Romero Venâncio (UFS)
A vitória de Lula e a montagem de sua equipe de trabalho foi um alívio apesar dos pesares de um governo de ampla aliança. Não estamos mais em 2013, em 2016, em 2018. Os tempos podem e devem ser outros. A tarefa é imensa. Na educação, na saúde, na economia, na cultura. Não é tarefa unicamente de um governo, mas deverá envolver um setor considerável da sociedade civil brasileira que aposta em democracia com todos os seus limites institucionais. Não podemos ficar refém da caneta de ministro do STF (mesmo reconhecendo a importância histórica do ministro Alexandre de Moraes... Mas o pau que bate em chico pode bater em Franscisco!!!)
Existe neste Brasil uma tradição historiográfica que elaborou pesquisas importantes e reveladoras sobre o significado de 1964, o golpe e a ditadura que se seguiu até 1985. Mas tudo que foi pesquisado sobre a ditadura, prisões arbitrárias, exílios, tortura, desaparecimentos e sufocamento das instituições democráticas ainda precisa ser mais divulgado, estudado e incorporado pelas gerações contemporâneas. Não pode ser admissível que um jovem de 20 anos defenda intervenção militar sem saber nada sobre as consequências de 1964 só porque viu a gororoba ideológica de coisas como “brasil paralelo” (e bota paralelo nisto!) ou os delírios performáticos de Olavo de Carvalho e seu séquito. Isto não pode ser normalizado.
Como bem disse o filósofo Paulo Arantes: “O fato é que ainda não acusamos suficientemente o golpe de 1964”. Acrescentaríamos: não acusamos suficientemente todos os golpes deste país que teima em não ser democrático e baixar a cabeça para um bando de generais parasitas e bizarros na sua ignorância histórica. Temos comprovadamente as “acusações ao golpe de 64” para além do bom trabalho de uma série de historiadores/historiadoras. Temos um cinema que tematizou à ditadura desde 1965 até os dias atuais. Precisamos ver e divulgar estes filmes. Temos uma literatura que se engajou nas denúncias do golpe de 64 e da ditadura. Antonio Callado, Lygia Fagundes Teles, Caio Fernando Abreu, Hilda Hilst, Inácio de Loyola Brandão, Gregório Bezerra, Herbert Daniel, Cacaso, Renato Tapajós, Lélia Gonzalez e tantos escritos que ficaram como registro de tempos nefastos e que precisam ser recuperados.
A memória que está em filmes e livros, também é possível ser aprendida e apreendida na história de organizações da sociedade civil que resistiram aos ditadores: movimento de homossexuais, movimento de mulheres, movimento negro, as lutas camponesas, a teologia da libertação, a resistência dos comunistas. Não podemos esquecer!!!
PROPONHO AO ATUAL MINISTÉRIO DOS DIREITOS HUMANOS DO GOVERNO FEDERAL:
- Liderar e promover uma campanha no mês de março de 2013 sobre 1964 e suas consequência na vida social brasileira até os dias atuais
- Incentivar e sugerir que escolas, universidades, sindicatos, movimentos sociais, youtubers, grupos em redes sociais façam do mês de março o mês da “Memória para uso diário”
- Exibição de filmes, leituras dramáticas, atos de rua, colagens, panfletagens de material sobre o golpe de 1964 e a ditadura que se seguiu
- Não aceitar em hipótese alguma a maldita “comemoração” nos quarteis ou fora dele de 31 de março de 1964. Não se comemora ditadura, tortura, exílios, desaparecimento de corpos. O Brasil que merece o nome e a grandeza precisa romper com esta coisa abjeta que celebrar esta data. Chega.
- O ministério dos direitos humanos poderia convidar formalmente: Leandro Fortes (DCM), Cecília Coimbra (UFF- Grupo Tortura Nunca Mais-Rio); João Cezar de Castro Rocha (UERJ), Yeda Leal (MNU) e José Paulo Netto (UFRJ) para compor uma comissão estratégica para agilizar uma campanha nacional
- É preciso uma campanha nacional e coordenada em que acusemos os golpes de 1964 para cá. Que alimentemos a memória dos mais jovens com uma cultura democrática.
Atentemos enquanto é tempo. E o tempo clama. Já dizia um velho e atual sábio: “Eu digo a vocês, respondeu ele; se eles se calarem, as pedras clamarão”.
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