CANTA FRANCISCO
Pe. Antonio Passos
Nos olhos dos pobres, no rosto do mundo
Eu vejo Francisco perdido de amor
É índio, operário, é negro, é latino
Jovem, mulher, lavrador e menor
Há um tempo só de paixão, grito e ternura
Clamando as mudanças que o povo espera
Justiça aos pequenos, ordem do evangelho
Reconstrói a igreja na paixão do pobre.
Há crianças nuas nesta paz armada
Há Francisco povo sendo perseguido
Há jovens marcados sem teto nem sonhos
Há um continente sendo oprimido
Com as mãos vazias solidariedade
Com os que não temem perder nada mais
Defendem com a morte a dignidade
Com a teimosia que constrói a paz.
Refrão: Canta Francisco, com a voz dos pobres
Tudo que atreveste a mudar
Canta novo sonho, sonho de esperança
Que a liberdade vai chegar
Canta Francisco, com a voz dos pobres
Tudo o que atreveste a mudar
Canta novo sonho, sonho de menino
Novo céu e terra vai chegar.
Há Claras, Franciscos marginalizados
Cantando da América a libertação
Meninos sem lares são irmãos do mundo
Pela paz na terra sofrem parto e cruz.
Francisco imagem de um Deus feito pobre
Denúncia esperança profecia e canta
Vence com coragem o império da morte
De braços com a vida em missão na história
Francisco menino e homem das dores
Reconstrói a igreja pelo mundo afora
Na fraternidade que traz a justiça
Na revolução que anuncia a aurora
Refrão: Canta Francisco, com a voz dos pobres
Tudo que atreveste a mudar
Canta novo sonho, sonho de esperança
Que a liberdade vai chegar
Canta Francisco, com a voz dos pobres
Tudo o que atreveste a mudar
Canta novo sonho, sonho de menino
Novo céu e terra vai chegar.
Ouça/Assista AQUI
Papa Chico.
Roberto Malvezzi (Gogó)
Há uma sequência
formidável de sinais na Igreja Católica nos últimos dias. A renúncia de
Bento XVI, agora a eleição do primeiro Papa latino-americano, argentino,
jesuíta. Para reforçar o emblema, escolhe o nome de Francisco.
O cardeal Bergoglio celebrou uma missa em um encontro promovido pelo Conselho Episcopal latino-americano sobre
a temática “Espiritualidades dos povos latino-americanos”, há uns dois
ou três anos atrás., em Buenos Aires. Éramos umas 60 pessoas, de todo o
continente.
A sua celebração
chamava a atenção, sobretudo, pela situação frágil que demonstrava. Ao
final perguntei a um amigo da Argentina, que é padre e climatologista,
professor da Universidade Católica de Buenos Aires: ele parece falar com
dificuldade?
O padre respondeu: ele só tem um pulmão.
A homilia que ele nos
fez não tinha referência alguma com a temática do encontro, tanto é que
não me recordo de nenhuma palavra que tenha dito.
Diz a mídia que ele
vive simples, cozinha sua comida, anda em transporte público, lavou os
pés dos aidéticos. Outros enfatizam sua posição conservadora em termos
de sexualidade. Mas, aí, nenhuma surpresa.
Incômodas são as
acusações de comunhão com a ditadura militar na Argentina. Nos encontros
do CELAM é possível perceber, com exceções raras, um episcopado
realmente distante do povo. E os próprios argentinos
confirmam que, exceto uma meia dúzia de bispos, essa é a realidade. Mas,
o bispo que presidia nossa Comissão era um argentino, Monsenhor Lozano,
de uma diocese argentina que está frente àquela papeleira que os
uruguaios queriam construir e poluir o Rio da Prata. Lozano estava à
frente da resistência. Portanto, em qualquer igreja pode haver pessoas sensíveis à realidade do povo.
Em todo caso, a escolha
do nome Francisco tem um sinal. É provável que busque um papado simples
e simplificado. Entretanto, as boas intenções não resolvem sozinhas os
problemas do Vaticano. Como será um homem simples em meio a uma máquina
milenar, capaz de moer até um Bento XVI?
Vamos ficar com o que
há de melhor nesse momento: vem de fora da Europa, faz sua comida, anda
de ônibus e agora se chama Francisco. E Francisco quer dizer
simplicidade, ternura, fraternidade, solidariedade com os pobres,
irmanação com a natureza.
Para nós, aqui do Velho Chico, tudo que vem de Francisco inspira esse espírito.
Então, para começarmos, está de bom tamanho “Papa Chico”.
Nas redes sociais havia anunciado que o futuro Papa iria se chamar Francisco. E não me enganei. Por que Francisco? Porque São Francisco começou sua conversão ao ouvir o Crucifixo da capelinha de São Damião lhe dizer:”Francisco, vai e restaura a minha casa; olhe que ela está em ruinas”(S.Boaventura, Legenda Maior II,1).
Francisco tomou ao pé da letra estas palavras e reconstruíu a igrejinha da Porciúncula que existe ainda em Assis dentro de uma imensa catedral. Depois entendeu que se tratava de algo espiritual: restaurar a “Igreja que Cristo resgatara com seu sangue”(op.cit). Foi então que começou seu movimento de renovação da Igreja que era presidida pelo Papa mais poderoso da história, Inocêncio III. Começou morando com os hansenianos e de braço com um deles ia pelos caminhos pregando o evangelho em língua popular e não em latim.
É bom que se saiba que Francisco nunca foi padre mas apenas leigo. Só no final da vida, quando os Papas proibiram que os leigos pregassem, aceitou ser diácono à condição de não receber nenhuma remuneração pelo cargo.
Por que o Card. Jorge Mario Bergoglio escolheu o nome de Francisco? A meu ver foi exatamente porque se deu conta de que a Igreja, está em ruinas pela desmoralização dos vários escândalos que atingiram o que ela tinha de mais precioso: a moralidade e a credibilidade.
Francisco não é um nome. É um projeto de Igreja, pobre, simples, evangélica e destituída de todo o poder. É uma Igreja que anda pelos caminhos, junto com os últimos; que cria as primeiras comunidades de irmãos que rezam o breviário debaixo de árvores junto com os passarinhos. É uma Igreja ecológica que chama a todos os seres com a doce palavra de “irmãos e irmãs”. Francisco se mostrou obediente à Igreja dos Papas e, ao mesmo tempo, seguiu seu próprio caminho com o evangelho da pobreza na mão. Escreveu o então teólogo Joseph Ratzinger: ”O não de Francisco àquele tipo de Igreja não poderia ser mais radical, é o que chamaríamos de protesto profético”(em Zeit Jesu, Herder 1970, 269). Ele não fala, simplesmente inaugura o novo.
Creio que o Papa Francisco tem em mente uma Igreja assim, fora dos palácios e dos símbolos do poder. Mostrou-o ao aparecer em público. Normalmente os Papas e Ratizinger principalmente punham sobre os ombros a mozeta aquela capinha, cheia de brocados e ouro que só os imperadores podiam usar. O Papa Francisco veio simplesmente vestido de branco e com a cruz de bispo. Três pontos são de ressaltar em sua fala e são de grande significação simbólica.
O primeiro: disse que quer “presidir na caridade”. Isso desde a Reforma e nos melhores teólogos do ecumenismo era cobrado. O Papa não deve presidir com como um monarca absoluto, revestido de poder sagrado como o prevê o direito canônico. Segundo Jesus, deve presidir no amor e fortalecer a fé dos irmãos e irmãs.
O segundo: deu centralidade ao Povo de Deus, tão realçada pelo Vaticano II e posta de lado pelos dois Papas anteriores em favor da Hierarquia. O Papa Francisco, humildemente, pede que o Povo de Deus reze por ele e o abençoe. Somente depois, ele abençoará o Povo de Deus. Isto significa: ele está ai para servir e não par ser servido. Pede que o ajudem a construir um caminho juntos. E clama por fraternidade para toda a humanidade onde os seres humanos não se reconhecem como irmãos e irmãs mas reféns dos mecanismos da economia.
Por fim, evitou toda a espetacularização da figura do Papa. Não estendeu os braços para saudar o povo. Ficou parado, imóvel, sério e sóbrio, diria, quase assustado. Apenas se via a figura branca que olhava com carinho para a multidão. Mas irradiava paz e confiança. Usou de humor falando sem uma retórica oficialista. Como um pastor fala aos seus fiéis.
Cabe por último ressaltar que é um Papa que vem do Grande Sul, onde estão os pobres da Terra e onde vivem 60% dos católicos. Com sua experiência de pastor, com uma nova visão das coisas, a partir de baixo, poderá reformar a Cúria, descentralizar a administração e conferir um rosto novo e crível à Igreja.
Leonardo Boff é autor de São Francisco de Assis: ternura e vigor, Vozes 1999.
A grave crise moral que atravessa todo o corpo institucional da Igreja fez com que o Conclave elegesse alguém que tenha autoridade e coragem para fazer profundas reformas na Cúria romana e presidir a Igreja na caridade e menos na autoridade jurídica, enfraquecendo as igrejas locais. Foi o que acenou o novo Papa Francisco em sua primeira fala. Se isso ocorrer ele será o Papa do terceiro milênio e abrirá uma nova “dinastia” de Papas vindos das periferias da cristandade.
