terça-feira, 14 de julho de 2020

13º Live da Ação Cultural traz memória de Dom Távora como resistência. o Bispo dos Operários. Em 19 de julho, às 16 horas no youtube


Eixo: Memória como Resistência
O tema: O necessário e atual Dom Távora. O Bispo dos  Operários.
Com  o  Padre Isaias Nascimento e com o Professor e  Historiador José Vieira.  

https://www.youtube.com/user/acaoculturalsergipe1




COMO SERIA A IGREJA E A SOCIEDADE SE TODOS OS BISPOS FOSSEM COMO DOM  TÁVORA?
No ano de 1969  vou para o Rio de Janeiro, seguindo a trilha de muitas chefes de famílias nordestinas. Meu pai,  José de Deus Santos, como tantos Josés nordestinos,  decide partir de Sergipe em direção as  terras do sul em busca de oportunidades de trabalho e condições mais favoráveis  para sustentar a familia.

Desses anos  de presença na chamada capital maravilhosa, não dá para lembrar muita coisa em detalhes, porém três questões foram fundamentais e marcaram o meu jeito de pensar e de ser até hoje.

A primeira diz respeito a leitura de jornais na adolescência, aos domingos,  em especial o Jornal do Brasil (JB),  um jornal liberal e democrático, com articulistas e jornalistas de primeira, alguns do campo progressista e de esquerda. 

Além do JB, não podíamos ficar sem ler alguns dos jornais  independentes do campo da esquerda, alguns partidários e outros nem tanto.  Preferia os segundos que eram a maioria. Em geral o dinheiro só dava para ler semanalmente um ou dois por mês, eventualmente três.

Ademais,  vale ressaltar que essa atitude foi mais intensificada quando passei a trabalhar em bancas de jornais por um período  aproximado de  cinco  anos, quando lia  a maioria dos  jornais e revistas distribuídos para vendas nas bancas.


A segunda questão diz respeito a frequentar  espetáculos de música e de teatro, além dos filmes de arte, preferencialmente os mais politizados. O que não podia ser feito com  frequência, não tanto pelos preços, já que em muitos casos havia temporadas com preços populares ou gratuítos, porém as distâncias eram grandes. 

Essa poderia variar entre uma a duas horas de relógio, do local onde morava, em São João de Meriti, mesmo que em uma região de fronteira com o bairro da Pavuna, no  Rio de Janeiro capital, mas zona norte, o que  por isso demandava um bom tempo para chegar aos espaços culturais concentrados no centro e na zona sul. O que se sucede na maioria das cidades brasileiras,  desde sempre. 


A terceira questão, a que diz  mais respeito ao tema desse artigo, foi a aproximação com a igreja católica em São João de Meriti, município onde morei durante  treze anos de residência  no Rio de Janeiro.  

Essa aproximação por volta dos 16 anos, se deu através da participação em um grupo de jovens da Igreja São João Batista, matriz da cidade onde residia,  com  base em uma concepção de religião que só fazia sentido para mim se estivesse   “encharcada” de paixão pela justiça, pelos pobres e pelos direitos humanos, "encharcada" aqui,  lembrando a canção todo artista deve ir aonde o povo está..


E isso não era problema no caso da Diocese de Nova Iguaçu, circunscrição da qual fazia parte todos os municípios da Baixada Fluminense até o ano de 1980,  porque esse compromisso foi assumido em plenitude por  Dom Adriano Hipólito, um dos bispos mais comprometidos naquele periodo com as causas das liberdades democráticas e da justiça social, e claro, por esse motivo, acusado de comunista, subversivo, de misturar de forma incorreta religião com politica, tanto que foi sequestrado, seviciado e humilhado em uma ação clandestina e covarde que envolveu integrantes do chamado Comando de Caça aos Comunistas, episódio que foi destaque nos jornais e revistas da época.

Mas aí,  chegamos a 1982, com uma situação econômica bem difícil em termos  de Brasil e Rio de Janeiro, e então lá vai  meu pai decidir pela viagem de volta. Mas,  da minha parte foi uma insatisfação  só, dentre as razões estava o inicio das minhas descobertas e aproximação com as comunidades eclesiais de base, ação pastoral inspirada na Teologia da Libertação, além de respirarmos no Rio de Janeiro naquela época,  um clima bastante efervescente em termos politicos e culturais progressistas, como também se sucedia em outros locais, incluindo Aracaju, porém em menor proporção e de forma incipiente. 

Naquele momento,  o que chamamos hoje de politica de morte e genocidio,  não tinha avançado tanto como hoje, embora gozasse de um bom ambiente para chegar ao ponto a que chegou por estes dias.   Dentre estes, podemos citar uma igreja local alheia aos dramas e sofrimentos da população mais pobre, salvo ações de cunho assistencial,  a exceção de poucas dioceses como Nova Iguaçu, Volta Redonda e talvez mais uma,


Por outro lado, juntamente  com  Dom Eugênio Salles, o arcebispo conservador do Rio de Janeiro,  escrevia no Jornal do Brasil regularmente  Dom Luciano José  Cabral Duarte, o arcebispo conservador de Aracaju, este,  às vezes utilizando expressões mais agressivas ou contundentes contra seus irmãos de episcopado que seguiam a linha do seu antecessor em Aracaju, Dom José Vicente Távora

E o que era caracteristico e me afastava desses escritos?  As criticas de Dom Eugênio e  Dom Luciano, a chamada  "influência comunista"  na igreja, decorrente sobretudo das ações e manifestações  da CNBB contra a falta de liberdade, contra a tortura, contra o aumento da miséria. Em suma, pelo ataque constante que o governo e empresas faziam a  trabalhadores, indigenas, camponeses, populações da periferia e etc..

