Como é bom de parábola e comunicação esse Jesus de Nazaré! A leitura do Evangelho nesse domingo, em milhares de comunidades de fé por todo o mundo, é um exemplo (João, 10, 11-18).
Vivendo numa sociedade de base rural, Jesus assemelha os líderes (religiosos e políticos) a pastores de ovelhas e cabras. Lembra que eles devem zelar pelos rebanhos, sempre ameaçados por lobos vorazes e ladrões.
Com a comparação, já cutuca os poderosos do seu tempo: pastores eram tão imprescindíveis quanto discriminados, os últimos dos últimos na escala social...
Vivendo numa sociedade hipócrita e competitiva - sabemos bem o que é isso! - denuncia os pastores mercenários, que só ambicionam o ganho, o lucro. Não têm nenhum amor por aqueles a quem alardeiam cuidar.
O Mestre é definitivo: "o bom pastor dá a vida por suas ovelhas", torna-se uma delas. Não deixa que nenhuma se perca!
Identifica-se tanto com elas que elas conhecem sua voz, e ele o balido de cada uma. Nada de "rebanho de manobra"!
São e somos ovelhas negras, brancas, marrons, de todas as cores na sua diversidade. Se há "rês desgarrada na multidão boiada caminhando a esmo" (Gil e Dominguinhos), a missão do bom pastor é orientá-las e protegê-las pelo amor.
É, ele próprio, ovelha também, na busca comum de verdes pastagens, guiando suas amada/os pelas veredas da Justiça (Salmo 23), livrando-as do matadouro.
Jesus se define, ao mesmo tempo, como o Bom Pastor e o Cordeiro Pascal: condução e aceitação (assim nossas existências, pontuadas por decisão, rumo, conquistas, e queda, incerteza, derrotas. Resolução e ansiedade).
O Pedagogo Maior alerta para que não nos deixemos enganar por "lobos em pele de cordeiro" - sedutores, enganosos, manipuladores, criminosos! Com armas letais ocultas em suas mãos, ao invés do cajado da sabedoria. Diante desses, insubmissão!
Papa Francisco clama por "pastores com cheiro de ovelha, não de perfume francês ou sacristia". São os que se põem em saída, apenas com o "mapa" da fé e os riscos dos tropeços: "caminante no hay camino, se hace camino al andar" (Antonio Machado - 1875-1939).
Pastores/ovelhas ultrapassando os vales da sombra da morte e não temendo mal algum.
Nós todos, irmanados, querendo vida e lutando por ela.
Como aquele Joaquim José, o nosso Tiradentes, rebelado contra a exploração colonial, indo para a forca num 21 de abril, há 232 anos, e sabendo que seu ideal venceria o esquecimento e o sal: "dez vidas eu tivesse, dez vidas daria...".
Ser bom pastor não vem do lugar de poder - trono ou púlpito, mandato ou cátedra - que se ocupa, mas de uma relação amorosa que se estabelece.
*Chico Alencar é professor e doutor em História e Deputado Federal pelo PSOL do Rio de Janeiro
Eis o texto.
“Conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem” (Jo 10,14)
A liturgia do quarto domingo de Páscoa sempre celebra a imagem do Ressuscitado como “Bom Pastor”.
Terminados os relatos de Aparições do Ressuscitado, continuamos com textos pascais que nos falam de “dar a Vida”; a experiência pascal é que Jesus nos comunica Vida. Nós temos a possibilidade de fazer nossa essa Vida; trata-se da Vida mesma de Deus, que é a chave do tempo pascal. João não nos fala de uma vida para o mais além, mas de uma Vida que deve ser vivida como ressuscitada, aqui e agora.
Para a grande maioria de nossos contemporâneos, a imagem do “pastor” se revela anacrônica, provocando alergia em muitos. Em primeiro lugar, porque nos encontramos muito distantes daquela cultura agrícola e pecuarista na qual nasceu esta imagem; por outro, porque resistimos às imagens que se movem em chave de poder/submissão e que arrastam, com frequência, uma história de dominação.
Concretamente, a imagem do pastor evoca, por si mesma, a da “ovelha” e do “rebanho”. E o contraste entre ambas faz aflorar na consciência de muitos a contraposição entre autoritarismo, por um lado, e submissão e alienação, por outro. Sem dúvida, a imagem do “pastor”, bem como a do guru ou do mestre, muitas vezes serve de pretexto para justificar abusos de diversos tipos, todos eles baseados no “poder religioso” que aquelas mesmas imagens conferem.
Não é “pastor” quem procura domesticar, manipular e dominar as “ovelhas”, mas quem “conhece pessoas”. Biblicamente falando, “conhecer” é criar relações de amor entre pessoas, no sentido amplo; assim se diz que homem e mulher se “conhecem” quando se amam; assim se “conhecem” filhos e pais, amigos, companheiros... O bom pastor não só “conhece” as ovelhas, mas também “é conhecido” por elas.
4º domingo da Páscoa – Ano B – O Bom Pastor e seu chamado ao cuidado das pessoas mais frágeis
"Em várias ocasiões, o Papa Francisco exortou os sacerdotes, e continua exortando a todas as pessoas que são líderes nas comunidades cristãs, a serem "pastores com cheiro de ovelha" e não com cheiro de sacristia ou de flores de altar. E alertou que essas ovelhas as encontramos nas periferias existenciais e também geográficas das nossas cidades e comunidades."
A reflexão é de Alzira Munhoz, religiosa da Congregação das Irmãs Catequistas Franciscanas. Ela possui graduação em Filosofia e especialização em Comunicação Social e Pastoral, é mestre e doutora em Teologia Sistemática. Trabalhou como professora de cursos de graduação e pós-graduação na Faculdade de Teologia de Santo Tomás de Aquino, de Belo Horizonte/MG, e na Faculdade de Filosofia e Teologia (ITEPA) de Passo Fundo/RS. Atualmente participa do Núcleo Mujeres y Teología, de Guatemala, e trabalha como professora de Teologia no Instituto Americano de Ciências Religiosas, na Universidade Rafael Landívar, na Conferência das Religiosas e Religiosos de Guatemala (CONFREGUA), e na Paróquia Nossa Senhora dos Anjos.
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