A figura do Papa é talvez o maior símbolo do Sagrado no mundo Ocidental. As sociedades que pela secularização exilaram o Sagrado, a falta de líderes referenciais e a nostalgia da figura do pai como aquele que orienta, cria confiança e mostra caminhos, concentraram na figura do Papa estes ancestrais anseios que podiam ser lidos nos rostos dos fiéis na praça de São Pedro. Nesse espírito quebrou os protocolos, se sentiu gente do povo, pagando sua conta no lugar onde se hospedou, indo de simples carro para a Basílica Santa Maria Maior e conservando sua cruz de ferro.
Para os cristãos é irrenunciável o ministério de Pedro como aquele deve “confirmar os irmãos e as irmãs na fé” segundo o mandato do Mestre. Roma onde estão sepultado Pedro e Paulo, foi desde os primórdios, referência de unidade, de ortodoxia e de zelo pelas demais as igrejas. Esta perspectiva é acolhida também pelas demais igrejas não-católicas. A questão toda é a forma como se exerce tal função. O Papa Leão Magno (440-461), no vazio do poder imperial, teve que assumir a governança de Roma para enfrentar os hunos de Átila. Tomou o título de Papa e de Sumo Pontífice que eram do Imperador, incorporou o estilo imperial de poder, monárquico e centralizado com seus símbolos, as vestimentas e o estilo palaciano. Os textos atinentes a Pedro que em Jesus tinham um sentido de serviço e de amor, foram interpretados, no estilo romano, como estrito poder jurídico. Tudo culminou com Gregório VII que com o seu “Dictatus Papae”(a Ditadura do Papa) arrogou para si os dois poderes, o religioso e o secular. Surgiu a grande Instituição Total, obstáculo à liberdade dos cristãos e ao diálogo com o mundo moderno globalizado.
Esse exercício absolutista foi sempre questionado, especialmente, pelos Reformadores. Mas nunca foi amenizado. Como reconhecia João Paulo II, no seu documento sobre o ecumenismo: este estilo de exercer a função de Pedro é o maior obstáculo à unidade das Igreja e à aceitação por parte dos cristãos vindos do mundo democrático. Não basta a espetacularização da fé com grandes eventos para suprir tal deficiência.
A atual forma monárquica deverá ser repensada à luz daquela intenção de Jesus. Será um Papado pastoral e não professoral. O Concílio Vaticano II estabeleceu os instrumentos para esta forma: o sínodo dos bispos, feito até agora apenas consultivo, quando fora pensado, deliberativo. Criar-se-ia um órgão executivo que com o Papa governaria a Igreja. Criou-se pelo Concílio a colegialidade dos bispos, quer dizer, as conferências continentais e nacionais ganhariam mais autonomia para permitir um enraizamento da fé nas culturais locais, sempre em comunhão com Roma. Não é impensável que representantes do Povo de Deus desde cardeais, até mulheres ajudariam a eleger um Papa para toda a cristandade. Faz-se urgente uma reforma da Cúria na linha da descentralização. Certamente o que fará o Papa Francisco. Por que o Secretariado para as religiões não cristãs não pode funcionar na Ásia? O Dicastério da unidade dos cristãos em Genebra, perto do Conselho Mundial de Igrejas? O das missões, em alguma cidade da África? O dos direitos humanos e justiça, na América Latina?
A Igreja Católica poderia se transformar numa instância não autoritária de valores universais dos direitos humanos, os da Mãe Terra e da natureza, contra a cultura do consumo, em favor de uma sobriedade condividida. A questão central não é mais a Igreja mas a Humanidade e a civilização que podem desparecer. Como a Igreja ajuda em sua preservação? Tudo isso é possível e realizável, sem renunciar em nada à substância da fé cristã. Importa que o Papa Francisco seja um João XXIII dos novos tempos, um “Papa buono”, como já o mostrou. Só assim poderá resgatar a credibilidade perdida e ser um luzeiro de espiritualidade e de esperança para todos.
Leonardo Boff é teólogo, filósofo e escritor
Teólogo progressista vê identificação do novo papa com os pobres
Novo papa é aberto para as questões sociais e retrógrado na moral sexual. O historiador Beozzo observa que ninguém usou o nome Francisco até hoje “por causa da radicalidade”
por Gilberto Nascimento
A adoção do nome de Francisco pelo novo papa, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, evidencia uma posição em favor dos pobres na América Latina. Essa é a avaliação do teólogo e historiador José Oscar Beozzo, coordenador do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Cesep). Beozzo, um dos maiores especialistas em Igreja na América Latina, é alinhado à Teologia da Libertação e próximo de religiosos “progressistas”, como o arcebispo emérito de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns.
O religioso progressista vai na linha contrária daqueles que apontam Bergoglio como conservador. “Eu gostei. É uma pessoa que vive de maneira muito simples. É muito pobre, anda de ônibus e metrô. E Francisco é o santo mais venerado, é o santo radical da pobreza. Nunca ninguém usou esse nome por causa da radicalidade. Não se pode usar o nome de Francisco e ter uma prática cotidiana contrária a esses princípios”, observou Beozzo.
Bergoglio – o segundo nome mais votado no conclave que elegeu Bento XVI, em 2005 – é tido como um moderado, aberto e sensível aos temas sociais, mas “fechado” e retrógrado nas questões morais. Travou polêmicas inclusive com a presidente de seu país, Cristina Kirchner, ao condenar a adoção de crianças por gays. Tem posições mais à direita sobre temas como eutanásia, camisinha e casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Membro da ordem dos jesuítas, Bergoglio tem ligações com a Comunhão e Libertação, movimento que propõe uma nova forma de leitura da realidade para se contrapor à visão marxista. Defende que seja feita a partir da cultura e não das contradições socioeconômicas.
O novo papa é uma figura controvertida. Em 2005, pouco antes do conclave que elegeu Bento XVI -, um advogado da área de direitos humanos, Marcelo Perrilli, o apontou como cúmplice no sequestro de dois padres jesuítas. O fato teria ocorrido em 1976, durante o regime militar na Argentina. Bergoglio era o provincial da ordem dos jesuítas na Argentina. Os livros “Igreja e Ditadura’, de Emilio Mignone, e “El Silencio”, de Horacio Verbitsky, fazem acusações na mesma linha.
Beozzo – ainda ao final da tarde, momentos após o anúncio da nomeação do novo papa -, disse não haver comprovações dessas denúncias. “Ele nem era bispo nessa época. Alguns de seus superiores realmente colaboraram com a ditadura argentina”, argumentou.
Para o padre Manoel Godoy, ex-assessor da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e diretor do Instituto São Tomás de Aquino, de Belo Horizonte, a escolha de Bergoglio é positiva por sua dedicação aos menos favorecidos. “Ele escolheu o nome Francisco pela identificação com os pobres”, ressalta.
Godoy elogia ainda o fato de o novo papa andar de transporte coletivo e se recusar a morar em um palácio. “Mas muitos jesuítas tiveram de se exilar por não sentirem apoio, quando ele era providencial da ordem”, afirmou.
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Os vínculos do novo papa com a ditadura militar argentina
Nos bastidores do Vaticano, o poder da Comunhão e Libertação
14.03.13 - Mundo
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Mas como a capital do Brasil é Buenos Aires, dá quase no mesmo, e o Vaticano sapecou o papa Francisco com o recado do que parece ser a fase dois de uma “renovação conservadora” no catolicismo, iniciada por Bento 16, e que agora quer se projetar ao mundo. "Se nós não professarmos Jesus Cristo, nos converteremos em uma ONG piedosa, não em uma esposa do Senhor", afirmou o papa em sua primeira homilia.
Seja qual for o rebanho predominante, e justamente em razão dos planos de expansão de lado a lado, o que importa é a consolidação dos direitos civis sobre a pauta religiosa. Tarefa nada simples. Afinal, “o Brasil é um país laico-cristão”, na visão do hoje célebre pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP), figura que afronta o bom senso e os cabelereiros do país.
O Papa Francisco, chamado a restaurar a Igreja
14/03/2013
Nas redes sociais havia anunciado que o futuro Papa iria se chamar Francisco. E não me enganei. Por que Francisco? Porque São Francisco começou sua conversão ao ouvir o Crucifixo da capelinha de São Damião lhe dizer:”Francisco, vai e restaura a minha casa; olhe que ela está em ruinas”(S.Boaventura, Legenda Maior II,1).
Francisco tomou ao pé da letra estas palavras e reconstruíu a igrejinha da Porciúncula que existe ainda em Assis dentro de uma imensa catedral. Depois entendeu que se tratava de algo espiritual: restaurar a “Igreja que Cristo resgatara com seu sangue”(op.cit). Foi então que começou seu movimento de renovação da Igreja que era presidida pelo Papa mais poderoso da história, Inocêncio III. Começou morando com os hansenianos e de braço com um deles ia pelos caminhos pregando o evangelho em língua popular e não em latim.
É bom que se saiba que Francisco nunca foi padre mas apenas leigo. Só no final da vida, quando os Papas proibiram que os leigos pregassem, aceitou ser diácono à condição de não receber nenhuma remuneração pelo cargo.
Por que o Card. Jorge Mario Bergoglio escolheu o nome de Francisco? A meu ver foi exatamente porque se deu conta de que a Igreja, está em ruinas pela desmoralização dos vários escândalos que atingiram o que ela tinha de mais precioso: a moralidade e a credibilidade.
