domingo, 24 de março de 2024

Quem mandou matar Marielle? A vítória da persistência da luta por justiça. Depois de seis anos, a resposta: os mandantes são milicianos travestidos de políticos, delegados ou conselheiros. Todos presos.

 

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Já sabemos quem mandou matar Marielle

O país acordou com a prisão preventiva de três suspeitos de ter mandado matar Marielle Franco e Anderson Gomes: todos ligados à milícia e à política carioca. Uma mistura de miliciano e político que vem aterrorizando o RJ a vários anos.

O Deputado Federal Chiquinho Brazão, o Conselheiro do Tribunal de Contas do RJ, Domingos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil que teria acobertado os mandantes.

Muita coisa ainda tem que ser esclarecida. Não é um ponto final. Espera-se que finalmente o RJ e o país deixem de ser reféns de milicianos travestidos de políticos.

#MilíciamatouMarielle

O interventor General Braga Neto, em 8 de março de 2018, nomeia como chefe da Polícia Civil do Rio o delegado Rivaldo Barbosa.

Famílias Bolsonaro e Brazão têm muito em comum: ligação com a milícia e terrenos na zona oeste do Rio

Intercept Brasil antecipou que Ronnie Lessa apontou Domingos Brazão como mandante da morte de Marielle Franco, na agora homologada delação. Famílias Brazão e Bolsonaro possuem trajetórias semelhantes.

https://www.intercept.com.br/2024/03/23/familias-bolsonaro-e-brazao-tem-muito-em-comum-ligacao-com-a-milicia-e-terrenos-na-zona-oeste-do-rio/

Um assassinato que descortina a política no Rio de Janeiro?

Por Jorge Alexandre Alves*

Há 25 anos Jacarepaguá era muito diferente de hoje. Bem menos adensada do ponto de vista demográfico que hoje em dia. A região era vista como zona potencial de expansão imobiliária na cidade.

Porém, a maior parte de Jacarepaguá era ainda floresta (mata atlântica) e de localidades não urbanizadas. Havia muito verde e algumas áreas de proteção ambiental decretadas pelo município. A Muzema, tão famosa pelas construções irregulares que desabavam, era extensão natural do Parque Nacional da Tijuca e uma espécie de fronteira entre a já grande comunidade de Rio das Pedras e o Parque Nacional da Tijuca.

A Estrada dos Bandeirantes era uma via de mão dupla, em  alguns trechos cercada de mato, com curvas bem perigosas. Ninguém sonhava com BRT, as milícias eram simplesmente desconhecidas e a região toda contava com um pequeno shopping na Freguesia.

Ao mesmo tempo, havia um incipiente e aguerrido movimento de moradia na região. Apoiados pela Pastoral de Favelas da Igreja Católica e por ONG's de direitos humanos, faziam um belo trabalho de organização popular. Despontavam lideranças promissoras.

Eu, conhecendo alguns desses atores sociais, vislumbrava que o futuro da política carioca e da mobilização social passaria por aquela parte da Zona Oeste do Rio de Janeiro.

De fato, eu estava certo. Jacarepaguá e a Zona Oeste se tornaram pontos nevrálgicos da política carioca. Mas por outras razões menos nobres.

A atuação das milícias nos anos seguintes produziu uma rápida expansão imobiliária nesta região. Em uma década surgiram loteamentos irregulares e comunidades em zonas que exerciam enorme pressão sobre o parque Estadual da Pedra Branca, em uma ponta, e o Maciço da Tijuca, em outra. Nesta última, a atuação do IBAMA impedia maior degradação, por se tratar de área federal. 

Porém, na região da Taquara, no Camorim, Vargem Grande e Vargem Pequena a situação foi bem outra. Apesar de existirem áreas municipais de proteção ambiental, a ocupação desses territórios para fins de moradia popular e de classe média foi enorme. Algo somente comparável à expansão da Barra da Tijuca  em direção ao Recreio dos Bandeirantes, décadas antes.

