quarta-feira, 3 de julho de 2013

O lado negro do show business: o desvio de verbas públicas com eventos musicais no Nordeste do Brasil

12 maio 2011
por Leo Salazar
O Nordeste é uma região fértil e próspera. O retorno do investimento é líquido e certo, e o melhor de tudo, no curto prazo. Não estamos falando de agropecuária, indústria de transformação, comércio varejista ou prestação de serviços. Tampouco estamos nos referindo à alguma atividade econômica de iniciativa privada. Estamos falando de eventos musicais promovidos por órgãos públicos ou fundações públicas.
O Nordeste gosta de festa, seja ela para marcar uma data religiosa, civil ou cultural. E em todas elas há música, muita música ao vivo. O Nordeste também é um celeiro de artistas, muitos deles de qualidade indiscutível, outros de gosto duvidoso. Mas um fato é unanimidade: a competência com que gestores públicos, empresários artísticos e políticos roubam a cena, que dizer, os cofres públicos.
Antigamente as fraudes aconteciam com áreas mais nobres da gestão pública. Eram desviadas verbas da merenda escolar, do tratamento fora de domicílio, da construção de pontes, do calçamento de uma rua, da reforma de uma escola. Os órgãos de fiscalização foram apertando o cerco e a fonte foi secando. Mas agora descobriram uma fonte perene numa propriedade esquecida dentro do governo, sem importância política: os eventos musicais realizados por fundações ou secretarias de cultura.
Ninguém quer saber a origem dos recursos ou como ele foi aplicado. Ninguém vai denunciar no programa policial do rádio ou da televisão a má aplicação dos recursos públicos em uma festa na cidade. Pouco importa se houve superfaturamento dos serviços contratados, causando prejuízo ao erário público, ou se houve enriquecimento ilícito dos empresários artísticos, ou ainda violações aos princípios da administração pública. As pessoas querem mais é assistir show de graça!
Nem mesmo a oposição se pronuncia. O esquema é amplo demais e beneficia muita gente. O político ganha dinheiro na ida para financiar sua campanha eleitoral na volta. O deputado aprova uma emenda parlamentar, o dinheiro federal chega na prefeitura através de um convênio, uma produtora é escolhida para aplicar o dinheiro e realizar a festa, os artistas são escalados, a festa acontece naquela data e pronto, acabou-se. No dia seguinte só a ressaca e a sujeira lembram que ali houve uma festa. O dinheiro saiu pelo ralo, ou melhor, entrou pelo bolso.
A produtora de eventos desempenha um papel fundamental nesse esquema porque administra os recursos. Ela paga as despesas do evento e repassa as “comissões”. Geralmente é uma pessoa de confiança e próxima dos políticos. Não há licitação para a escolha da produtora de eventos, mas deveria haver, assim como existe licitação para a contratação de agências de publicidade. A meta estabelecida  pela Constituição Federal para a contratação de seviços pela administração pública é assegurar igualdade de condições entre os concorrentes. Pela lei, apenas a contratação de artistas é caso de inexigibilidade de licitação.
É um jogo de cartas marcadas. As mesmas produtoras escalam as mesmas bandas. Pra entrar na programação tem que aceitar as regras do jogo. Se o artista reclamar, fica de fora (muitos estão nessa situação). Outros desconfiam do esquema mas preferem fecha os olhos, senão correm o risco de perder a data ou de serem escanteados de uma vez por todas. Tem ainda o artista que nem desconfia do que se passa nos bastidores. Mas uma coisa é certa: o artista é quem menos ganha nesse esquema.
Seria fácil provar o funcionamento dessas organizações criminosas. No palco, mais do que música, escuta-se o locutor da festa entregando todo mundo: “obrigado deputado”, “um abraço pro vereador”, “uma salva de palma pro prefeito”, e assim por diante. Uma interceptação telefônica no celular do produtor do evento revelaria toda a rede de interesses. Mete um grampo lá que a casa cai pra todo mundo! Marca uma acareação entre o artista e o produtor do evento, frente a frente, pra cada um dizer o valor de fato do cachê.
Próximo ano tem eleições municipais. Preste atenção, a partir de hoje, nos eventos musicais promovidos em sua cidade. Filme, fotografe e ofereça uma denúncia ao Ministério Público. Onde há fumaça, há fogo.

 Leonardo Salazar é autor do livro “Música Ltda: o negócio da música para empreendedores”. É especialista em Gestão de Negócios, bacharel em Jornalismo e técnico em Contabilidade. Também é empresário artístico da banda Novos Bossais e instrutor setorial de cultura do SEBRAE.

Leia mais:  Há ausência praticamente total de auditoria de custos em tudo que o setor público contrata e de transparência no que executa diretamente. Falta vontade política para verificar o valor que está sendo pago ao prestador de serviço ao executor da obra. Em geral tudo que é entregue ao setor privado para fazer em lugar do setor público pode estar sendo pago com valor acima do que deveria caso o governo se dispusesse a olhar com mais cuidado tudo que contrata e, muitas vezes não o faz por falta de quadros e/ou de competência para isso.

A população que paga a conta tem todo direito de saber o porque do valor cobrado e o governo através dos seus três níveis (federal, estadual e municipal), poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário e Ministério Público) e agências "reguladoras" de FHC, o dever de não jogar contas indevidas sobre os usuários e contribuintes.   AQUI


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