Francisco não é um nome. É um projeto de Igreja, pobre, simples, evangélica e destituída de todo o poder. É uma Igreja que anda pelos caminhos, junto com os últimos; que cria as primeiras comunidades de irmãos que rezam o breviário debaixo de árvores junto com os passarinhos. É uma Igreja ecológica que chama a todos os seres com a doce palavra de “irmãos e irmãs”. Francisco se mostrou obediente à Igreja dos Papas e, ao mesmo tempo, seguiu seu próprio caminho com o evangelho da pobreza na mão. Escreveu o então teólogo Joseph Ratzinger: ”O não de Francisco àquele tipo de Igreja não poderia ser mais radical, é o que chamaríamos de protesto profético”(em Zeit Jesu, Herder 1970, 269). Ele não fala, simplesmente inaugura o novo.
Creio que o Papa Francisco tem em mente uma Igreja assim, fora dos palácios e dos símbolos do poder. Mostrou-o ao aparecer em público. Normalmente os Papas e Ratizinger principalmente punham sobre os ombros a mozeta aquela capinha, cheia de brocados e ouro que só os imperadores podiam usar. O Papa Francisco veio simplesmente vestido de branco e com a cruz de bispo. Três pontos são de ressaltar em sua fala e são de grande significação simbólica.
O primeiro: disse que quer “presidir na caridade”. Isso desde a Reforma e nos melhores teólogos do ecumenismo era cobrado. O Papa não deve presidir com como um monarca absoluto, revestido de poder sagrado como o prevê o direito canônico. Segundo Jesus, deve presidir no amor e fortalecer a fé dos irmãos e irmãs.
O segundo: deu centralidade ao Povo de Deus, tão realçada pelo Vaticano II e posta de lado pelos dois Papas anteriores em favor da Hierarquia. O Papa Francisco, humildemente, pede que o Povo de Deus reze por ele e o abençoe. Somente depois, ele abençoará o Povo de Deus. Isto significa: ele está ai para servir e não par ser servido. Pede que o ajudem a construir um caminho juntos. E clama por fraternidade para toda a humanidade onde os seres humanos não se reconhecem como irmãos e irmãs mas reféns dos mecanismos da economia.
Por fim, evitou toda a espetacularização da figura do Papa. Não estendeu os braços para saudar o povo. Ficou parado, imóvel, sério e sóbrio, diria, quase assustado. Apenas se via a figura branca que olhava com carinho para a multidão. Mas irradiava paz e confiança. Usou de humor falando sem uma retórica oficialista. Como um pastor fala aos seus fiéis.
Cabe por último ressaltar que é um Papa que vem do Grande Sul, onde estão os pobres da Terra e onde vivem 60% dos católicos. Com sua experiência de pastor, com uma nova visão das coisas, a partir de baixo, poderá reformar a Cúria, descentralizar a administração e conferir um rosto novo e crível à Igreja.
Leonardo Boff é autor de São Francisco de Assis: ternura e vigor, Vozes 1999.
Francisco: um Papa que presidirá na caridade
16/03/2013
A grave crise moral que atravessa todo o corpo institucional da Igreja fez com que o Conclave elegesse alguém que tenha autoridade e coragem para fazer profundas reformas na Cúria romana e presidir a Igreja na caridade e menos na autoridade jurídica, enfraquecendo as igrejas locais. Foi o que acenou o novo Papa Francisco em sua primeira fala. Se isso ocorrer ele será o Papa do terceiro milênio e abrirá uma nova “dinastia” de Papas vindos das periferias da cristandade.
A figura do Papa é talvez o maior símbolo do Sagrado no mundo Ocidental. As sociedades que pela secularização exilaram o Sagrado, a falta de líderes referenciais e a nostalgia da figura do pai como aquele que orienta, cria confiança e mostra caminhos, concentraram na figura do Papa estes ancestrais anseios que podiam ser lidos nos rostos dos fiéis na praça de São Pedro. Nesse espírito quebrou os protocolos, se sentiu gente do povo, pagando sua conta no lugar onde se hospedou, indo de simples carro para a Basílica Santa Maria Maior e conservando sua cruz de ferro.
Para os cristãos é irrenunciável o ministério de Pedro como aquele deve “confirmar os irmãos e as irmãs na fé” segundo o mandato do Mestre. Roma onde estão sepultado Pedro e Paulo, foi desde os primórdios, referência de unidade, de ortodoxia e de zelo pelas demais as igrejas. Esta perspectiva é acolhida também pelas demais igrejas não-católicas. A questão toda é a forma como se exerce tal função. O Papa Leão Magno (440-461), no vazio do poder imperial, teve que assumir a governança de Roma para enfrentar os hunos de Átila. Tomou o título de Papa e de Sumo Pontífice que eram do Imperador, incorporou o estilo imperial de poder, monárquico e centralizado com seus símbolos, as vestimentas e o estilo palaciano. Os textos atinentes a Pedro que em Jesus tinham um sentido de serviço e de amor, foram interpretados, no estilo romano, como estrito poder jurídico. Tudo culminou com Gregório VII que com o seu “Dictatus Papae”(a Ditadura do Papa) arrogou para si os dois poderes, o religioso e o secular. Surgiu a grande Instituição Total, obstáculo à liberdade dos cristãos e ao diálogo com o mundo moderno globalizado.
Esse exercício absolutista foi sempre questionado, especialmente, pelos Reformadores. Mas nunca foi amenizado. Como reconhecia João Paulo II, no seu documento sobre o ecumenismo: este estilo de exercer a função de Pedro é o maior obstáculo à unidade das Igreja e à aceitação por parte dos cristãos vindos do mundo democrático. Não basta a espetacularização da fé com grandes eventos para suprir tal deficiência.
A atual forma monárquica deverá ser repensada à luz daquela intenção de Jesus. Será um Papado pastoral e não professoral. O Concílio Vaticano II estabeleceu os instrumentos para esta forma: o sínodo dos bispos, feito até agora apenas consultivo, quando fora pensado, deliberativo. Criar-se-ia um órgão executivo que com o Papa governaria a Igreja. Criou-se pelo Concílio a colegialidade dos bispos, quer dizer, as conferências continentais e nacionais ganhariam mais autonomia para permitir um enraizamento da fé nas culturais locais, sempre em comunhão com Roma. Não é impensável que representantes do Povo de Deus desde cardeais, até mulheres ajudariam a eleger um Papa para toda a cristandade. Faz-se urgente uma reforma da Cúria na linha da descentralização. Certamente o que fará o Papa Francisco. Por que o Secretariado para as religiões não cristãs não pode funcionar na Ásia? O Dicastério da unidade dos cristãos em Genebra, perto do Conselho Mundial de Igrejas? O das missões, em alguma cidade da África? O dos direitos humanos e justiça, na América Latina?
A Igreja Católica poderia se transformar numa instância não autoritária de valores universais dos direitos humanos, os da Mãe Terra e da natureza, contra a cultura do consumo, em favor de uma sobriedade condividida. A questão central não é mais a Igreja mas a Humanidade e a civilização que podem desparecer. Como a Igreja ajuda em sua preservação? Tudo isso é possível e realizável, sem renunciar em nada à substância da fé cristã. Importa que o Papa Francisco seja um João XXIII dos novos tempos, um “Papa buono”, como já o mostrou. Só assim poderá resgatar a credibilidade perdida e ser um luzeiro de espiritualidade e de esperança para todos.
Leonardo Boff é teólogo, filósofo e escritor
Para Frei Betto, papa tem de reformar Igreja e dar atenção aos mais pobres
Reformismos dentro da Igreja e questão social devem ocupar
grande parte da agenda do papa Francisco para que a instituição não siga
isolada, diz Frei
Publicado em 14/03/2013, 13:24
Última atualização às 13:24
Argentinos festejam escolha do conterrâneo Jorge Mario
Bergoglio para líder máximo da Igreja Católica, em Buenos Aires (©
Patricio Murphy/Folhapress)
São Paulo – Em comentário no
Jornal Brasil Atual, o assessor de movimentos sociais Frei Betto,
disse esperar do novo pontificado reformas na igreja e maior atenção
aos pobres. “Espero que um latino-americano, que está acostumado a
viver em nosso continente, com as desigualdades sociais próprias
daqui, e com todo o avanço do fundamentalismo religioso na região –
não só evangélico, mas também o católico – traga uma nova
visão do que deve ser o papel da Igreja no mundo de hoje.”
A reforma na Cúria Romana, organismo administrativo da Igreja, é apontada por Frei Betto como primeiro ponto a ser colocado
em pauta pelo papa Francisco. “Se o papa é o chefe de Estado do
Vaticano, os seus ministros são aqueles que
integram a cúria romana, que hoje em dia está sob suspeita de
corrupção, de acobertar estes crimes hediondos de pedofilia,
vazamento de informações. Espero que haja uma profunda reforma
nesta cúria.”
A escolha do nome
Francisco pelo cardeal Jorge
Mario Bergoglio, de acordo com Frei Betto, é representativa. “São
Francisco é o santo da opção pelos pobres. A história dele
[Bergoglio] como padre, bispo e cardeal, mostra que teve muita
sensibilidade para a questão social.”
Como mostrou reportagem
da RBA, Bergoglio é investigado na Argentina pela colaboração na
ditadura. Entre as acusações, estão o sequestro e a tortura de
dois jesuítas e a apropriação de bebês durante a ditadura no país
(1976-83).
