, famosas celebridades e o próprio Papa.
Deus não quis nada disso. Devemos respeitar e amar o modo como Deus quis entrar neste mundo: escondido, participando do destino daqueles que batem à porta, de noite, no frio, com uma mulher grávida, segurando na barriga o filho que está para nascer e que tem que ouvir estas duras palavras: “não tem lugar para vocês”.
Então José e Maria vão embora e ocupam, na urgência, uma estrebaria vizinha. Lá havia palha, uma manjedoura, um boi e um burrinho que com seu bafo esquentaram o corpinho frágil e tiritante do recém nascido.
Deus, portanto, entrou silenciosamente, nesse mundo, pelas portas do fundo. Os que habitavam na capital, em Roma ou em Jerusalém e outras pessoas importantes nem ficaram sabendo.
Nisso há uma lição a tirar: Deus quando quer se manifestar não usa o espetáculo grandioso, mas o silêncio singelo das pequenas coisas. Assim devemos compreender que ele veio para todos, mas de maneira especial a começar pelos pobres e simples porque ele foi pobre e pobre ficou por toda a sua vida na simplicidade e no despojamento.. Se tivesse nascido entre os ricos, deixaria os pobres de fora. Nascendo entre os pobres, está sempre perto deles e a partir deles pode alcançar também os melhor situados na sociedade. Desta forma ninguém fica excluído de ser tocado pela presença de Deus.
Por ocasião do nascimento do menino Jesus não havia somente gente do povo como os pastores, considerados desprezíveis por terem contacto contínuo com animais. Os evangelhos falam que vieram do Oriente os reis magos.Os cristãos antigos concluíram que os magos eram sábios, cujos nomes foram conservados: Baltazar, Belquior e Gaspar. Belquior era da raça branca, Gaspar, da raça amarela e Baltazar, da raça negra. Assim eles representavam toda a humanidade.
Os presentes oferecidos por eles são simbólicos. O ouro significa que reconheciam Jesus como rei. O incenso significa que Jesus é divino. A mirra expressa a dor e o sofrimento. O sentido é o seguinte: Jesus é rei de verdade, mas não como os reis deste mundo que dominam as pessoas. Jesus, ao contrário cuida delas. Jesus é uma pessoa divina não para ser exaltada e proclamada a ponto de ser afastada do nosso meio. Ao contrário, é um Deus conosco -Emanuel - que quer conviver e caminhar junto a cada ser humano.
A mirra amarga expressa a forma como Jesus foi rei, dando sua vida pelo povo e como viveu sua divindade assumindo morrer na cruz por amor a todos os seres humanos.
O grande poeta Manuel Bandeira expressou bem esta lógica do Natal em sua poesia
Conto de Natal:
O nosso Menino
Nasceu em Belém
Nasceu tão-somente
Para querer o bem.
Nasceu sobre os palhas
O nosso Menino
Mas a Mãe sabia
Que Ele era divino
Vem para sofrer
A morte da Cruz.
O nosso Menino
Seu nome é Jesus.
Por nós Ele aceita
O humano destino:
Louvemos a glória
De Jesus-Menino.
No Natal temos o direito de nos encher de alegria, pois não estamos mais sós. Deus anda conosco, sofre conosco e se alegra conosco. Ele é o maior presente que Deus Pai nos poderia ter dado. Por isso trocamos presentes entre nós para sempre lembrar este presente que o Pai celestial nos deu, dando-nos Jesus, seu filho querido.
Leonardo Boff é teólogo e escreveu:O Sol da Esperança:Natal, Histórias, Poesias e Símbolos, Rio 2007; Natal:a humanidade e a jovialidade de nosso Deus, Petrópolis 1976.
Jesus e a humanidade: uma mensagem que atravessa as religiões — Leonardo Boff
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