Gegê Natalino
Nas três missas dominicais comuniquei à paróquia que segunda (09/01), pela manhã, partiria à Brasília para a posse da valente Anielle Franco, Ministra da Igualdade Racial.
Na parte da tarde, como um golpe, assisti pela televisão o espetáculo monstruoso da destruição golpista. Sou do tempo em que os antigos diziam: "isso é feio, meu filho!".
Nesta breve mensagem não quero me deter no horror e no ultraje amplamente reprovados pelo Brasil e pelo mundo.
Quero sim dizer que ainda que a sede dos Três Poderes terminasse em cinzas, o que não seria impossível, considerando a fúria insana dos vândalos/terroristas/golpistas (presentes e ausentes), ainda assim Brasília/Brasil seria reconstruído pelo poder da imagem da posse presidencial.
A imagem re-ligou o Brasil consigo mesmo. Estou falando numa re-ligacão no plano da alma profunda, irremediavelmente religiosa, segundo Jung.
Numa leitura simbólica, o ultrajante ataque planejado e executado no domingo seguinte à posse (08/01/23) não se dirigiu apenas contra à democracia e ao patrimônio público (o que é gravíssimo e criminoso), mas, sobretudo, à alma, a alma do mundo, que só repousa e goza diante do belo.
Então, assistimos sim, atônitos e desconcertados, o ataque da feiúra sobre o belo - sobre a boniteza jamais vista de uma rampa viva que se tornou subida/elevação para os desprezados e subaltenizados da história (indígenas, negros, catadoras, pessoa com deficiência, mulheres, etc).
A inaudita beleza do dia primeiro de janeiro de 2023 se tornou insuportável aos olhos sem alma dos profetas da ditadura, da destruição e da morte.
Brasília não foi apenas brutalmente atacada; foi também profanada.
A beleza de Branca de Neve foi vista como ofensa à feiúra da rainha má, assim como a beleza de Oxum foi lida como ultraje à fealdade racista-colonial.
Porque creio no poder da imagem, creio que o que foi apresentado aos olhos do mundo no dia primeiro seja infinitamente superior à imagem da destruição golpista.
Também creio que o Brasil será reconstruído (e reconhecido) pela imagem constelada na posse presidencial.
"Uma imagem fala mais que mil palavras", assegura o mitólogo, Joseph Campbell.
Uma imagem pode ter força revolucionária.
Um povo privado de beleza pode ser tão ou mais carente que um povo privado de pão.
Creio, pois, que a força da beleza, com a fúria que lhe é própria, seja capaz de reconstruir a vida, reconstruir Brasília, reconstruir o Brasil, reconstruir a Terra!
Estou falando da "fúria da beleza" da poeta Elisa Lucinda.
Considerando o conflitos das imagens (posse versus vandalismo), digo:
A beleza quando é grande, verdadeira e pura se torna uma ofensa à feiúra que vagueia como alma penada.
Nas urnas, o Brasil optou pelo bom, pelo justo e pelo belo - optou pela democracia: "democracia para sempre!".
Desse modo, certamente, escolheremos para guiar nossas almas e nossa pátria a imagem do dia primeiro, gravada e eternizadas em nossas retinas cidadãs.
Só o que é violentamente belo nos interessa: o Brasil feliz de novo!
Que imagem você vai escolher pra fazer valer a vida?
Os terroristas/golpistas se desesperam diante de uma obra de arte. Imagino o pavor que tiveram ao verem uma obra de Di Cavalcanti.
Diria em canto e encanto Maria Bethânia: "você está tão mirrado que nem o diabo te ambiciona. Não tem alma. Você é o oco, do oco, do oco...".
É mais fácil reconstruir a sede dos Três Poderes que embelezar gente sem alma; gente dezumanizada. A cadela resistência, que também subiu a rampa (e qualquer cão), goza de superior grandeza! E mais baixeza de alma tem os que planejaram, os que financiaram e os que facilitaram. E os que aplaudiram e aplaudem. É possível que alguns estejam bem perto de nós.
Alertou Tolstói: "Há quem passe pelo bosque é só veja lenha para a fogueira".
Por fim, para falar da vitória da imagem da posse presidencial (a subida da rampa e a entrega da faixa, em especial) ante qualquer imagem de destruição terrorista/golpista, tomo de empréstimo as palavras de Elisa Lucinda:
"Me tirou a roupa, o rumo, o prumo
E me pôs à mesa
É a porrada da beleza!"
E digo ainda, através da boca da poeta:
"Sabe como é?
Violenta, às vezes, de tão bela, a beleza é!".
Conforme a canção:
O povo sabe que de um mal, Deus sempre tira um bem. Certamente, o Brasil sairá mais forte, mais inteiro, mais atento, mais democrático e mais belo... E muito mais verde e amarelo.
Como um credo, repito as palavras de E. Lucinda: "É da vocação da vida a beleza e a nós cabe não diminuí-la, não roê-la, com nossos minúsculos gestos ratos...".
Na linha do ministro Sílvio Almeida, também digo: a democracia existe e é valiosa para nós! "Democracia para sempre!". É sobre isso...
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4 comentários:
Que beleza de texto! Como diz o escritor a beleza vem da alma, dos olhos que admiram-na.
Não podemos nos fixar no feio, corremos o risco de ficarmos com a alma tão feia quanto o "feio"!
Obrigada!
Valeu! Volte sempre e compartilhe bastante esse texto....
'8 de SETEMBRO "????? Lindo texto
Para compreender será preciso ler o texto novamente..
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