“A ditadura militar
atuou barbaramente na Argentina durante longos anos, com o
desaparecimento de cerca de 3 mil crianças. A Igreja Católica foi
conivente com a ditadura a ponto de nomear capelães para os quarteis
onde os presos políticos eram torturados e assassinados”, afirmou
Frei Betto. Ele destacou a importância da apuração dos crimes.
“Tudo isso precisa ser apurado para que tenhamos um perfil exato do
papa Francisco.”
Reformismo
Além das reformas na Cúria Romana, Frei Betto falou sobre outros pontos levados como
verdadeiros tabus pela Igreja, que precisam passar por reformulações.
“A questão da moral sexual precisa ser mexida o quanto antes.
Diria que já seria avanço se o papa autorizasse os padres casados a
voltarem ao ministério sacerdotal.”
O acesso das mulheres
ao sacerdócio também foi lembrado por ele. "É preciso tirar da
teologia católica essa nódoa de que a mulher é um ser
ontologicamente menor ao homem, por isso ela não pode ser sacerdote.
Isso precisa ser erradicado.”
Ele também lembrou do conservadorismo na moral sexual
da Igreja. Isso é um tabu na Igreja Católica, que precisa ser mexido o
quanto antes. Seria um avanço se o papa autorizasse os padres
casados a voltarem ao ministério sacerdotal."
A “dupla moral”,
segundo Frei Betto, precisa acabar. “A moral que consta na doutrina
e a praticada pelos fiéis são diferentes. Tem de tocar nessa questão, porque pelo
que consta na Igreja, ninguém pode usar preservativo, e os casais
não podem ter relações que não sejam para procriar.”
Finalmente, ele chama a
atenção da importância do jovem para o novo pontificado. “Se
estes pontos não forem revistos, a Igreja vai continuar a perder
fieis, e continuar falando uma linguagem que o mundo atual não
entende, principalmente os jovens. O papa precisa estar atento a
isso.”
Em breve, o áudio completo de Frei Betto na Rádio Brasil Atual
OUÇA O ÁUDIO COM FREI BETTO - AQUI
“Habemus Papam”: Francisco
Fonte: Jornal Brasil de Fato
É a primeira vez na história que um papa adota o nome
daquele que sonhou que a Igreja desabava e cabia a ele reconstruí-la. O
tempo dirá a que veio
14/03/2013
Frei Betto
O
papa Francisco – nome adotado pelo cardeal argentino Jorge Mario
Bergoglio - ao ser eleito novo chefe da Igreja Católica terá pela frente
difíceis desafios. O maior deles, imprimir colegialidade ao governo da
Igreja e reformar a Cúria Romana.
Para mexer
nesse ninho de cobras, terá de remover presidentes de congregações (que,
no Vaticano, equivalem a ministérios) e nomear para dirigi-las prelados
que, hoje, vivem fora de Roma e são, portanto, virtualmente imunes à
influência da “famiglia curiale”, a que, de fato, exerce o poder na
Igreja.
Para modificar a estrutura monárquica da
Igreja, Francisco terá de repensar o estatuto das nunciaturas, valorizar
as conferências episcopais e o sínodo dos bispos e, quem sabe, criar
novas instituições, como um colégio de leigos capaz de representar a
Igreja como Povo de Deus, e não como sociedade clericalizada
pretensamente perfeita.
Não será surpresa se, em
breve, o novo papa promover o seu primeiro consistório, elevando ao
cardinalato bispos e arcebispos dos cinco continentes (e talvez até
padres e leigos, os chamados “cardeais in pectore”, que não são de
conhecimento público).
Tal iniciativa deverá
incluir o atual arcebispo do Rio de Janeiro, dom Orani Tempesta. Paira
certa incongruência no fato de a arquidiocese carioca não ter, há anos,
cardeal titular, como há em São Paulo. Sobretudo considerando que o Rio
acolherá, em julho próximo, a Jornada Mundial da Juventude, à qual o
novo pontífice estará presente.
A imagem da
Igreja Católica está manchada, hoje, por escândalos sexuais e falcatruas
financeiras. Não se espere do novo papa atitudes ousadas enquanto Bento
XVI lhe fizer sombra na área do Vaticano. Mas seria uma
irresponsabilidade o papa Francisco não abrir, no interior da Igreja, o
debate sobre a moral sexual.
Nesse tema, são
muitas as questões a serem aprofundadas, a começar pela seleção dos
candidatos ao sacerdócio. Já há uma instrução de Roma aos bispos para
que não sejam aceitos jovens notoriamente afeminados – o que me parece
uma discriminação incompatível com os valores evangélicos. Equivale a
impedir o ingresso na carreira sacerdotal de candidatos heterossexuais
dotados de uma masculinidade digna de Don Juan.
O
problema não é questão de aparência, e sim de vocação. Se a Igreja
pretende ampliar o número de padres terá que, necessariamente, retomar o
padrão dos seus primeiros séculos e distinguir vocação ao sacerdócio de
vocação ao celibato.
Aqueles que se sentem em
condições de se abster de vida sexual (já que apenas aos anjos é dado
prescindir da sexualidade) devem abraçar a via monástica, religiosa,
ainda que alguns se tornem sacerdotes para o serviço comunitário. Já ao
clero diocesano seria facultado escolher a vida matrimonial, como ocorre
hoje nas Igrejas ortodoxa e anglicana, e com os pastores de Igrejas
protestantes.
O caminho mais curto e mais sábio
seria o papa admitir a reinserção de padres casados no ministério
sacerdotal. Eles são milhares. No mundo, calcula-se cerca de 100 mil; no
Brasil, 5 mil. Muitos gostariam de voltar ao serviço pastoral com
direito a administrar sacramentos e celebrar missa.
A
medida mais inovadora seria permitir o acesso de mulheres ao
sacerdócio. Não há precedente na história da Igreja, exceto em países
socialistas onde, clandestinos, bispos despreparados ordenaram mulheres
cujo sacerdócio, ao vir à lume, não foi reconhecido por Roma.
Nos
evangelhos há mulheres notoriamente apóstolas, embora não figurem na
lista canônica dos doze apóstolos. Em Lucas 8, 1, constam os nomes de
mulheres pertencentes à comunidade apostólica de Jesus: Maria Madalena,
Joana, Susana “e várias outras”.
A samaritana
(João 4) foi apóstola, no sentido rigoroso do termo – a primeira pessoa a
anunciar Jesus como o Messias. E Maria Madalena, a primeira testemunha
da ressurreição de Jesus.
Facultar às mulheres o
acesso ao sacerdócio implica modificar um dos pontos mais anacrônicos da
ortodoxia católica, que ainda hoje considera a mulher ontologicamente
inferior ao homem. É a famosa pergunta em aula de teologia: pode o
escravo se tornar padre? Sim, desde que liberto, pois como homem goza da
plenitude humana. Já a mulher, ser inferior ao homem, está excluída
desse direito, pois não goza da plenitude humana.
Outros
desafios se apresentam ao novo papa, como o diálogo inter-religioso.
Nos últimos pontificados Roma deu passos significativos para melhorar as
relações do catolicismo com o judaísmo, levando o papa a visitar o Muro
das Lamentações, em Jerusalém, e isentando os judeus da pecha de
assassinos de Jesus.
No entanto, retrocedeu
quanto à relação com os muçulmanos. Em sua visita à Universidade de
Regensburg, na Alemanha, em 2006, Bento XVI cometeu a infelicidade de
citar uma história do século XIV em que o imperador bizantino pede a um
persa que lhe mostre "o que Maomé trouxe de novo, e você só encontrará
coisas más e desumanas, como sua ordem de espalhar pela espada a fé que
pregava". Embora a intenção do papa fosse condenar o uso da violência
pela religião – no qual a Igreja da Inquisição foi mestra – a comunidade
islâmica, com razão, se sentiu ofendida.
Ao
visitar os EUA, em 2008, Bento XVI esteve numa sinagoga de Nova York,
sem no entanto dirigir-se a uma mesquita, o que teria demonstrado sua
imparcialidade e abertura à diversidade religiosa, além de combater o
preconceito estadunidense de que muçulmano rima com terrorista.
Há
que aprofundar o diálogo com as religiões do Oriente, como o budismo e
as tradições espirituais da Índia. E buscar melhor aproximação com os
cultos animistas da África e os ritos indígenas da América Latina.
É
chegada a hora de a Igreja Católica admitir a pertinência das razões
que provocaram sua ruptura com as Igrejas Ortodoxas e a de Lutero com
Roma. E, num gesto ecumênico, buscar a unidade na diversidade, de modo a
testemunharem uma única Igreja de Cristo.
Convém
reconhecer, como propõe o Concilio Vaticano II, que as sementes do
Evangelho vigoram também em denominações religiosas não cristãs, ou
seja, fora da Igreja Católica há sim salvação.
O
papa Francisco terá que optar entre os três dons do Espírito Santo
oferecidos aos discípulos de Jesus: sacerdote, doutor ou profeta. A ser
um sacerdote como João Paulo II, teremos uma Igreja voltada a seus
próprios interesses como instituição clerical, com leigos tratados como
ovelhas subservientes e desconfiança frente aos desafios da
pós-modernidade.
A ser um doutor como Bento XVI, o
novo pontífice reforçará uma Igreja mais mestra do que mãe, na qual a
preservação da doutrina tradicional importará mais do que encarnar a
Igreja nos novos tempos em que vivemos, incapaz de ser, como São Paulo,
“grego com os gregos e judeu com os judeus”.