E aí não foi fácil, lembro de ter dito pra mim mesmo: Pôxa! Quanto retrocesso, quanto atraso, sair de um lugar como o a Baixada Fuminense e retornar a um lugar com uma igreja católica conservadora, com mentalidade e práticas de relações politicas marcadas  pelo coronelismo, sem acesso a espaços e  produção cultural rica e diversa, assim como ao tipo de  imprensa que estávamos acostumados. 


E assim, retornamos a Aracaju, não sem antes saber que um dia Aracaju teve um  bispo bem progressista, Dom Távora como já citamos,  tanto que pagou caro por essa opção, sofrendo decepções, perseguições e humilhações, o que agravou o seu estado de saúde, levando-o  a óbito no inicio dos anos de 1970. Como fonte, tivemos neste caso   o livro Educar para Transformar de Luiz Eduardo W. Wanderley


E num certo  momento,   descobri  outra iniciativa de igreja progressista em Sergipe, mais especificamente a Diocese de Propriá. Isso se deu através de leituras no JB, o qual naqueles  tempos dificeis de ditadura,  fins de 1979 e inicio dos anos de 1980, trazia a situação de perseguição e violência contra o Bispo Dom José Brandão, outros  membros do clero de Propriá, leigos engajados, camponeses, indios e ribeirinhos. 


E vale ressaltar, também da parte de Dom Luciano Duarte , o qual  como afirmamos acima,  bradava de Sergipe para o mundo contra a "influência comunista" na igreja, como já citado. 

E por causa disso, no decorrer do tempo, também percebi um apagamento por meio do silenciamento acerca da   memória e do legado de Dom Távora, o que nunca foi tarefa fácil, pelo tanto de realizações que deixou no campo da educação, da politica de base comunitária, da cultura/comunicação, da assistência social,  mesmo assim com certo  êxito. 

Por essa razão fiquei muito feliz quando tive conhecimento da iniciativa de pesquisa do Padre Isaias  Nascimento sobre a vida e o legado do Bispo dos Operários. O que veio a se transformar no livro Dom Távora, o bispo dos operários.  "Um homem além de seu tempo."




E com essa Live nos somamos a esse esforço, o qual faz  juz a afirmação do escritor Milan Kundera "A luta da memória contra o poder, é a luta da memória contra o esquecimento."

P.S.: 
1 - Depois de muitos tempos residindo em Sergipe descubro que Dom Adriano Hipólito era sergipano, natural da mesma cidade onde nasci,  São Cristóvão.

2 - Também descubro que antes de Dom Távora, Aracaju teve um bispo progressista. Dom Fernando Gomes, o qual foi transferido para Goiânia. Talvez em Aracaju não era tanto assim, até porque nessa cidade ele foi bispo antes do Concilio Vaticano II. Mas em Goiânia, Dom Fernando Gomes se notabilizou por exercer um pastoreio comprometido com a justiça, com os direitos humanos e com a democracia e como não poderia deixar de ser também vigiado e perseguido  pelos militares por causa disso.

3 - Dom José Vicente Tavóra também teve um bom tempo de estadia e de ensino/aprendizagem no Rio de Janeiro como bispo auxiliar.

4 - O titulo desse artigo foi inspirado no titulo da canção abaixo, o qual tendo sido ouvida por Dom Távora algumas vezes, pode ter sido uma de suas  preferidas.
Com esse titulo e essa canção,  quero demonstrar todo o carinho e admiração que tenho para com o  belo , aguerrido e querido irmão.

Zezito de Oliveira  



Elizeth Cardoso - Se todos fossem iguais a você | 1957



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sexta-feira, 3 de abril de 2020



MÚSICA TEMA DA 13ª LIVE
















Padre Isaias Nascimento  - Membro da Diocese de Propriá, Coordenador da Cáritas Diocesana e das Pastorais Sociais. Reside no Povoado São Miguel, município de Propriá, onde é Pároco.

José Vieira da Cruz é Professor Adjunto IV da Universidade Federal de Sergipe, vinculado ao Núcleo de Graduação em Educação em Ciências Agrárias e da Terra do Campus do Sertão - NECATS/CAMPUSSER, desde 06/07/2020.

Licenciado em História pela UFS (1998), mestre em Sociologia também pela UFS (2003) e doutor em História pela UFBA (2012).

 Foi Vice-reitor da Universidade Federal de Alagoas entre 21/01/2016 a 22/01/2020, Coordenador do Curso de História -UFAL - Campus do Sertão (2013-2015). Professor da Rede Estadual de Educação de Sergipe (1998-2013) e da Rede Municipal de Educação de Aracaju (2002-2013).

É autor do livro: "Da autonomia à resistência democrática: movimento estudantil, ensino superior e a sociedade em Sergipe, 1950-1985, publicado em 2017; do livro "Formação sócio-histórica do Brasil", publicado em 2010; e um dos organizadores do livro "Manoel Bonfim e a América Latina: cem anos a publicação de América Latina: males de origem", publicado em 2010. Além dessas publicações, tem mais de uma dezena de artigos científicos e de capítulos de livros.



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