Escutando professoras e professores,
amigos dedicados à educação,
decidi fazer essa homenagem
ao dia do professor.
Observando alunos e alunas,
pensando em meu neto e minha neta,
ofereço essas palavras como atitude,
disposição,
luta e aliança.
Uma crônica e um poema em dez atos.
Se possível, leiam em uma tacada só,
palavras e lutas
se combinam e se entrelaçam.
Célio Turino
Escola fardada, ideologia
ou negócio?
Escola fardada,
ideologia ou negócio? Os dois.
A ideologia
alavanca os negócios, e a negociata alavanca a ideologia. O objetivo é duplo,
submeter a sociedade a uma ideologia e ganhar dinheiro; a ideologia para
alavancar poder e o poder para amealhar dinheiro.
A história
ensina. Toda dominação e opressão, mundo afora, é precedida pelo medo e a
mentira desde o início das civilizações ao final do neolítico. É do início das
civilizações, agricultores assustados, com medo de terem a colheita roubada
após meses de trabalho, resolveram criar uma guarda para proteger suas
plantações. Com isso deslocaram alguns dos seus, liberando-os do trabalho no
arado, preparo da terra, cultivo e colheita, para serem guardas e guerreiros a
vigiar a lavoura. Supunham que agindo assim impediriam o roubo por outras
tribos e povos.
Com o tempo, aqueles
que deveriam servir como guardas a darem segurança para a coletividade,
passaram a servir-se de suas comunidades. O que antes era uma retribuição em
alimentos, virou imposto (de imposição). Os guerreiros, que supostamente
deveriam proteger suas tribos, criaram os tributos (do latim Tributum,
“repartir na tribo”). Foi como surgiu o primeiro imposto do mundo, utilizado
para pagar a guarda e os chefes da guarda, que ganhavam mais. Está na história,
aprendamos com ela.
Com a atual
proposta das Escolas Cívico-Militares o procedimento é semelhante de quando a
guarda cobrava tributos daqueles agricultores com as mãos calejadas e costas
arcadas. Cria-se o medo e a cizânia para depois vender soluções falsas. Assim
começam o aprisionamento, a exploração e as opressões. Como naquela época, não
protegem do inimigo, eles são o inimigo.
Observemos a
história recente do país.
Primeiro, o discurso
de ódio, o desrespeito contra professores e escolas, a cantilena da “escola sem
partido”, quando, na verdade, queriam doutrinar sob a ordem militar. Depois, o “papo”
de disciplina, hierarquia, respeito (como aconteceu com o “papo” de proteger a
plantação dos roubos das outras tribos). Pareceu até bom, não é? Aos
agricultores que deixaram-se escravizar pelos irmãos, pareceu que sim.
Passada a fase
dos ataques de artilharia ideológica com bombas de cizânia e descrédito, vieram
com a “solução” das Escolas Cívico-Militares. Comparem com o que houve com os
agricultores ao final da pré-história. Com o coturno nas Escolas começam a domar
o pensamento livre e a mandar na aula; além do bônus de “dinheirinho” extra,
bom dinheiro, por sinal. Pode-se chamar de “guarda da plantação” ou
“disciplinador da educação”, o termo que for, esse tipo de esperteza há de
sempre, pronto para dar o bote. Prevalece impondo o
medo, fazendo o povo baixar a cabeça e obedecer sem perguntar, e assim pagar o Tributum
sem reclamar.
Pesquisem,
estudem, está na história. Só muda o nome do “esperto”: guerreiro, faraó,
imperador, senhor feudal, burguês, milico, fascista, bufão... No fundo,
mandriões que se travestem de vendedores de ilusões, ora se impondo pela força,
ora pela engambelação. É o que começa a acontecer quando se mete farda no pátio
das escolas. Ordem unida no lugar de educação, ameaças no lugar de debate, dogmas
no lugar de ideia... Dá para compreender o que está para acontecer?
Essa gente não
entende da arte de educar, como não entendia do ofício de plantar. Em seu
modelo de disciplina escolar querem tratar o aluno como se fosse recruta,
estudantes como infantes da obediência e da servidão.
Sabem a origem
da palavra Infantaria?
Infante,
criança. Os meninos eram colocados na frente dos pelotões, usados como “bucha
de canhão” nas batalhas, abrindo caminho para a cavalaria montada. Os
“valentes” colocavam as crianças para morrerem na frente, só depois é que
atacavam. Com o sangue das crianças foi feita a glória dos chefes militares. Do
exército de Xerxes aos centuriões de Roma.