Assumindo
seu múnus profético, como João XXIII, o papa Francisco se empenhará
numa profunda reforma da Igreja, para que nela transpareça a palavra e o
testemunho de Jesus, no qual Deus se fez um de nós.
“Habemus
papam!” Já sabemos quem: Francisco. É a primeira vez na história que um
papa adota o nome daquele que sonhou que a Igreja desabava e cabia a
ele reconstruí-la. O tempo dirá a que veio.
Frei Betto é escritor, autor de “A obra do Artista – uma visão holística do Universo” (José Olympio), entre outros livros. http://www.freibetto.org/> twitter:@freibetto.
Teólogo progressista vê identificação do novo papa com os pobres
Fonte: Viomundo
publicado em 14 de março de 2013 às 8:58
Teólogo progressista vê identificação do novo papa com os pobres
Novo papa é aberto para as questões sociais e retrógrado na moral sexual. O historiador Beozzo observa que ninguém usou o nome Francisco até hoje “por causa da radicalidade”
por Gilberto Nascimento
A adoção do nome de Francisco pelo novo papa, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, evidencia uma posição em favor dos pobres na América Latina. Essa é a avaliação do teólogo e historiador José Oscar Beozzo, coordenador do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Cesep). Beozzo, um dos maiores especialistas em Igreja na América Latina, é alinhado à Teologia da Libertação e próximo de religiosos “progressistas”, como o arcebispo emérito de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns.
O religioso progressista vai na linha contrária daqueles que apontam Bergoglio como conservador. “Eu gostei. É uma pessoa que vive de maneira muito simples. É muito pobre, anda de ônibus e metrô. E Francisco é o santo mais venerado, é o santo radical da pobreza. Nunca ninguém usou esse nome por causa da radicalidade. Não se pode usar o nome de Francisco e ter uma prática cotidiana contrária a esses princípios”, observou Beozzo.
Bergoglio – o segundo nome mais votado no conclave que elegeu Bento XVI, em 2005 – é tido como um moderado, aberto e sensível aos temas sociais, mas “fechado” e retrógrado nas questões morais. Travou polêmicas inclusive com a presidente de seu país, Cristina Kirchner, ao condenar a adoção de crianças por gays. Tem posições mais à direita sobre temas como eutanásia, camisinha e casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Membro da ordem dos jesuítas, Bergoglio tem ligações com a Comunhão e Libertação, movimento que propõe uma nova forma de leitura da realidade para se contrapor à visão marxista. Defende que seja feita a partir da cultura e não das contradições socioeconômicas.
O novo papa é uma figura controvertida. Em 2005, pouco antes do conclave que elegeu Bento XVI -, um advogado da área de direitos humanos, Marcelo Perrilli, o apontou como cúmplice no sequestro de dois padres jesuítas. O fato teria ocorrido em 1976, durante o regime militar na Argentina. Bergoglio era o provincial da ordem dos jesuítas na Argentina. Os livros “Igreja e Ditadura’, de Emilio Mignone, e “El Silencio”, de Horacio Verbitsky, fazem acusações na mesma linha.
Beozzo – ainda ao final da tarde, momentos após o anúncio da nomeação do novo papa -, disse não haver comprovações dessas denúncias. “Ele nem era bispo nessa época. Alguns de seus superiores realmente colaboraram com a ditadura argentina”, argumentou.
Para o padre Manoel Godoy, ex-assessor da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) e diretor do Instituto São Tomás de Aquino, de Belo Horizonte, a escolha de Bergoglio é positiva por sua dedicação aos menos favorecidos. “Ele escolheu o nome Francisco pela identificação com os pobres”, ressalta.
Godoy elogia ainda o fato de o novo papa andar de transporte coletivo e se recusar a morar em um palácio. “Mas muitos jesuítas tiveram de se exilar por não sentirem apoio, quando ele era providencial da ordem”, afirmou.
Leia também:
Os vínculos do novo papa com a ditadura militar argentina
Nos bastidores do Vaticano, o poder da Comunhão e Libertação
14.03.13 - Mundo
[Novo Papa] A geopolítica do segredo
Ivone Gebara
Escritora, filósofa e teóloga
Adital
Passadas as primeiras horas do impacto da eleição do
Cardeal Bergoglio de Buenos Aires, das emoções primeiras de termos um papa
latino-americano, com expressão amável e cordial a vida presente nos convida a
refletir.
Apesar de seu valor, os meios de comunicação têm também
o poder de amortizar as mentes e de impedir que perguntas críticas aflorem ao
pensamento das pessoas. Nesses dois
últimos dias que precederam a eleição papal, muitas pessoas no Brasil e no
mundo foram tomadas pelas transmissões em direto de Roma. Sem dúvida um
acontecimento histórico desses não se repete todos os meses! Mas, que
interesses tiveram as grandes empresas de telecomunicações em transmitir os inúmeros
detalhes da escolha do novo Papa? A quem servem os milhões de dólares gastos
nas transmissões ininterruptas até a chegada da fumaça branca? Do lado de quem
se situam esses interesses? Que interesses tem o Vaticano em abrir as
possibilidades para essas transmissões? Essas perguntas talvez inúteis para
muitos, continuam a ser significativas para alguns grupos preocupados com o crescimento
da consciência humanista de muitos/as de nós.
São em grande parte as empresas de telecomunicações as responsáveis pela manutenção do segredo nas políticas eleitorais do Vaticano. O segredo, os juramentos e as penalidades por não respeitá-los são parte integrante do negócio. Criam impactos e fazem notícia. Não se trata de uma tradição secular sem conseqüências para a vida do mundo, mas de comportamentos que acabam viciando a busca de diálogo entre os grupos ou excluindo grupos de um necessário diálogo. Nenhuma crítica a esse sistema perverso que continua usando o Espírito Santo para a manutenção de posturas ultraconservadoras revestidas de ares de religiosidade e bondosa submissão é feito. Nenhum espaço para que vozes dissonantes possam se manifestar mesmo com o risco de serem apedrejadas é aberto na oficialidade das transmissões. Uma ou outra vez se percebe uma pequena ponta crítica se esboçando, mas logo é abafada pelo "status quo” imposto pela ideologia dominante. Do novo papa Francisco se contou que usava transportes públicos, estava próximo dos pobres, fazia sua comida e que a escolha desse nome o assemelhavam ao grande santo de Assis. Foi imediatamente apresentado como uma figura simples, cordial e simpática. Na imprensa católica nada se falou das suspeitas de muitos em relação a sua postura nos tempos da ditadura militar, de suas atuais posturas políticas, de suas posições contrárias ao matrimonio igualitário, ou mesmo contra o aborto legal. Nada se falou de suas conhecidas críticas em relação à teologia da libertação e de seu desinteresse pela teologia feminista. A figura bondosa e sem ostentação eleita pelos cardeais assistidos pelo Espírito Santo encobriu o homem real com suas inúmeras contradições. Hoje os jornais (Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo) delinearam perfis diferentes do novo papa e temos uma percepção mais realista de sua biografia. Além disso, foi possível intuir que sua eleição é sem dúvida parte de uma geopolítica de interesses divididos e de equilíbrio de forças no mundo católico. Um artigo de Julio C. Gambina da Argenpress publicado via internet ontem (13 de março de 2013) assim como outras informações enviadas por grupos alternativos da Nicarágua, Venezuela, Brasil e, sobretudo da Argentina confirmaram minhas suspeitas. A cátedra de Pedro e o Estado do Vaticano devem mover suas pedras no xadrez mundial para favorecer as forças dos projetos políticos do norte e dos seus aliados do sul. O sul foi de certa maneira co-optado pelo norte. Um chefe político da Igreja, vindo do sul vai equilibrar as pedras do xadrez mundial, bastante movimentadas nos últimos anos pelos governos populares da América latina e pelas lutas de muitos movimentos entre eles os movimentos feministas do continente com reivindicações que atormentam o Vaticano. Se, é no sul que alguma coisa nova está acontecendo politicamente nada melhor do que um papa do sul, um latino-americano para enfrentar esse novo momento político e conservar as tradições da família e da propriedade intactas. Sem dúvida uma afirmação desse tipo quebra o encanto do momento da eleição e a emoção de ver a multidão na Praça de São Pedro irrompendo em aplausos e gritos de alegria diante da figura do papa Francisco. Muitos dirão que essas críticas tiram a beleza de um acontecimento tão emocionante quanto a eleição de um papa. Talvez, mas creio que são críticas necessárias.
A tão badalada preservação da evangelização como prioridade da Igreja parece ser a preservação de uma ordem hierárquica do mundo onde as elites governam e os povos aplaudem nas grandes praças públicas, se emocionam, rezam e cantam para que as bênçãos divinas caiam sobre as cabeças dos novos governantes político-religiosos. O mesmo catecismo com poucas variações continua a ser reproduzido. Não há reflexão, não se despertam as consciências, não se convida ao pensamento, mas a conservação de uma doutrina quase mágica. Por um lado é a sociedade do espetáculo que nos invade para que entremos na disciplina da ordem/desordem contemporânea com certa dose de romantismo e por outro a sociedade assistencialista identificada à evangelização. Sair às ruas para dar de comer aos pobres e rezar com os prisioneiros embora tenha algo de humanitário não resolve o problema da exclusão social presente nos muitos países do mundo.
