(breve reflexão sobre a Páscoa, para todas as pessoas de boa vontade)
Páscoa é um louvor à vida, que triunfa sobre a morte.
Páscoa é a linda história do Nazareno, o Deus feito gente, que veio ao mundo e nada guardou para si. Tudo, em Jesus, era destinado aos outros. Quando a morte chegou, para tomar seus bens, sua propriedade, nada encontrou para tomar, tudo já havia sido dado. Assim, foi vencida.
Páscoa é ver a beleza da Criação ("E Deus viu que tudo quanto havia feito era muito bom" - Gênesis, 1, 31). É o louvor das criaturas do Pobrezinho de Assis.
Páscoa é o frescor da manhã de domingo, e Maria Madalena vendo a pedra das opressões removida, e o túmulo da nossa descrença vazio (João 20, 1-9).
"A promessa da ressurreição não está escrita por Deus só nas Escrituras, mas em cada folha, em cada flor da primavera"
(Martin Luther King - 1928-1968).
Páscoa é, ao acordar, espreguiçar-se como se quiséssemos abraçar o mundo, especialmente os mais sofridos. Páscoa não tem idade: é o vigor da amorosidade. Páscoa é ser solar na luta por Justiça e Paz.
Páscoa é exultar com o verde do vegetal, a solidez do mineral, o pulsar do animal. É sentir-se parte da natureza, cuidá-la e cuidar-se.
Páscoa é ressuscitar, livrar-se do que nos mata aos poucos, essas tantas coisas de "não": egoísmo, falsidade, desconfiança, mesquinharia, indiferença, alienação.
Páscoa é teimar na esperança e, tomado/a pelo amor louco do Mestre, "fazer novas todas as coisas" (Apocalipse, 21, 5). É desafiar até a drástica ruptura da morte, é crer na Ressurreição da carne e na perenidade do Espírito.
Páscoa é animar os desencantados: "abre os olhos, mostra o riso/quero, careço, preciso/de ver você se alegrar". É crer no jubiloso Reencontro dos que moram na saudade: "E eu te direi que um dia/ as estradas voltarão/ voltarão trazendo todos/ para a festa do lugar" ("Um dia", Caetano Veloso).
Páscoa é rezar, orar, pedir que "a partir de hoje a família se transforme/ e o pai seja pelo menos o Universo/ e a mãe no mínimo a Terra" (Maiakovski, 1893-1930).
Páscoa é ser Páscoa: passagem, mudança, transformação profunda, em si e no mundo. É desejar, com todo sentimento e generosidade... FELIZ PÁSCOA!
"O túmulo vazio", Sieger Köder (1925-2015)
"Cristo aparece a Maria Madalena", Jesus Mafa
SÁBADO DE SILÊNCIO
(preparação para a Vigília da alegria pascal)
O Sábado de Aleluia é de serena expectativa. Que seja uma pausa na correria e alarido do mundo atual.
Na liturgia cristã, Jesus "desceu à mansão dos mortos". Mas nós, junto com Ele e depois dele, continuamos carregando nossas cruzes.
Lembro, com reverência e saudade, dos próximos muito amados que já partiram "fora do combinado". Lembra dos seus?
Cai uma lágrima e quero que ela me irrigue. Para, enquanto aqui, praticar o que de bom eles me ensinaram: mãe e pai, amigos, amigas, presentes que a vida me deu, agora ausentes. Fazendo falta.
Qual Jesus no túmulo, corpo crucificado e sangrado, abafado por uma pedra... Nostalgia e lembranças tristonhas também nos constituem.
Rainer Maria Rilke (1875-1926) indagou: "quem assim nos fascinou, para que tivéssemos esse olhar de despedida em tudo o que fazemos?".
O Cristo morto é um toque para não esquecermos nossa transitoriedade e impermanência. Todo orgulho besta, toda arrogância cai por terra.
Assim somos e seguimos, entre amores perdidos, ansiedades incontroladas, "objetividades" inócuas (às vezes iníquas), pré-ocupações estressantes e humores cinzentos.
Apequenados, esquecidos da benção que é existir! A morte vai entrando devagarinho na vida da gente. Reajamos, livremo-nos das correntes!
Nosso Deus é um Deus escondido. É nossa procura. É nosso desejo pulsante de afeto, solidariedade e felicidade. Nossa ânsia por justiça e igualdade. Nossa urgência de deixar no túmulo todo egoísmo e falsidade, e aquela ambição desmedida. De romper com tudo que nos amarra e acomoda.
Como ensinou Rubem Alves (1933-2014), "é preciso que a tristeza seja temperada com alegria.Tristeza, só, é muito perigoso. As pessoas começam a desejar morrer. Essa é a razão por que os deprimidos querem dormir o tempo todo. O dormir é uma morte reversível".
Essa é a razão pela qual curto tanto a Vigília Pascal: quero estar bem acordado para ver e sentir a passagem das trevas para a luz, da escravidão para a liberdade, do nada para o sentido, da tristeza para a alegria, da solidão para o amor. Da morte para a vida!
Desde já, feliz Páscoa, que quer dizer "passagem"!
Sliman Mansour (nascido em 1947, na Palestina): "Perseverance and Hope"
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