Dizem que
Escola Cívico-Militar é para colocar ordem, acabar com a bagunça. Mas a
intenção é outra, querem mesmo é domar a cabeça do povo antes que os jovens
aprendam a pensar por suas cabeças. Escola Cívico-Militar é um novo jeito que
se inventou para tirar dinheiro da educação; como na época dos agricultores
assustados, de há cinco mil anos atrás. E não é pouco dinheiro.
Quando um
militar reformado vai trabalhar numa Escola Cívico-Militar, ele dobra os
vencimentos, recebe um complemento salarial em valor superior ao salário do
professor, além da aposentadoria que já recebe. Isso sem qualificação
pedagógica alguma, sem qualquer preparo para trabalhar em escola. Honestamente,
reflitam. É justo, faz sentido?
Esse é o
dinheiro que falta para a manutenção da Escolas, aparelhamento de Laboratórios
de Ciências, aquisição de livros, contratação de bibliotecárias, psicólogas e
assistentes sociais, dinheiro que falta para melhorar a merenda, o salário dos
professores. Ao invés de policiais darem proteção no entorno das escolas, nas
ruas do bairro, beneficiando toda comunidade, deram um jeito de pular muro
adentro para trabalhar como Bedel.
Muro adentro, calam
com os olhos e fazem crianças e jovens (e os pais) acreditarem que vida boa é de
quartel, não de escola. Doutrinam para que a comunidade escolar tenha medo até
do próprio pensamento. Assim que se perde uma geração. Assim se perde uma
nação. Quem se deixou engambelar pela “conversa” de disciplina militar nas
escolas um dia vai se dar conta do mal que produziu na vida de seus filhos e do
país. Que esse dia não seja tarde demais.
Aos poucos, a Escola
Cívico-Militar está virando um grande negócio a subtrair verbas da educação. Além
do complemento na aposentadoria dos policiais militares designados para as
escolas, outros, em negócio que vai passando despercebido, vendem consultoria
para implantação e acompanhamento das Escolas Cívico-Militar. Cobram por
Escola, e não é pouco.
São muitas as
empresas de consultoria cívico-militar para escolas, criadas por militares da
reserva; esses, de alta patente, porque o chão da escola é para cabos e
sargentos. Daí vão expugnando escola a escola, prefeitura a prefeitura, governo
estadual a governo estadual, até mesmo em estabelecimentos privados de ensino.
Bem na tática militar de ocupação do território, palmo a palmo.
Entre 2020 e
2022, segundo dados do Sistema Integrado de Orçamento e Planejamento (SIOP), o
Ministério da Educação gastou R$ 94 milhões em gestão cívico-militar para
apenas 216 unidades escolares no país; afora o gasto de prefeituras e governos
estaduais. Percebam, não é o custo total de manutenção da atividade escolar,
mas apenas a parte correspondente às despesas militares nessas unidades.
Dinheiro subtraído da atividade de ensino. Com esse recurso daria para realizar
muita coisa boa nas escolas; vocês não acham?
Por isso tentam
vencer na gritaria, no medo e no lobby. Sabem que o Negócio de Escola
Cívico-Militar é inconstitucional. Ele fere a LDB, Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (Lei 9.394/96). No rol de despesas e investimentos previstos pela LDB
não cabe despesa militar. Em São Paulo a Justiça suspendeu lei do governo do
estado que instituía programa de Escolas Cívico-Militares por conta disso. O
sindicato dos professores da rede estadual de ensino, a APEOESP, entrou com
Ação Direta de Constitucionalidade (Adin 7662) e teve o recurso acatado pelo
Tribunal de Justiça.
A Constituição
Brasileira não prevê que militares possam exercer funções de ensino ou apoio
escolar. O que está acontecendo com a implantação inconstitucional das Escolas
Cívico-Militares não se trata da coexistência de dois modelos, cabendo aos
militares “apenas” o regramento da disciplina das escolas, mas sim a gradual
substituição de profissionais da educação. Educadores que devem prestar
concurso público e passar pela análise de formação e títulos acadêmicos, não
para policiais militares reformados, despreparados para a função e, pior,
selecionados “a dedo”, sem qualquer critério transparente ou de competência.