Escrever sobre a "geopolítica do segredo” em tempos de euforia mediática é como estragar a festa dos vendilhões do Templo felizes com suas barracas cheias de terços, escapulários, vidros de água benta e imagens grandes e pequenas de muitos santos. O problema é que se abrimos o segredo desmancha-se o charme da fumaça branca, se quebra o suspense de um conclave secreto que fecha ao povo católico o acesso às informações às quais temos direito, se desnudam os corpos purpurados com suas histórias tortuosas.
Quebrar o segredo é quebrar a falsidade do sistema político-religioso que governa a Igreja Católica Romana. É tirar as máscaras que nos sustentam para afinal abrir nossos corações para a real interdependência e responsabilidade entre todos nós. Os jogos de poder são cheios de astúcias, ilusões e até de boa fé. Somos capazes de nos impressionar com um gesto público de carinho ou de simpatia sem nos perguntarmos sobre o que de fato constituiu a história dessa pessoa. Nem nos perguntamos sobre as ações de seu passado, de seu presente e suas perspectivas de futuro. É apenas o momento da aparição da figura simpática vestida de branco que nos impressiona. Somos capazes de nos emocionarmos frente a um carinhoso "bona cerra” papal (boa noite) e irmos para cama como crianças bem comportadas abençoadas pelo bondoso papai. Já não somos mais órfãos visto que a orfandade paterna numa sociedade patriarcal é insuportável mesmo por poucos dias.
Nós somos cúmplices da manutenção desses poderes tenebrosos que nos encantam e nos oprimem ao mesmo tempo. Nós, sobretudo os que têm mais lucidez nos processos políticos e religiosos, somos responsáveis pela ilusão que esses poderes criam na vida de milhares de pessoas, sobretudo veiculadas pelos meios de comunicação religiosos. Somos capazes de nos enternecer de tal forma que nos esquecemos dos jogos do poder, das manipulações invisíveis, da arte teatral cultivada e tão importante nessas ocasiões.
Não podemos fazer previsões sobre os rumos do futuro da governança da Igreja Católica Romana. Mas à primeira vista não parece que podemos esperar grandes mudanças nas estruturas e políticas atuais. As mudanças significativas virão se as comunidades cristãs católicas assumirem de fato a direção do presente do cristianismo, ou seja, se elas forem capazes de dizer a partir das necessidades de suas vidas como o Evangelho de Jesus poderá ser traduzido e vivido em nossas vidas hoje.
A geopolítica do segredo tem interesses altíssimos a defender. É parte de um projeto mundial de poder aonde as forças da ordem se vêm ameaçadas pelas revoluções sociais e culturais em curso em nosso mundo. Manter o segredo é justificar que há forças superiores às forças históricas da vida e que estas são mais decisivas que os rumos que podemos dar à nossa luta coletiva por dignidade, pão, justiça e misericórdia em meio aos muitos reveses e tristezas que nos acometem em meio do caminho.
Termino essa breve reflexão na esperança de que possamos não apagar a luz da liberdade que vive em nós e seguirmos bebendo das fontes de nossos sonhos de dignidade com lucidez sem nos impressionarmos com as surpresas que podem parecer grandes novidades. Afinal é apenas mais um papa que inscreve seu nome nessa instituição que apesar de sua história de altos e baixos mereceria ser transformada e repensada para os dias de hoje.
Mudanças podem sempre acontecer e é preciso estar abertos aos pequenos sinais de esperança que irrompem por todos os lados mesmo das instituições as mais anacrônicas de nosso mundo.
14 de Março de 2013.
São em grande parte as empresas de telecomunicações as responsáveis pela manutenção do segredo nas políticas eleitorais do Vaticano. O segredo, os juramentos e as penalidades por não respeitá-los são parte integrante do negócio. Criam impactos e fazem notícia. Não se trata de uma tradição secular sem conseqüências para a vida do mundo, mas de comportamentos que acabam viciando a busca de diálogo entre os grupos ou excluindo grupos de um necessário diálogo. Nenhuma crítica a esse sistema perverso que continua usando o Espírito Santo para a manutenção de posturas ultraconservadoras revestidas de ares de religiosidade e bondosa submissão é feito. Nenhum espaço para que vozes dissonantes possam se manifestar mesmo com o risco de serem apedrejadas é aberto na oficialidade das transmissões. Uma ou outra vez se percebe uma pequena ponta crítica se esboçando, mas logo é abafada pelo "status quo” imposto pela ideologia dominante. Do novo papa Francisco se contou que usava transportes públicos, estava próximo dos pobres, fazia sua comida e que a escolha desse nome o assemelhavam ao grande santo de Assis. Foi imediatamente apresentado como uma figura simples, cordial e simpática. Na imprensa católica nada se falou das suspeitas de muitos em relação a sua postura nos tempos da ditadura militar, de suas atuais posturas políticas, de suas posições contrárias ao matrimonio igualitário, ou mesmo contra o aborto legal. Nada se falou de suas conhecidas críticas em relação à teologia da libertação e de seu desinteresse pela teologia feminista. A figura bondosa e sem ostentação eleita pelos cardeais assistidos pelo Espírito Santo encobriu o homem real com suas inúmeras contradições. Hoje os jornais (Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo) delinearam perfis diferentes do novo papa e temos uma percepção mais realista de sua biografia. Além disso, foi possível intuir que sua eleição é sem dúvida parte de uma geopolítica de interesses divididos e de equilíbrio de forças no mundo católico. Um artigo de Julio C. Gambina da Argenpress publicado via internet ontem (13 de março de 2013) assim como outras informações enviadas por grupos alternativos da Nicarágua, Venezuela, Brasil e, sobretudo da Argentina confirmaram minhas suspeitas. A cátedra de Pedro e o Estado do Vaticano devem mover suas pedras no xadrez mundial para favorecer as forças dos projetos políticos do norte e dos seus aliados do sul. O sul foi de certa maneira co-optado pelo norte. Um chefe político da Igreja, vindo do sul vai equilibrar as pedras do xadrez mundial, bastante movimentadas nos últimos anos pelos governos populares da América latina e pelas lutas de muitos movimentos entre eles os movimentos feministas do continente com reivindicações que atormentam o Vaticano. Se, é no sul que alguma coisa nova está acontecendo politicamente nada melhor do que um papa do sul, um latino-americano para enfrentar esse novo momento político e conservar as tradições da família e da propriedade intactas. Sem dúvida uma afirmação desse tipo quebra o encanto do momento da eleição e a emoção de ver a multidão na Praça de São Pedro irrompendo em aplausos e gritos de alegria diante da figura do papa Francisco. Muitos dirão que essas críticas tiram a beleza de um acontecimento tão emocionante quanto a eleição de um papa. Talvez, mas creio que são críticas necessárias.
A tão badalada preservação da evangelização como prioridade da Igreja parece ser a preservação de uma ordem hierárquica do mundo onde as elites governam e os povos aplaudem nas grandes praças públicas, se emocionam, rezam e cantam para que as bênçãos divinas caiam sobre as cabeças dos novos governantes político-religiosos. O mesmo catecismo com poucas variações continua a ser reproduzido. Não há reflexão, não se despertam as consciências, não se convida ao pensamento, mas a conservação de uma doutrina quase mágica. Por um lado é a sociedade do espetáculo que nos invade para que entremos na disciplina da ordem/desordem contemporânea com certa dose de romantismo e por outro a sociedade assistencialista identificada à evangelização. Sair às ruas para dar de comer aos pobres e rezar com os prisioneiros embora tenha algo de humanitário não resolve o problema da exclusão social presente nos muitos países do mundo.
Escrever sobre a "geopolítica do segredo” em tempos de euforia mediática é como estragar a festa dos vendilhões do Templo felizes com suas barracas cheias de terços, escapulários, vidros de água benta e imagens grandes e pequenas de muitos santos. O problema é que se abrimos o segredo desmancha-se o charme da fumaça branca, se quebra o suspense de um conclave secreto que fecha ao povo católico o acesso às informações às quais temos direito, se desnudam os corpos purpurados com suas histórias tortuosas.
Quebrar o segredo é quebrar a falsidade do sistema político-religioso que governa a Igreja Católica Romana. É tirar as máscaras que nos sustentam para afinal abrir nossos corações para a real interdependência e responsabilidade entre todos nós. Os jogos de poder são cheios de astúcias, ilusões e até de boa fé. Somos capazes de nos impressionar com um gesto público de carinho ou de simpatia sem nos perguntarmos sobre o que de fato constituiu a história dessa pessoa. Nem nos perguntamos sobre as ações de seu passado, de seu presente e suas perspectivas de futuro. É apenas o momento da aparição da figura simpática vestida de branco que nos impressiona. Somos capazes de nos emocionarmos frente a um carinhoso "bona cerra” papal (boa noite) e irmos para cama como crianças bem comportadas abençoadas pelo bondoso papai. Já não somos mais órfãos visto que a orfandade paterna numa sociedade patriarcal é insuportável mesmo por poucos dias.
Nós somos cúmplices da manutenção desses poderes tenebrosos que nos encantam e nos oprimem ao mesmo tempo. Nós, sobretudo os que têm mais lucidez nos processos políticos e religiosos, somos responsáveis pela ilusão que esses poderes criam na vida de milhares de pessoas, sobretudo veiculadas pelos meios de comunicação religiosos. Somos capazes de nos enternecer de tal forma que nos esquecemos dos jogos do poder, das manipulações invisíveis, da arte teatral cultivada e tão importante nessas ocasiões.
