quinta-feira, 11 de abril de 2013

Secretário de Cultura afirma que é preciso 'descriminalizar' o hip hop em São Paulo

Juca Ferreira, em nova edição do Diálogo SP, disse que preconceito e dificuldade de lidar com população da periferia motivavam discriminação em gestões anteriores

Publicado em 11/04/2013, 10:20
Última atualização às 16:20

Secretário de Cultura afirma que é preciso 'descriminalizar' o hip hop em São Paulo
Encontro paulistano movimento hip hop, em 2012: manifestação cultural começa a ser reconhecida pelo poder público (CC/Fora do Eixo) 
 
São Paulo – O secretário municipal de cultura de São Paulo, Juca Ferreira, se reuniu na noite de ontem (10) com membros do movimento hip hop da cidade em mais uma etapa do Existe Diálogo em SP – debates públicos organizados por setores da administração. Em sua pasta, o secretário já realizou dois encontros abertos em que fica frente a frente com cidadãos para ouvir sugestões e críticas sobre a política cultural. O objetivo das conversas é construir ações pautadas nas propostas apresentadas.
Juca afirmou que ao assumir a secretaria na gestão de Fernando Haddad (PT) notou uma “quase criminalização” das manifestações ligadas ao hip hop e que agora é preciso criar políticas públicas de descriminalização. “Há uma dificuldade da relação do poder público. Isso não é á toa. Tem todas as cargas possíveis do preconceito, da discriminação e da dificuldade de lidar com a população de periferia, com uma manifestação cultural de juventude”, avaliou.
Segundo ele, havia uma espécie de “proibição” de apresentações de rap em eventos como o aniversário de São Paulo. A presença do estilo musical e demais manifestações associadas ao hip hop quase desapareceram de grandes festas públicas na cidade desde 2007, ano da última participação dos Racionais Mcs na Virada Cultural. Na ocasião, a Força Tática da Polícia Militar usou bombas de efeito moral e balas de borracha para dispersar o público que assistia apresentação do grupo depois que alguns jovens subiram em uma banca de jornal, na praça da Sé. Diversas pessoas ficaram feridas e uma dezena foi presa.
“Tinha quase uma proibição de incorporar o hip hop no aniversário da cidade. E a gente fez questão de incorporar, já como uma sinalização de que a gente quer diálogo, quer jogo”, afirmou.
A maior parte das questões levantadas pelos rappers, grafiteiros, BBoys, Djs, dançarinos de break e produtores tratava da valorização simbólica e econômica dos membros do movimentos hip hop envolvidos em diversas atividades educativas e de combate à violência. “Dá para fazer trabalho voluntário? Dá, mas esse profissional tem de ser reconhecido também”, disse Sherlany, do Perifeminas, que também enfatizou a importância do recorte de gênero nessas políticas.