Não há amparo constitucional, nem formação pedagógica para Policial-Bedel,
muito menos concurso, o que está acontecendo é desvio de função e falta de
efetividade comprovada.
Tenham certeza,
o estrago que estão produzindo será grande, agora e no futuro. Assim como foi negativo
o impacto do golpe cívico-militar de 1964 na educação brasileira. Quem ama o
Brasil, sua família, seus filhos, quem ama a educação, não compactua com o
“golpe” das Escolas Cívico-Militares. Por isso essa crônica como alerta e
homenagem às professoras e professores do Brasil. Um chamado à luta em forma de
poema, estilhaçando o verso e métrica pelo Verbo-Professor.
Verbo-Professor
(poema em dez atos)
Ato 1
Ato,
Do latim
Aptus,
Movimento,
Ação,
Atitude,
Atuação.
Movimento
Em forma de
poema,
Como faca
cortando o vento,
Impulso que
rasga o ar,
Boca que
grita,
Mão que não
espera,
Pé que pisa o
chão,
Corpo que
não pede licença,
Pulso que
pulsa
Até abrir a
pedra.
Ação,
Verbo que
explode no peito,
Corpos em
luta,
Força que empurra o mundo,
Pensamento que ferve,
Resistência em carne.
Atitude
Na dança das
horas e dos dias,
O Ato não se
dobra ao medo,
Carrega a
história,
Faz e refaz.
Escreve,
Risca e
Grava
O suor da
persistência.
Atuação,
Vontade que
não se cansa,
Sangue
quente da rebeldia,
Semente no
vento.
É luta,
É sonho,
É resistência,
Ato 2
Ação de Educar,
Diálogo.
Educar sem
diálogo vira pedra.
Educar
Não é afogar
Sob palavras
de comando.
Educar é
desafogar,
Colocar
pessoas em ação.
Movimento
Rumo ao
horizonte,
À utopia.
Educar é
fazer sonhar,
Ensinar a
caminhar.
Educar é
atitude.
Caminhar ao
horizonte,
Colocar as pessoas
Em movimento.
Caminho que
se faz ao caminhar
Rumo ao
horizonte
Que se
afasta
A cada novo
passo.
Educar é
ensinar as pessoas a caminhar,
Isso é
educar!
Apontar sentidos,
Horizontes
largos,
Tornar o que
está distante,
Próximo.
Caminhar
Até
encontrar:
O sonho,
A liberdade,
O futuro,
A bondade,
A
curiosidade,
A sabedoria
E a coragem.
Isso é
educar!
Educar é
promover diversidade,
Aceitar as
tranças em modelo afro,
Os cabelos
coloridos...
Lindos!
O jeito
descontraído de ser adolescente,
O riso leve
da criança.
Educar não é
marcha militar,
É caminhar
sem medo,
É acolher
O diverso
E promover a
convergência.
Educar é um
ato de coragem
E amor.
Ato 3
Educar é
diferente
Do que se
prega nos quarteis.
Não é o
olhar frio e cortante,
Fazendo a palma
da mão
Se fechar.
Não é
Ordem unida,
Marcha
constante,
Isso não é
educar.
Educar é
Animar,
Se divertir
com o riso solto,
Leve,
Desajeitado.
É
Recreio nas
escolas,
Acolhimento,
Prazer em
aprender,
Descobrir.
Não é
Sufocar
Sob o grito
de "ordem",
Enrijecer soldados
de chumbo,
Moldar marionetes
da obediência.
Não é marcha
Com passos
alinhados,
pensamentos
podados
e alma fardada.
Educar é sabedoria.
Estudantes
são rio,
E suas águas
jamais são as mesmas.
Puro movimento,
Fluido
Como água.
Educar
Não é
Pregar o
terror,
As ameaças,
O assédio
De quem
vigia o aluno e o professor.
Não!
Definitivamente,
não!
Educar não é
colocar viseira,
Nem marcha
de quartel.
Educar não
se faz com Escola Cívico-Militar,
Se querem
educar,
Aprendam a
educar,
Mudem de
profissão,
Cursem
universidade,
Aprendam a
ensinar,
Façam
magistério,
Comecem de
novo.
Suas ordens
e disciplina são assédio,
A elas
dizemos:
Escola não é
quartel!
Aprender não
rima com ordem militar.