Não podemos fazer previsões sobre os rumos do futuro da governança da Igreja Católica Romana. Mas à primeira vista não parece que podemos esperar grandes mudanças nas estruturas e políticas atuais. As mudanças significativas virão se as comunidades cristãs católicas assumirem de fato a direção do presente do cristianismo, ou seja, se elas forem capazes de dizer a partir das necessidades de suas vidas como o Evangelho de Jesus poderá ser traduzido e vivido em nossas vidas hoje.
A geopolítica do segredo tem interesses altíssimos a defender. É parte de um projeto mundial de poder aonde as forças da ordem se vêm ameaçadas pelas revoluções sociais e culturais em curso em nosso mundo. Manter o segredo é justificar que há forças superiores às forças históricas da vida e que estas são mais decisivas que os rumos que podemos dar à nossa luta coletiva por dignidade, pão, justiça e misericórdia em meio aos muitos reveses e tristezas que nos acometem em meio do caminho.
Termino essa breve reflexão na esperança de que possamos não apagar a luz da liberdade que vive em nós e seguirmos bebendo das fontes de nossos sonhos de dignidade com lucidez sem nos impressionarmos com as surpresas que podem parecer grandes novidades. Afinal é apenas mais um papa que inscreve seu nome nessa instituição que apesar de sua história de altos e baixos mereceria ser transformada e repensada para os dias de hoje.
Mudanças podem sempre acontecer e é preciso estar abertos aos pequenos sinais de esperança que irrompem por todos os lados mesmo das instituições as mais anacrônicas de nosso mundo.
14 de Março de 2013.
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O QUE MARTINI QUERIA DIZER AO PAPA. AQUI
É um alívio o papa não ser brasileiro. Essa proximidade
com o despachante número um da divindade nos faria entrar num modo
“arquivo confidencial” por tempo indefinido. Parentes, amigos de
infância, colegas... Todo mundo no Faustão a lembrar o garotinho
travesso de bom coração. Fora isso, alguém imagina o que seria aturar a
família de um papa? Talvez algo tipo Ronaldinho Gaúcho e Assis. Que
inferno.
Ainda assim, foi divertido imaginar o dia seguinte. Principalmente,
pensar no que seria a capa do Zero Hora, já que o gaúcho dom Odilo
Scherer dividia a liderança dos papáveis. Um arrebatamento de
megalomania gaudéria seria o mínimo. Mas aí veio um argentino, e com ele
a melhor manchete, no Olé: “A mão de Deus. Maradona, Messi... e agora
Jorge Mario Bergoglio, eleito novo papa.” Os vizinhos superam qualquer
expectativa em megalomania.Mas como a capital do Brasil é Buenos Aires, dá quase no mesmo, e o Vaticano sapecou o papa Francisco com o recado do que parece ser a fase dois de uma “renovação conservadora” no catolicismo, iniciada por Bento 16, e que agora quer se projetar ao mundo. "Se nós não professarmos Jesus Cristo, nos converteremos em uma ONG piedosa, não em uma esposa do Senhor", afirmou o papa em sua primeira homilia.
Bergoglio chega para reafirmar o conservadorismo em temas sensíveis à igreja, como casamento gay e aborto, com um apelo à simplicidade de quem anda de ônibus e cozinha a própria comida. Porém, a vida pregressa, essa ingrata, impõe como primeira tarefa do novo papa negar que tenha colaborado com a ditadura militar na Argentina.
Acima de tudo, a escolha do primeiro papa latino-americano é o
reconhecimento de enfraquecimento da Igreja Católica e o esforço
derradeiro para conter o avanço dos movimentos evangélicos pentecostais
na região. Talvez seja tarde. O Brasil, com a maior população de
católicos nominais do planeta, passa por uma enorme transformação na
dinâmica das filiações religiosas e, se considerarmos dados do último
Censo, poderá ter evangélicos como maioria em 50 anos.Seja qual for o rebanho predominante, e justamente em razão dos planos de expansão de lado a lado, o que importa é a consolidação dos direitos civis sobre a pauta religiosa. Tarefa nada simples. Afinal, “o Brasil é um país laico-cristão”, na visão do hoje célebre pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP), figura que afronta o bom senso e os cabelereiros do país.
•
• atualizado às 07h22
Fonte: Portal Terra
Manifestações de apoio e repúdio a papa Francisco dividem argentinos
Bergoglio é considerado exemplo de austeridade, mas recebe críticas por suas visões sobre o casamento gay, sua relação com o governo Kirchner e sua possível relação com a ditadura
Buzinaços foram ouvidos nas ruas de Buenos Aires logo
após o anúncio da escolha do cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, 76
anos, como novo Papa. Mas as comemorações logo deram lugar às
manifestações de apoio ou repúdio ao novo Pontífice.
Logo após o anúncio, fiéis católicos se reuniram nas
escadarias da Catedral de Buenos Aires, no centro da cidade. Com
bandeiras azuis e brancas, as cores da Argentina, gritavam: "O Papa é
argentino" e "Salve Bergoglio".
A catedral fica a poucos passos da sede da Presidência
da República, a Casa Rosada, e em frente à Praça de Maio, símbolo dos
protestos em defesa dos direitos humanos e contra os crimes da ditadura,
com a qual o agora papa Francisco foi acusado de colaboração por um
jornalista local.
Nas ruas, a euforia durou poucos minutos. O clima ainda
era de surpresa e, ao mesmo tempo, de orgulho com o nome de um Papa
argentino. "Temos rainha (princesa Máxima, mulher do príncipe herdeiro
da Holanda), temos Messi e agora o Papa", disse a comerciante Maribel
Cortinez, 36 anos.
"Ele nos acolheu, nos abraçou e se emocionou com cada um
de nós quando perdemos nossos filhos naquela tragédia de Cromañon",
disse, nesta quarta-feira, o pai de uma das vítimas do incêndio em uma
discoteca que deixou dezenas de mortos em 2004, em Buenos Aires.
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O cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio foi
escolhido novo papa da Igreja Católica. Bergoglio nasceu em 1936 em
Buenos Aires. Ele foi nomeado cardeal em 2001 por João Paulo II. O novo
papa não estava entre os principais cotados por especialistas, nem por
casas de apostas. Ele é o primeiro papa sul-americano. O nome Francisco é
uma homenagem a São Francisco de Assis
Foto: Getty Images
Nas principais emissoras de rádio e de televisão do país, como os canais TN e C5N,
comentaristas destacavam a "austeridade" de Bergoglio, que costumava
viajar de metrô e de trem na capital argentina, e suas homilias
criticando a exclusão social e a corrupção nos governos. "Um povo que
não cuida de suas crianças e de seus idosos é um povo em decadência",
disse ele em uma missa.
Casamento gay
Suas declarações polêmicas incluíram a condenação publica ao então projeto do casamento entre pessoas do mesmo sexo, aprovado em 2010 no país, transformando a Argentina no primeiro país da região a adotar a medida. "Não sejamos ingênuos, não se trata de simples luta política, mas a pretensão destrutiva ao plano de Deus, o de um homem e uma mulher crescerem e se multiplicarem", afirmou.
Suas declarações polêmicas incluíram a condenação publica ao então projeto do casamento entre pessoas do mesmo sexo, aprovado em 2010 no país, transformando a Argentina no primeiro país da região a adotar a medida. "Não sejamos ingênuos, não se trata de simples luta política, mas a pretensão destrutiva ao plano de Deus, o de um homem e uma mulher crescerem e se multiplicarem", afirmou.
Os sacerdotes que trabalharam com ele, em Buenos Aires,
onde nasceu e foi cardeal, disseram à imprensa local que "ele condenou
as críticas e a falta de respeito aos gays".
Outro tema controverso foi seu papel durante a ditadura
argentina (1976-1983), com acusações de que teria sido "omisso" ou
"cúmplice" naqueles anos de chumbo e, principalmente, suas diferenças
públicas com o governo do ex-presidente Nestor Kirchner (2003-2007),
morto em 2010, e de sua mulher e sucessora, a presidente Cristina
Kirchner.
Em um discurso, transmitido ao vivo pelas emissoras de
televisão do país, nesta quarta, Cristina Kirchner disse que espera que
ele "defenda o diálogo" e "os excluídos". Mas quando ela citou o nome do
papa Francisco, setores da platéia vaiaram e outros aplaudiram.
Cristina fez um gesto pedindo silencio, e lembrou que Francisco "é o
primeiro papa latino-americano". "É um dia histórico para a América
Latina. Desejamos ao papa Francisco toda a sorte do mundo nesta missão
pastoral". O público, então, aplaudiu.
Ditadura
O porta-voz da Presidência, Alfredo Scoccimarro, disse que a presidente comparecerá à posse do novo papa, no Vaticano. Analistas disseram às rádios locais que a presidente "não compareceria à posse caso Bergoglio tivesse vínculos com a ditadura".
O porta-voz da Presidência, Alfredo Scoccimarro, disse que a presidente comparecerá à posse do novo papa, no Vaticano. Analistas disseram às rádios locais que a presidente "não compareceria à posse caso Bergoglio tivesse vínculos com a ditadura".
A polêmica sobre o posicionamento de Bergoglio durante a
ditadura foi destaque nas redes sociais. "Um cardeal que não excomungou
(o ex-ditador Jorge Rafael) Videla nunca será um Papa para todos e
todas", escreveu em seu mural no Facebook a transexual Melisa Stella
Saagratta.
