segunda-feira, 4 de março de 2024

A CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2024 E OS ATAQUES DA DIREITA CATÓLICA. Romero Venâncio UFS

Não demorou e já começou neste mês de março os ataques por parte de grupos da extrema direita católica nas redes digitais a Campanha da Fraternidade deste ano de 2024 e que tem como tema: "Fraternidade e Amizade Social". Quem lidera a campanha de difamação e delírios contra a CF`2024? O Centro Dom Bosco do Rio de Janeiro, para variar. E não acredito que ficará apenas nas redes, mas chegará ao tecido social das paróquias e dioceses. Aguardem. O poder de influência e a qualidade técnica das atividades deste Centro é grande. E ajuda a inércia da CNBB em responder efetivamente a essas organizações de direita dentro do catolicismo no Brasil.

Desde 2018 que estudo e monitoro os grupos católicos de extrema direita nas redes digitais e em algumas dioceses do Brasil. A prioridade são as atividades deles organizada em forma remota. Cursos, palestras, produções digitais... Como chegaram bem antes nos espaços da redes digitais, esses grupos têm larga vantagem em atrair pessoas e só crescem nestas redes. A coisa é séria e já tem dimensão profissional. Não se trata de amadorismo comunicacional. Não. É coisa de profissional, bem feita e que custa caro. Alguns já estão monetizados e ganhando dinheiro do youtube com isto.

Vamos ao vídeo da vez. Pode-se ver no youtube um vídeo de divulgação pública do Centro Dom Bosco, intitulado: "Campanha da Fraternidade 2024 - Eles querem destruir a sua Fé!". Desse jeito ai. Literalmente. Com uma foto do pe. Julio LancellottiL congelada na chamada do vídeo que já indica o rumo. Logo no início, o dirigente do Centro de nome Álvaro Mendes resume o que será o vídeo de 18 minutos: a CF sempre existiu para destruir a fé e criar ativistas sociais. Ela só existe para isto. Começa atacando Dom Orlando Brandes, Pe. Julio Lancellotti e a CNBB. Os ataques são diretos e com recortes de imagens de arquivo. Selecionam as imagens que lhes interessa, manipulam e fazem um monte de críticas. Todas de ordem política. Como teologicamente são indigentes e limitados a um fundamentalismo anacrônico, os ataques são todas de ordem político-pastoral.

As críticas à CF`2024, tem três linhas explicitas que, de maneira sorrateira, pretendem fazer chegar às paróquias e dioceses. A coisa é séria. Desqualificar a Campanha tornando-a estranha à Quaresma; de que o tema quer apenas preparar ativistas sociais e que a CNBB se rendeu às pautas "identitárias". Isto tudo, calibrado com montagens grosseiras e uma musiquinha de terror ao fundo ao estilo "sexta-feira 13". Passo a comentar cada uma das críticas do vídeo.

CF´24 e a Quaresma. Historicamente, a Campanha da Fraternidade está ligada a Quaresma como uma ação concreta que antecede o tempo quaresmal. Isto foi assim desde o inicio. Por isto, os temas da Campanha desde os anos 60, são temas concretos: família, escola, fome, terra, racismo, amizade, paz... A Igreja Católica no Brasil assumia temas importantes na sociedade e os colocava em questão para todos os católicos e seguia toda uma preparação litúrgica para a Quaresma. O Centro Dom Bosco inventou maldosamente uma oposição entre Quaresma e Campanha da Fraternidade. Como se Jejum, orações e missas fossem atos litúrgicos deslocados da Campanha. O intuito desta desonestidade é criar uma animosidade na Igreja contra a Campanha. E com isto desestimular o engajamento de católicos na Campanha. Sendo direto: pretendem envenenar padres e bispos contra a Campanha e fazer com que as diocese não a assumam mais.