Escola
Cívico-Militar não cabe na Constituição,
Na lei
9.394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
A violência
de vocês
Não nos
intimida,
À violência
de vocês, respondemos:
Escola não é
quartel!
Voltem para
a caserna,
Deixem
nossos alunos em paz!
Ato 4
Nós não temos
medo de vocês!
A vida das
professoras e professores do Brasil
É difícil,
dura,
Mas feita
com muito esmero.
Somos gente
dedicada
Que ama a
arte de educar.
Nós não
temos medo de vocês!
Apesar de
tantas mentiras,
Tantas
manipulações,
Tantos
descasos e desrespeitos,
Seguimos
aqui.
Há
esperança.
Há esperança
porque estamos aqui,
Sempre
estivemos e estaremos aqui.
Era uma vez nas
escolas.
Esse tempo
houve,
Esse tempo
existe,
O tempo de
ensinar
Com amor,
ciência e coragem.
Nós,
Apesar de todas
as dificuldades,
Professoras
e professores do Brasil,
Sentamo-nos à
mesa e falamos de mundos e sonhos.
A voz de
Paulo Freire ecoa:
“Educar é um
ato de amor!”
É a nossa
missão
Para salvar
o nosso tempo
Da
destruição.
Não é fácil,
Sabemos,
Não era
fácil,
Nunca será
fácil.
Por isso
seguimos aqui
E não temos
medo de vocês.
Escola não é
quartel!
Não
desistimos,
Sempre
estaremos nas Escolas.
Somos educadoras
e educadores do Brasil!
Tanta dureza,
Tanta descontinuidade,
Tanto descaso
de quem governa
(também de
quem elege os governos e representantes,
revelando
descaso no ato de eleger).
Apesar de:
Carreira
desrespeitada,
Precarizada,
Baixos
salários,
Bibliotecas
com livros desatualizados,
Falta de
laboratórios
(e quando
há, falta de laboratórios bem equipados),
Escolas mal
conservadas...
Seguimos
firmes
E dizemos:
Escola não é
quartel!
Falta muita
coisa,
Até água em
banheiro falta.
Falta:
Segurança no
entorno da Escola,
Funcionários,
Manutenção,
Professores com
estabilidade na unidade de ensino,
Psicólogas e
Assistentes sociais...
Falta muita
coisa:
Cultura e artes,
Esporte...
Falta tanta
coisa,
Até papel
higiênico falta.
Só não nos
falta coragem.
Por isso
dizemos em alto e bom som:
Escola não é
quartel!
Nós não
temos medo de vocês!
Sabemos da
maneira sórdida com que vocês agem,
Cheia de
mentiras,
Manipulações
e
Desrespeitos.
Vocês não
nos enganam,
Não vamos
nos intimidar.
Escola não é
quartel!
Ato 5
Para
descredibilizar o ato de educar,
Disseram que
a Escola era ideológica,
Com partido,
Doutrinadora.
Atacaram
A vida
escolar
E a
pluralidade.
Cheios de
mentiras,
Vieram com a
“Escola sem Partido”,
No fundo, a
mais partidária de todas as Escolas,
A Escola que
quer dominar.
Sob o nome
“sem partido”,
Partidarizaram,
Ofendem,
Agridem.
Atacam a liberdade
de cátedra,
O pluralismo
de ideias.
Produzem
Cizânia,
Delações,
Intimidações,
Terror.
Induzem
Alunos e
pais a afrontarem professores,
Filmarem e
agredirem os mestres.
Que coisa
feia!
Triste.
Deturpam
tudo com as maldades.
Agem para
Doutrinar,
Desunir,
Dominar.
Depois...
Depois vêm
com a farda,
Fazem a
Escola se encher de comandos
Até que os alunos
obedeçam sem questionar.
Depois...
A Escola
ficará vazia,
Triste,
Em silêncio.
“-Aqui não
se pensa! - Aqui se marcha!”
É a ordem da
instrução fardada.
Livros,
antes abertos,
Agora
censurados.
Alunos
cheios de vida,
Agora
armados de medo.
“-Aqui não
se pensa! - Aqui se marcha!”
E impõem
novas lições:
“- Não
pergunte, não duvide, não pense!”
Nós,
Mestras e
mestres do Brasil,
Estamos aqui
e não nos intimidaremos.
Escola não é
lugar para impor o medo.