Consequência

Ainda na noite da quarta-feira, foi apresentado um documento em que esses e outros pontos foram tratados em encontros preparatórios do evento. O chefe de gabinete da secretaria sugeriu a criação de um grupo de trabalho para dar “consequência” às sugestões.
Ao final do encontro, os presentes se mostraram otimistas em relação à efetivação dos temas conversados. O rapper Emicida classificou o encontro como “histórico”. “O poder público nunca sentou com o hip hop na cidade de São Paulo.”
“Foi surpreende esse diálogo. Eu achei que seria uma coisa mal feita, porque eu não concordo com esse 'papo de diálogo', acho que muitas vezes é marketing. Mas não, o cara é muito avançado. Acho que ele acabou se comprometendo. Porque é isso, os políticos não querem dialogar com as pessoas porque não querem se comprometer com nada”, afirmou Pirata, do Fórum de Hip Hop.
“É importante o diálogo. Acho que coisas novas e ótimas poderão sair”, disse o rapper Rappin Hood.
Leia íntegra do documento apresentado pelo Movimento Hip Hop
Ata da reunião preparatória autônoma do Movimento Hip Hop organiado, convocado por Milton Sales e ocorrida sábado (6/4), na Favela do Moinho:
Presentes: MH2O São Paulo, Fórum Municipal do Hip-Hop SP, MH2O Guarulhos, MH2O ABC, Casa do Hip-Hop Diadema, Família Ducorre, Apocalipse Urbano, Rap Nacional, Rimatitude, Movimento Mães de Maio, Mutirão Cultural da Quebrada, Luta Popular, Movimento de Solidariedade à Palestina (Mop@t), Desinformémonos, Organização de Moradores da Moinho etc
Indicações:
- AUTONOMIA: Garantia e Fortalecimento da Autonomia do Movimento Hip-Hop (sem intermediários de ONGs e Empresas Culturais; Nóis por Nóis);
- DESCENTRALIZAÇÃO DO PODER E DEMOCRATIZAÇÃO DO ACESSO: Descentralização do Poder Decisório e Democracia Direta sobre os Aparelhos e Recursos Públicos da Cultura (criação de Subsecretarias Temáticas do Hip-Hop e Regionais);
- RESGATE DA HISTÓRIA: Projetos para Resgate, Preservação e Difusão da História do Movimento Hip-Hop Organizado em São Paulo;
- FORTALECIMENTO DO FÓRUM MUNICIPAL, SUAS DELIBERAÇÕES, DA SEMANA MUNICIPAL DO HIP-HOP (LEI MUNICIPAL 14.485/2007): Fortalecimento da Autonomia e ampliação do orçamento anual da Semana Municipal do Hip-Hop em SP (atualmente em apenas R$ 100.000,00, com parte do dinheiro ainda sofrendo interferência);
- RESGATE DA “CASA DO HIP-HOP” DE CIDADE TIRADENTES E CRIAÇÃO DE + 4 CASAS DO HIP-HOP (Z/L, Z/S, Z/N, Z/O E CENTRO): Resgate da Lei Original da Casa do Hip-Hop de Cidade Tiradentes (Projeto de Lei 422/2004), posteriormente transformada em “Estação Juventude”, e criação de + 4 Casas do Hip-Hop (como a Casa da Cultura Hip Hop Malcom X, PL. 763/2003), uma em cada região da cidade.
- HIP-HOP CULTURA DE RUA CONTRA VIOLÊNCIA: Apoio a projetos e atividades que valorizem o Hip-Hop como a principal “Cultura de Rua Contra Violência” – valorização das propostas das posses, dos coletivos e grupos que estejam integrados ativamente às diversas articulações contra o Genocídio da População Preta, Pobre e Periférica;
- FOMENTO A ESTÚDIOS PÚBLICOS DE GRAVAÇÃO; RÁDIOs E TVs COMUNITÁRIAS DO HIP-HOP ORGANIZADO – Criação de Estúdios Públicos Municipais, Rádios, WebRadios, TVs e WebTVs, Espaços para Produção Autônoma para o Movimento Hip-Hop poder canalizar o seu trabalho de forma independente;
- VALORIZAÇÃO DAS POSSES, BANCAS, COLETIVOS E GRUPOS MILITANTES DO HIP-HOP ORGANIZADO, E NÃO DO HIP-HOP COMO SIMPLES SHOW/ESPETÁCULO: Maior apoio às posses, bancas, gangs de break e grafitti, coletivos e grupos do Hip-Hop Organizado: o Rap, o Break e o Grafitti das Ruas e do Cotidiano;
- PROGRAMAS DE RECONHECIMENTO PROFISSIONAL, FORMAÇÃO E APOIO A NOVOS MCs, DJs, BBOYs E GRAFITEIROS;
- HIP-HOP COMO CONHECIMENTO E FORMAÇÃO, “RAPENSANDO A EDUCAÇÃO”: Reconhecimento e apoio aos participantes do Movimento Hip-Hop como Educadores e Arte-Educadores. Resgate das experiências históricas (Rapensando a Educação, Hip-Hop nas Escolas, Sarau nas Escolas, Programa Hip-Hop é Educação – PL 609/2003), e criação de um grupo de trabalho entre a Secretaria de Cultura, Secretaria de Educação, Secretaria de Direitos Humanos e Secretaria de Promoção da Igualdade Racial para garantir as condições e a realização de Programas Educacionais a partir do Hip-Hop;
- PROJETO DE OCUPAÇÃO DO HIP-HOP NA PROGRAMAÇÃO DOS CENTROS CULTURAIS, CASAS POPULARES DE CULTURA E NOS CEUs DA CIDADE;
- PROGRAMA VAI – HIP-HOP: Construção de um Programa de Valorização de Iniciativas Culturais específicas do Hip-Hop, com critérios sócio-econômico-culturais bem definidos, e uma Comissão Julgadora com reconhecida história no Hip-Hop de SP;
- FOMENTO AO INTERCÂMBIO CULTURAL DO HIP-HOP DE SÃO PAULO COM OUTRAS PERIFERIAS DO BRASIL E DO MUNDO;
- PRÊMIO MUNICIPAL “SABOTAGE” E “DINA DI” DE HIP-HOP (Resgate da Resolução Municipal 008/2004): Construção do Prêmio Municipal do Hip-Hop a partir de uma Comissão Organizadora Autônoma formada por Julgadores com reconhecida história no Hip-Hop de SP;
- PROPOSTA DE FORMAÇÃO DO “CONSELHO DA FAVELA” EM SP: Em contraposição ao recém-anunciado “Conselho da Cidade”, o “Conselhão” do Prefeito Fernando Haddad, como o movimento Hip-Hop, os Saraus, o Samba, a Cultura Popular, a Periferia, ou seja, a Maioria não foi convidada a fazer parte – contrariando inclusive tudo aquilo que o sociólogo Haddad sempre defendeu junto a outros dos seus pares que também fazem parte do Conselhão, a crítica do abismo entre Cidade e Favela – o Movimento Hip-Hop Organizado de SP propõe a criação do “Conselho da Favela”, com o mesmo número de integrantes e com a mesma periodicidade de reuniões, que serão realizadas de forma autônoma a princípio na Favela do Moinho;
- QUE AS PROPOSTAS ENCAMINHADAS NO #EXISTE DIÁLOGO SEJAM APLICADAS NA PRÁTICA (PARA ALÉM DA CONVERSA), COM GARANTIA DE ORÇAMENTO, AUTONOMIA E EXECUÇÃO DE QUALIDADE PARA AS POLÍTICAS DO HIP-HOP E PARA A CIDADE.