Nesse meio tempo, as iniciativas de organização popular foram constrangidas. Suas lideranças às vezes eram ameaçadas, a ocupação de terras para a luta por moradia eram assediadas. 

Mesmo em certas áreas originalmente organizadas pelos movimentos sociais, milicianos se infiltraram e, na base da ameaça, conquistaram associações de moradores e expulsaram os líderes populares. Ao mesmo tempo, o avanço do conservadorismo católico e a instalação de denominações evangélicas pentecostais e neopentecostais nessas áreas afastaram instituições que davam apoio o movimento popular. Em resumo, o caminho estava aberto para a atuação das milícias no segmento de moradia.

Em seguida, tivemos em 2009 o anúncio do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016. Jacarepaguá foi toda devassada nos anos que antecederam os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016. As áreas de proteção na região foram extintas por causa das obras para as olimpíadas.

A líder de uma dessas comunidades na região do autódromo sofreu várias tentativas de suborno para convencer sua comunidade a deixar a região. Havia a luta em defesa da Vila Autódromo e de uma comunidade no Anil, que continua lá até hoje.

O vereadores progressistas estavam mobilizados porque a prefeitura não cumpriu a lei das remoções. Os valores das indenizações eram muito abaixo do valor de mercado, e quem foi reassentado acabou indo regiões distantes acima da distância determinada pela lei. Houve muita sujeira naquele tempo.

A especulação imobiliária na área em torno do antigo autódromo para as olimpíadas ajudou (sem querer?) a disfarçar, do ponto de vista legal, a ação das milícias em Camorim e adjacências. Toda essa região é zona de influência política dos políticos presos hoje pela Polícia Federal há quase trinta anos. Ou seja, indiretamente as obras para os jogos olímpicos ajudou a expandir milícias nas áreas de menor visibilidade na região.

Em 2016, o então vereador Chiquinho Brazão apresentou um projeto de Lei que regularizava lotes de terra irregulares, e ocupações fundiária clandestinas naquela região. O projeto acabou aprovado meses antes da morte de Marielle, mas foi declarado inconstitucional.

Todas essas questões fundiárias poderiam ter sido investigadas pelo Núcleo de Terras da Defensoria Pública do Estado.  De alguma forma, Marielle pode ter sido contactada pelos defensores  e isso teria chamado a atenção dos mandantes. 

Entretanto, se houve tais contatos e se Marielle Franco começou a realizar diligências nessa questão fundiária, ela o fez de forma discreta, porque nem a família e as pessoas mais próximas a ela souberam de nada a respeito. E, se havia  indícios destes vínculos, eles provavelmente foram eliminados pelos responsáveis em obstruir as investigações de seu assassinato.

Na mesma época da morte de Anderson e Marielle, o Rio estava no começo de uma intervenção federal na segurança pública, comandada pelo então Comandante Militar do Leste, General Walter Braga Netto. E quase ao mesmo tempo, houve uma mudança na cúpula da Defensoria Pública do Estado. Todo o núcleo de terras da Defensoria foi alterado a mando da nova gestão.

Teria sido apenas coincidência? Mais que um trágico assassinato político, descobrir o contexto que gerou a morte de Marielle pode desnudar meandros muito profundos da política no Rio de Janeiro.

Na elucidação dessa barbaridade pode estar a chave que abrirá a caixa de Pandora da degradação político-institucional da capital e do estado do Rio de Janeiro. É possível que neste evento terrível tenham convergido as razões que explicam a penetração das milícias nas estruturas de poder, e que alavancou a extrema direita para todo o Brasil. A conferir.

*Sociólogo e professor.

General Richard Fernandez nomeou Rivaldo mesmo com inteligência se opondo

Delegado preso por ser acusado de participação na morte de Marielle Franco foi escolhido para comandar a Polícia Civil diante de intervenção federal no Rio de Janeiro

https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2024/03/6824479-general-richard-fernandez-nomeou-rivaldo-mesmo-com-inteligencia-se-opondo.html

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