Educação não
se faz com marcha,
Educação se
faz com pensamento,
Generosidade,
Coragem.
Vocês não
nos metem medo,
Nem vão
controlar o pensamento.
Basta!
Deixem
nossos alunos em paz!
Tirem as
botas de nossas Escolas!
Nós não
permitiremos que vocês arrombem
Os portões de
nossas Escolas.
Escola não é
quartel!
Parem de
pisar em nossos jardins!
Pátio
escolar é para Recreio
Encontro
entre alunos.
Não
permitiremos que vocês arranquem as flores de nossos jardins!
Nem a voz de
nossas gargantas.
Ato 6
Sob o
disfarce da disciplina e da ordem,
A Escola
Cívico-Militar só produz
Desordem,
Assédio,
Intimidação.
Pela força
bruta tentam arrancar o lápis,
Apagar a
memória,
A liberdade.
Mas nós
seguimos aqui, e resistimos.
Nossas mentes
subsistem,
Nossas mãos ensinam
a segurar o lápis,
Nossas
perguntas são o primeiro passo
De quem
ensina e questionar.
Quem
pergunta, aprende.
Quem segura
o lápis, escreve a história.
Quem
resiste, vence
Ensinamos
nossos alunos a segurar o lápis,
Não o fuzil.
Nós somos professoras
e professores do Brasil!
Não vamos
esconder a história nos armários.
Escola
Cívico-Militar é a escola
Do fascismo
Que mora nas
mentes degeneradas,
Se impõe
pelo medo,
Por mentiras
e
Imposturas.
Nós não
temos medo de vocês!
O lápis vai
vencer o fuzil.
Nós estamos
aqui e resistimos em Ato.
Não nos
calaremos!
Somos
professores e professoras do Brasil,
Não vamos
aceitar
O velho
monstro
Vestido de
novo.
Pelas mentes
caladas se impõe a dominação.
Quem fala de
vida vira alvo?
Falaremos de
vida.
Na sala da
infância,
onde o riso é livre,
o baque seco
da bota polida
surge para
abafar o riso.
Farda,
farda, farda!
Na lousa
querem impor
Só a sombra
do giz.
E o sonho, coitado,
se esconde no canto.
– Atenção!
Alinhem-se!
A voz fardada manda,
Apagar o
futuro
E o presente
vira fileira reta.
Mas cadê o
menino solto,
o brilho no olho,
cadê o livro aberto
que ensina a pensar?
Nós estamos
aqui
Abrimos os
braços
A esses
meninos e meninas.
Resistimos.
Vocês não
vão impor o medo travestido de ordem e disciplina,
Sabemos das
maldades degeneradas que pretendem ordenar.
O fascismo
caminha no passo marcado,
na espreita da ordem sem alma.
Oh, meu
Brasil,
deixa a escola voar!
Não ponha corrente
no pensamento,
não prenda a palavra
no quartel do silêncio.
O perigo é a ideia calada
no peito da gente
que um dia foi livre
e esqueceu de sonhar.
Oh, meu
Brasil,
Deixa a
escola voar!
O futuro
mora nas ladeiras do passado,
Vamos
escutar a história,
Lembranças
do tempo da lança
Que não
conhece a covardia.
Lembranças de vida e de amor.
Oh, meu
Brasil,
Deixa a
escola voar!
Ato 7
Ei,
você aí,
soldado fantasiado de professor,
para que essa farda?
Para que esse grito duro
no pátio onde deveria ecoar
a palavra viva?
Transformar a escola
num quartel,
numa linha reta,
onde os corpos das crianças
aprendem a marchar
em vez de sonhar.
Não pode!
Aqui não se afia ordem unida,
Se afia sonhos, ideias, pensamentos.
Sonhos, ideias e pensamentos,
Não cabem em fardas.
Farda no corpo é prisão no peito.
Sonho que fenece,
Pensamento sem futuro.
Não ensinamos a temer,
A calar,
A ser só mais um
Neste exército do cumprimento de ordens.
Nós somos os que gritam,
Os que rasgam essa farsa.
Nós ensinamos a voar
Em revoada.
Voem!
A caminhar de braços dados
Rumo ao horizonte,
Que fica logo ali.
Caminhem!
Mesmo que logo ali seja tão
distante,
Caminhem,
Mesmo que o horizonte se afaste.