A Campanha da Fraternidade prepara ativistas sociais. Típico de um discurso de direita. Temas sociais como alheios a fé. Pelos temas e pela popularidade da Campanha, torna-se importante criticar as campanhas por ter a Igreja abraçado temas que procuram conscientizar a sociedade. A maldade desta leitura está em deslocar a Campanha de toda uma ação pastoral da Igreja. Como se a Campanha tivesse como objetivo preparar militantes políticos e como se eles, extrema direita católica, não colaborasse ativamente com o bolsonarismo (que é uma forma de fazer política). Quando este Centro Dom Bosco em 2023 tentou levar Bolsonaro e sua turma para a festa de Nossa Senhora de Aparecida com o objetivo de rezar em praça pública com o então presidente da República e candidato anunciado a reeleição, faziam o que? catequese? As campanhas da fraternidade são tão católicas como qualquer ato litúrgico interno à Igreja. Do nome às ações, a Campanha é a face pública de uma Igreja que assumiu a opção pelos pobres como linha mestra de sua pastoral.

A CNBB se rendeu as pautas "identitárias". Primeiro, essa extrema direita católica tem predileção pelo que eles mesmos chamam de "pauta identirária". Adoram confundir tudo num termo fantasma e fake chamado "ideologia de gênero". Eles têm horror a feminismo ou tudo que diga respeito a LGBT. Por principio, já têm o ódio como bandeira. A CNBB não assumiu "pautas identitárias". O que vemos nos documentos da CNBB e na Campanha da Fraternidade do ano passado e deste ano são preocupações reais da sociedade brasileira: feminicídio, homofobia, trasnfobia e racismo. E para uma parte das teólogas católicas, a CNBB ainda está muito tímida nestas pautas e as vezes chaga atrasada. Trata-se de um clamor social a violência contra a mulher neste Brasil. Mas para a extrema direita católica isto não tem importância. O anacronismo deste Centro Dom Bosco beira a insanidade. Mas tudo isto é feito de caso pensado: macular a imagem da CNBB com paranoia inventada por eles mesmos e disseminada como se fossem verdades, passa a ser método nos discursos dessa gente.

Do ridículo não se volta. Chega ser constrangedor ver um homem feito e com formação intelectual acadêmica fazer uma análise do cartaz da Campanha da Fraternidade em que só consegue falar tolices diante do que  imagina ver. O distinto dirigente do Centro Dom Bosco no vídeo em questão faz uma "análise" do cartaz da Campanha deste ano que nos perguntamos como alguém pode ser tão tolo a esse ponto. Vamos lá. Tem imagem de um homem barbado negro, o dirigente direitista ver um "preto velho", um homem olhando para um cachorrinho, ele ver um "pai de pet" e por ai vai. Não vou me alongar na leitura "semiótica" do distinto dirigente. Na verdade, não acredito que ele seja um idiota, mas que tenha como finalidade atingir uma maioria de católicos para vejam no cartaz da Campanha imagens que não "condizem com o catolicismo". Trata-se de "guerra cultural", bem ao modo desta extrema direita católica. Não existe nenhum problema com "preto velho" ou "pai de pet", mas para o Centro Dom Bosco e sua paranoia, tem sim. Essa extrema direita católica expõe a Igreja ao ridículo. Os ataques virulentos deles em nada contribui para um testemunho verdadeiro da Igreja. Ironicamente, eles demonstram em chave contrária, a importância do tema da Campanha deste ano: a amizade social. Eles demonstram na prática serem inimigos de práticas amigáveis. Típico da cultura bolsonarista.

Nota de louvor. Saindo deste envenenamento da extrema direita católica, podemos vislumbrar no tema da Campanha da Fraternidade deste ano uma tentativa de reflexão sobre o significado da "amizade social" num país que viveu e sobreviveu a uma propaganda de ódio quase que diariamente entre 2018-2022, que vem de uma "guerra cultural" que está destruindo o tecido social brasileiro e que gestos de amizade vão perdendo seu sentido diante de tanta animosidade dentro e fora das Igrejas. 


sábado, 2 de março de 2024

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito boa essa análise.

AÇÃO CULTURAL disse...

Grato pela visita ao blog e leitura. Volte sempre!!!