Gegê Natalino
Não escrevo aqui para convencer ninguém a gostar de carnaval, tampouco brincar ou cair na folia. Escrevo dialogando com a saúde mental, pessoal e coletiva. É nessa perspectiva, que julgo necessário investigar o valor psicológico do carnaval. E isso independe de gostos pessoais. Psicologicamente falando, o inconsciente não vive à mercê do que o ego gosta ou desgosta. Vale para psique profunda, e logo para a promoção da saúde integral, o que é necessário! E o brincar é uma necessidade da alma. Na perspectiva da psicologia winnicottiana, por exemplo, brincar é coisa muito sério. E essa afirmação não serve apenas para a fase infantil da vida. Lamentavelmente, em nome de uma seriedade burra e adoecedora vamos nos tornando adultos, idosas e idosos cada vez mais adoecidos, carrancudos, consumistas e infelizes. O crescimento das farmácias em cada bairro da cidade fala de uma sociedade cada vez mais doente, cada vez mais ansiosa e deprimida - casa vez mais triste.
Do ponto de vista da psicologia profunda, o carnaval fala da necessidade humana, pessoal e coletiva, de integrar, no campo da consciência, a arte, a poesia, a imaginação, a fantasia, o delírio e a loucura. Essa dimensão da psique não pode ser esquecida ou desprezada. "Nos lembra acertadamente a canção: "A gente não quer só comida, a gente quer bebida, diversão e arte".
Nesse sentido , um ser privado de fantasia ou imaginação pode estar mais carente que um ser privado de pão.
Por isso, na rua, no bloco, no desfile, no passeio, em casa ou até num leito de hospital, toda humana criatura será sempre chamada a visitar mundos encantados, terras imaginárias e engraçadas casas feitas com muito esmero, na rua dos bobos número zero.
Se temos fome de pão, também temos fome de fantasia e delírio. A Sapucaí também pode estar na leitura de um livro ou na contemplação de uma obra de arte; num brinco ou numa veste mais descolada.
Sapucaí é tudo que nos leva para além do pão! E até o pão pode conter ou não Sapucaí.
Eucaristia é o pão transformado na Sapucaí de nossas almas. Deus é carnavalesco! O Espírito Santo é folião!!!
Bem disse Jesus: "Nem só de pão vive o homem".
Onde escondemos nossa criança interior? Por que a dureza da vida matou nossa capacidade de brincar?
Por que nos tornamos cada vez mais sérios e, inevitavelmente, chatos demais?
Por que estamos adoecendo tanto?
Um riso no trio pode ser tão ou mais necessário que um Rivotril!
Não falo aqui, necessariamente, de grandes blocos ou Sapucaí. Falo da necessidade de satisfazer devidamente as "sapucaís" da alma que se contentam com muito pouco. Os antigos sabem disso.
Houve um tempo que com simples latas se faziam brinquedos maravilhosos.
Por que perdemos isso?
Brincar é a capacidade de transfigurar o real.
O grande problema da vida não é a morte, mas a vida desencantada - vidas secas!
As vezes basta uma música, uma imagem, um mexido, um pulo, um gozo, um sorriso... As vezes, a alma só deseja um pouco (muito pouco) de confete e serpentina. Só isso e nada mais!
Para não alongar, meu escrito também é um protesto a um tipo de cristianismo que demoniza tudo; um cristianismo seco, adoecido, separatista, racista, fechado e emburrecedor. Não há como separar fé e cultura. E carnaval é cultura!
Nas palavras de São João Paulo II, uma fé que não se faz cultura não é fé vivida fielmente.
Por fim, deixo a advertência da grande psiquiatra Nise da Silveira:
"Gente curada demais é gente chata. Todo mundo tem um pouco de loucura. Vou lhes fazer um pedido: vivam a imaginação, pois ela é a nossa realidade mais profunda".
Baile de Carnaval - "Água no feijão" - Paróquia Santa Bernadete.
Avenida dos Democráticos, 896 - Higienópolis/Manguinhos (Ao lado do Abrigo Cristo Redentor)
Domingo: 04/02
Horário: 16h
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