Caminhar e voar, é o que
ensinamos,
Isso não ensina o militar.
Juntando mãos com mãos
O futuro
Corre, pula, explode
em mil cores.
Não há muro,
Não há grade
Que detenha mãos com mãos.
Escola soldada,
Calada,
Escola do temor,
Da ordem unida,
Do individualismo,
Da ganância,
Da delação e desconfiança,
Do “um contra todos”
Do “todos contra um”.
Dessa Escola não se avista o
horizonte.
Nem nasce o amanhã.
Tirem suas botas do chão das
escolas!
Aqui é terra de sonho,
E sonho não se pisa com coturno.
Sonho não se submete.
Ato 8
Não é fácil
enfrentar
Tanto
desrespeito,
Tanta
agressão.
Mas nós
estamos aqui,
Nas Escolas.
Não
desistimos.
Nós somos professoras
e professores do Brasil!
Magistério,
carreira
nobre,
Vocacionada
E
desrespeitada
Agredida,
acuada...
Ainda assim,
Lindamente
talhada
Na coragem,
Na dedicação.
Seguimos o
chamado,
Estamos aqui
por vocação.
Nós somos
professoras e professores do Brasil!
Magistério
É para
aquelas e aqueles
Que voam sem
medo.
Por isso dizemos em alto e bom som:
Escola não é
quartel!
E repetimos:
Escola não é
quartel!
Nós não
temos medo de vocês!
Anunciamos
agora e sempre:
Não
permitiremos
Que nos
pátios das escolas
Se imponha a
disciplina falsa,
A ordem vazia,
O medo.
Não
permitiremos
O civismo de
fanfarronice,
O
patriotismo entreguista,
Falso, vazio
de sentido.
Nosso
civismo,
O civismo
das professoras e professores do Brasil,
Zela pelo
bem comum,
Se dedica ao
próximo
Com fidelidade
à vida coletiva,
Ama a pátria
e a mátria,
Vai à raiz,
É ancestral.
É visceral.
Nosso
civismo
É
harmonioso,
Respeitoso,
Ubuntu!
Não se
impõe,
Se comparte,
Tekoá Porã!
Voa ao
futuro com os olhos no passado,
Sankofa!
Educamos
para a Cultura Viva e o Bem Viver.
A beleza
salvará o mundo
Escreveu
Dostoiévski
A vida tem
que ser
Bela, boa e
justa para todo mundo.
Só é belo o
que é verdadeiro,
Só é bom o
que é real,
Só é justo o
que vem da alma,
Com ciência,
Consciência,
Verdade,
bondade e justiça,
É o que
ensinamos.
A beleza
salvará o mundo!
Ato 9
Escola não
combina com assédio,
Ameaças,
Doutrinação
pelo medo,
Ignorância e
agressões.
Nosso
civismo é civilista,
Não
militarista.
Nós ensinamos
Igualdade,
Liberdade.
Fraternidade,
SO-LI-DA-RI-E-DA-DE.
Não odiamos
O povo
livre,
Como vocês
odeiam
E temem.
Não
manipulamos
Corações e
mentes
Como vocês pretendem
manipular.
Não impomos
O domínio
Do medo
Social,
Teológico,
Politico,
Econômico.
Nosso
civismo é civilista!
Nosso
civismo é o civismo do povo
Brasileiro,
Sofrido,
Desrespeitado,
Ofendido,
Humilhado...
Ainda assim,
Solidário,
Alegre,
Vivendo na
base da pirâmide social
De um país
Tão
desigual.
Nosso
civismo não se impõe,
Se educa.
Escola é
lugar de educação, jamais de destruição,
Escola é
lugar de amor, jamais de ordem vazia.
Escola é
lugar de sensibilidade,
Conhecimento,
Equipe.
Escola não
rima com quartel,
Educação não
rima com tacão.
Escutem!
Policiais
Militares
Não são preparados
para serem
Bedel de
crianças e adolescentes.
Escola é
para educar, não para obrigar o silêncio.
Escola é
para aprender, não para a disciplina vazia.
Educar não é
impor ignorância.
Educar não
são bravatas de quartel.
Não é ordem
unida na colina.
Educar é
buscar sabedoria,
No lugar da
redundância
A teoria.
Escola é para
educar!
Educar!!!
Escutem!
São tantas
as notícias de assédio
Nas Escolas
Cívico-Militares,
Tantas e tão
feias
Que não
cabem em um poema.