1
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Fiéis comemoram a escolha do cardeal argentino
Jorge Mario Bergoglio como o novo papa Francisco na Catedral
Metropolitana de Buenos Aires
Foto: AFP
A denúncia sobre os supostos vínculos de Bergoglio com o regime militar foi feita pelo jornalista Horacio Verbitsky, no livro El Silencio.
Segundo ele, testemunhos de vítimas do regime indicavam que, em 1976,
Bergoglio, então chefe da congregação jesuíta na Argentina, teria
retirado a proteção a dois sacerdotes de sua ordem que realizavam
tarefas sociais em bairros pobres de Buenos Aires.
Os dois religiosos - Orlando Yorio e Francisco Jalics -
foram detidos em 1976 e ficaram presos por cinco meses na Escola
Mecânica da Marinha, local conhecido por ter sido um dos principais
centros de tortura durante a ditadura argentina.
Bergoglio posteriormente rechaçou as acusações. "Fiz o
que podia, com a idade que tinha e os poucos relacionamentos com que
contava, para advogar por pessoas sequestradas", disse. Ele afirmou que
não havia respondido às acusações imediatamente para "não fazer o jogo
de ninguém, não porque tivesse algo a ocultar".
Segundo a fonte que se consulte, Bergoglio pode ser
definido como o homem mais generoso e inteligente que já existiu ou um
maquiavélico que traiu seus irmãos e os entregou ao desaparecimento e à
tortura aos militares
Horacio Verbitsky
Escritor
O cardeal também foi chamado como testemunha em
processos relacionados à ditadura, como o caso do desaparecimento de uma
mulher grávida, filha de uma das cofundadoras da organização Avós da
Praça de Maio, ou o sequestro e assassinato de um padre francês na
província de La Rioja, em 1976.
"Segundo a fonte que se consulte, Bergoglio pode ser
definido como o homem mais generoso e inteligente que já existiu ou um
maquiavélico que traiu seus irmãos e os entregou ao desaparecimento e à
tortura aos militares", escreveu Verbitsky.
O Nobel da Paz Adolfo Perez Esquivel, que recebeu o prêmio por seu ativismo durante o último regime militar, disse à BBC Mundo que "o papa (Francisco) não tinha vínculos com a ditadura".
O escritor Ceferino Reato, autor do livro Disposición final, no qual Videla reconhece o desaparecimento de vítimas da ditadura, disse à BBC Brasil:
"Bergoglio é austero, atento com o cotidiano dos pobres, apóia
fortemente o trabalho dos sacerdotes nas favelas. É um homem inteligente
e a favor do diálogo com o judaísmo e o islamismo. Sobre as acusações
sobre seus vínculos com a ditadura, Bergoglio disse que, ao contrário,
que ele se preocupou com estes sacerdotes (dois jesuítas) e conseguiu
que a Marinha os liberasse", disse.
O papa (Francisco) não tinha vínculos com a ditadura
Adolfo Perez Esquivel
Vencedor do Nobel da Paz
Reato afirmou que "uma das criticas de Bergoglio ao
casal Kirchner (Nestor e Cristina Kirchner) é que defendem os direitos
humanos agora, na democracia, mas não o fizeram durante a ditadura",
afirmou o escritor.
"Caráter forte"
Especialista em questões sobre a Igreja Católica, José Ignácio López disse à imprensa argentina que Bergoglio "sempre denunciou a corrupção" no país. "De (ex-presidente Carlos) Menem até hoje, ele sempre denunciou a corrupção, condenou a inflação e esteve ao lado dos familiares das vítimas da tragédia da (discoteca Republica) Cromañon e da tragédia do trem na estação Once (na capital argentina, em 2012, que matou 51 pessoas)", afirmou López.
Especialista em questões sobre a Igreja Católica, José Ignácio López disse à imprensa argentina que Bergoglio "sempre denunciou a corrupção" no país. "De (ex-presidente Carlos) Menem até hoje, ele sempre denunciou a corrupção, condenou a inflação e esteve ao lado dos familiares das vítimas da tragédia da (discoteca Republica) Cromañon e da tragédia do trem na estação Once (na capital argentina, em 2012, que matou 51 pessoas)", afirmou López.
Setores da oposição ao governo central afirmam que "ninguém do governo compareceu nestas tragédias, mas ele sim".
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O anúncio do argentino Jorge Mario Bergoglio como
novo papa da Igreja Católica, nesta quarta-feira, foi seguido de
euforia em Buenos Aires
Foto: Luciana Rosa / Especial para Terra
O padre Alejandro Bunge, professor da UCA (Universidade
Católica Argentina), disse que Bergoglio tem "gênio forte, ouve muito,
mas não deixa de dizer o que pensa de forma direta".
O rabino Abraham Skorka, reitor do Seminário Rabínico
Latino-americano, em Buenos Aires, contou à imprensa local que costuma
conversar com Bergoglio e que ele "ouve os diferentes credos". "E que
Deus o abençoe, porque merece estar ali", disse.
A série de comentários sobre o novo Papa incluiu
declarações de apoio de políticos da oposição ao governo da presidente
Cristina Kirchner, com quem Bergoglio mantinha diferenças públicas.
"Quando saiu o anúncio do nome de Bergoglio como Papa, a
bancada do governo na Câmara dos Deputados parecia que estava num
velório. Por favor, é o primeiro papa latino-americano e deveríamos
estar comemorando", disse a deputada Elisa Carrió, da opositora
Coalición Cívica.
O deputado e cineasta Fernando "Pino" Solanas, do
Projeto Sur, afirmou "lamentar" que o governo atual "não tenha dialogado
com Bergoglio, homem preparado, defensor dos excluídos e do diálogo com
os diferentes setores e credos".
Antes de ser Papa, Bergoglio foi definido como "muito argentino" e "muito portenho" na biografia El Jesuíta ("O
Jesuíta") assinada pelos jornalistas Sergio Rubin e Francesca
Ambrogetti, de Buenos Aires. "Torcedor do time de futebol San Lorenzo,
apaixonado por tango e leitor do escritor Jorge Luis Borges",
descreveram.
Revista de História da Biblioteca Nacional
Censura e fé
Jorge Bergoglio é acusado de envolvimento com o regime autoritário argentino da década de 1970. Entenda a polêmica
14/3/2013
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Nesta quinta (14), o jornalista argentino Horacio Verbitsky, diretor do Centro de Estudos Legais e Sociais (Cels), escreveu um artigo inflamado no jornal Página 12 em que acusa novamente o atual papa Francisco
de envolvimento com a ditadura civil-militar argentina. Para o
jornalista, o jesuíta Jorge Bergoglio é um ‘populista conservador’ que
vai introduzir apenas mudanças ‘cosméticas’ em seu pontificado. No
artigo intitulado ‘Un ersatz’ ele afirma que o sucessor do
trono de Pedro é uma opção da “pior qualidade”, e o compara com “a água
com farinha que as mães indigentes usam para enganar a fome de seus
filhos” [tradução livre]. A escolha do título dá o tom do texto: a
palavra alemã ersat – que não possui tradução para línguas
latinas – dá ideia de substituição de mesmo nível, ou seja, para o
autor, Francisco teria uma veia ultraconservadora tal como acusam os
opositores de Bento XVI – que, quando jovem, foi membro da Juventude
Hitlerista (segundo Joseph Ratzinger, isso aconteceu apenas quando ele
foi obrigado).
A alfinetada não é nova, acontece há décadas. Em 1986, o advogado Emilio Mignone publicou o controverso livro Igreja e ditadura (1986), na qual levantava suspeitas sobre a participação de Bergoglio no sequestro de dois sacerdotes, em 1976. Nesta época, a ditadura civil-militar argentina estava no ápice e Bergoglio era presidente da Ordem Jesuíta. Segundo Mignone e também Verbitsky – na obra O silêncio (2005)– o sacerdote teria retirado a proteção da Igreja dos padres Francisco Jalics e Orlando Yorio, envolvidos com grupos da esquerda revolucionária.
O jornalista argentino acusa o atual papa Francisco, na obra e no presente artigo, de ter, inclusive, delatado os colegas ao regime ditatorial, fato que teria causado o sequestro e desaparecimento deles. A acusação poderia ser reforçada pelo testemunho recente de cinco pessoas: um sacerdote, um ex-sacerdote, uma teóloga, um integrante de uma fraternidade leiga que denunciou no Vaticano o que acontecia na Argentina em 1976 e um cidadão que também foi sequestrado à época.
Chamado a depor pela Justiça argentina, o então cardeal negou participação no caso. Em 2010, uma biografia autorizada sobre a vida do atual pontífice foi publicada. Na obra, o hoje papa Francisco nega as acusações e ainda afirma que tentou resgatar seus colegas do local onde eles estavam presos. Em apoio ao papa, o ativista argentino de direitos humanos Adolfo Pérez Esquivel - ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 1980 - disse em entrevista à BBC nesta quinta (14) que Bergoglio não teve vínculos, quando bispo, com a ditadura. "Questionam Bergoglio porque dizem que ele não fez o necessário para tirar dois sacerdotes da prisão, sendo ele o superior da congregação de jesuítas. Mas eu sei pessoalmente que muitos bispos pediam à junta militar a liberação dos presos e sacerdotes e não eram atendidos", afirmou.
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