Juca Ferreira afirma que vereadores usam casas de cultura para distribuir cargos

Atualmente, equipamentos são geridos por subprefeituras. Secretário reivindica retorno para Secretaria da Cultura e movimento Hip Hop relata dificuldades para desenvolver atividades nos locais
Publicado em 11/04/2013, 12:00
Última atualização às 14:58
Juca Ferreira afirma que vereadores usam casas de cultura para distribuir cargos
O secretário de Cultura demonstrou insatisfação com os serviços prestados nos equipamentos públicos. (Foto: Folhapress/Vanessa Carvalho)
São Paulo -- O secretário municipal de cultura de São Paulo, Juca Ferreira, afirmou na noite de ontem (10) durante evento Existe Diálogo em SP – Hip Hop, no Centro Cultural São Paulo, região central da capital paulista, que luta para que as Casas de Cultura da cidade voltem para a responsabilidade de sua pasta. Atualmente, os espaços são geridos pelas subprefeituras.
Segundo o secretário, os equipamentos – 13, conforme informa o site da prefeitura –, localizados em regiões periféricas, passaram a ser usados para ocupação de cargos por pessoas indicadas por vereadores.
“As Casas têm a obrigação de fazer parte da estrutura municipal de cultura. São equipamentos avançados na periferia que devem responder a políticas culturais estabelecidas publicamente. Mas nos últimos anos, elas viraram outra coisa. Não estão sob a responsabilidade da secretaria. Eu estou demandando que voltem a ser. Tem uma dificuldade, porque se criou um sistema de ocupação dos cargos que é fora da secretaria e passa por outras legitimidades”, afirmou.
Grafiteiros, rappers e Djs afirmaram enfrentar dificuldades para desenvolver atividades nesses equipamentos, mesmo voluntariamente. Entre as razões apontadas está a burocratização e a intensa militarização das subprefeituras na gestão anterior. Dos 31 subprefeitos, 30 eram policiais militares aposentados.
Juca também demonstrou insatisfação com o serviço prestado nos equipamentos. “Do jeito que é hoje, ela não atende a demanda e nem realiza a missão dela, que é fortalecer os processos culturais locais e levar processos que não são levados localmente”, definiu.
Segundo ele, desde sua chegada à secretaria, a questão está na pauta. Mas indicou não existir soluções de curto prazo encaminhadas. “Não é fácil. Porque elas entraram em um circuito que tem força. Mas é uma disputa que tem de ser feita e nós já estamos travando”, afirmou. “Se eu disser qualquer data aqui, eu estou mentindo”, respondeu, ao ser pressionado por um dos presentes a apresentar um cronograma para a concretização de mudanças.
Ele justificou a dificuldade enfatizando os interesses envolvidos. “Eu estou falando claramente, com todas as letras: é uma disputa. Porque ou elas continuam como são hoje ou elas voltam a fazer parte do sistema de cultura.” A proposta paliativa do secretário para as dificuldades da população, elaborada durante o debate, é a criação de um conselho de cultura em todas as casas, eleitos pela comunidade local.
Juca afirmou, que as casas de cultura seriam importantes, por exemplo, na solução dos problemas relacionados ao funk. A Polícia Militar tem desenvolvido operações para evitar que os bailes que ocorrem nas ruas, principalmente nos bairros da periferia da cidade, aconteçam. As medidas feitas dentro do âmbito da operação delegada da própria prefeitura têm revoltado produtores e frequentadores.
“O poder público tem obrigação de abrir espaço para atividades culturais. Por isso que eu acho que tem de estender a estrutura popular da prefeitura até a periferia, por isso que é tão importante que as casas de cultura sejam instrumentos de política pública, exatamente para que a juventude tenha a possibilidade de se divertir, de ter acesso à cultura, sem ser disponibilizada para influências que não sejam benignas”, defendeu.

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