Não cabem!
Ainda assim,
falaremos de algumas,
Já
divulgadas em jornal,
Não nos
calaremos!
Parem!
Deixem
nossas alunas em paz,
São meninas,
doze, treze anos.
Parem de
assediar!
Cobiçar,
Oferecer
presentes e dinheiro
Em troca de
favores,
Um toque
erotizado,
Um olhar
lascivo,
Ou coisa
pior.
Deixem
nossas alunas em paz!
Parem de
assediar nossos alunos!
São meninos.
Numa Escola
Cívico-Militar,
Milicos fazendo
vez de Bedel,
Se divertiam
ao assistir briga entre alunos
No portão da
escola;
Ao final,
Tiro ao
alto,
Que não se
sabe de onde veio.
Só se sabe
Que aqueles
que deveriam proteger
Se riam da
cena triste
Como em um deboche.
Noutra,
Um
policial-bedel
Ameaçou um
aluno com a seguinte frase:
“- Já matei
muitos, um estudante a mais não fará diferença!”
Deixem
nossos alunos em paz!
São meninos.
Deixem nossas
alunas e alunos em paz!
São meninas
e meninos.
Das escolas
que viraram quartel
As notícias
chegam a cada dia.
Tantas e tão
feias
Que não
cabem em um poema.
Deixem nossas
alunas e alunos em paz!
Pais!
Não se
deixem enganar,
Sob o manto
da hipocrisia,
De palavras
de ordem e disciplina,
Estão
assediando seus filhos.
Nós somos
professoras e professores do Brasil,
Não vamos
deixar o sonho morrer
Sob
coturnos.
Sonhos não cabem
nos quartéis da mente.
Pássaros ensinados
A voar alto,
Vão voltar a
voar.
Nosso ofício
é abrir gaiolas.
Nós vamos
abrir as gaiolas!
Estamos
avisando.
Somos Educadores
por vocação,
Não mantemos
pássaros enclausurados
sem que saibam que têm asas.
Nós vamos
abrir as gaiolas!!!
Ato 10
O futuro
Se constrói com perguntas,
Dúvidas e erros,
assim se aprende.
O futuro
Não se
constrói com regras duras,
Certezas
cegas e paredes invisíveis.
“Educar é um
ato de amor”,
Ensinou
Paulo Freire,
Nosso mestre
tão amado.
Repetimos as
palavras
Do grande
educador brasileiro,
Respeitado
em todo mundo,
Porém,
Amaldiçoado
por uns tantos por aqui,
Gente estúpida,
Covarde,
Ignorante,
Que nunca
leu uma única linha do pensamento do mestre.
Pelas
Escolas de Esparta
Só podem
surgir soldados
Prontos para
morrer e viver sem razão.
Nossos
alunos não serão soldados de Esparta!
Não
permitiremos
Que brotem gerações
de olhos sem brilho
e corações
mudos.
Nosso
compromisso é:
Cultivar esperança.
Sabedoria,
Ciência,
Filosofia,
Respeito ao
próximo,
Compaixão,
Solidariedade.
Cultivamos amor;
Amor!!!
O amor não vai
perder lugar,
Nem na lousa,
nem no pátio de Escola,
Nem
intramuros, nem além muros.
Se não
fizermos nada,
Quem pagará
o preço?
Os jovens de agora,
Assediados,
Formatados,
Brutalizados,
Apagados.
Não vamos
abandoná-los!
Estamos
avisando.
Educamos jovens
E crianças
Para que suas
asas
lhes permitam
voar sem medo.
Voar
Com ciência,
Humanismo,
Disciplina
no estudo,
Arte,
Esporte,
Matemática,
História,
Geografia,
Literatura
E linguagens.
Por isso educamos,
Por eles
lutamos!
Por eles,
por nós,
Resistimos.
E gritamos
em alto e bom som:
Escola não é
quartel!
Escolhemos a
palavra que ensina,
Mas se só
nos ouvirem no grito,
Saberemos
gritar.
Nós somos professoras
e professores
E não temos
medo de vocês.
Escola não é
quartel!
Nosso verbo
é o Verbo-Professor
Célio Turino – Historiador, escritor. Doutor
em Humanidades pela Universidade de São Paulo, caminha por aí semeando as
ideias da Cultura Viva e do Bem Viver.
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